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Reforma Tributária 24: como ficam os tributos sobre apostas e jogos eletrônicos com as novas regras - Por Rosa Freitas*

02/06/2025 -

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Com a promulgação da Lei nº 14.852/2024, o Brasil finalmente regulamentou o mercado de apostas e jogos eletrônicos, entrando de vez em uma indústria global bilionária — ainda que tardiamente. A nova legislação traz definições claras sobre o que se entende por jogos eletrônicos e estabelece uma cadeia produtiva complexa, que envolve desde desenvolvedores até plataformas de streaming e comercialização.

Segundo o artigo 4.º da nova lei, estão incluídos na categoria os programas de computador com interatividade em tempo real, os dispositivos e acessórios dedicados a jogos, bem como os softwares para celulares e ambientes virtuais. O artigo 7.º também reconhece como empresas desenvolvedoras aquelas cujo objeto social é a criação de jogos eletrônicos.

Apesar do avanço legislativo, a entrada do Brasil nesse mercado levanta preocupações sociais e jurídicas. Estudo da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), realizado por meio do Levantamento Nacional de Álcool e Drogas (LENAD), aponta que cerca de 10,9 milhões de brasileiros fazem uso perigoso de apostas. O número acende o alerta para os riscos psicossociais da atividade — especialmente entre jovens.

A legislação reconhece esses riscos e estabelece que devem ser adotadas medidas proporcionais para proteger crianças e adolescentes dos impactos negativos do jogo digital. A preocupação encontra eco na Organização Mundial da Saúde (OMS), que classificou o Gaming Disorder na CID-11 (código 6D50), destacando os prejuízos sociais, financeiros e ocupacionais decorrentes do uso compulsivo de jogos.

É importante ainda diferenciar esse transtorno da ludopatia — o vício em jogos de azar —, já catalogado na CID-10 sob o código F63.0.

Além das questões de saúde pública, a legalização das apostas enfrenta desafios jurídicos. A regulamentação foi objeto de Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs), como a 7721 e a 7749, ambas em tramitação no Supremo Tribunal Federal. A primeira questiona a constitucionalidade da chamada “Lei das Bets” (Lei 14.790/2023), enquanto a segunda contesta dispositivos das leis que regulamentam as apostas de quota fixa.

Simultaneamente, a CPI das Bets avança no Congresso, investigando o papel de influenciadores digitais na promoção de jogos e apostas. O Judiciário já tem reconhecido a responsabilidade civil por propaganda enganosa, incluindo a responsabilização solidária das empresas contratantes.

1. Tributação atual: alta carga e múltiplos tributos

Atualmente, os jogos eletrônicos estão sujeitos a uma ampla gama de tributos, que variam conforme a etapa da cadeia produtiva:
• IPI: aplica-se na fabricação de consoles e acessórios, com alíquotas entre 12% e 20%.
• ICMS: incide sobre a circulação desses produtos entre estados, com variação conforme a localidade.
• Imposto de Importação (II): 20% sobre a entrada de produtos no país.
• ISS: entre 2% e 5%, cobrado pelos municípios sobre serviços de apostas, conforme a LC nº 116/2003 e a nova LC nº 116/2025.
• IR: aplica-se sobre os ganhos líquidos dos apostadores.
• Lei 14.790/2023: estabelece alíquota de 15% retida na fonte sobre jogos online.
O município do Recife, por exemplo, já se adiantou e atualizou sua legislação com a Lei Municipal nº 19.365/2025, alterando o Código Tributário para incluir explicitamente o ISS sobre apostas.

2. O que muda com a Reforma Tributária

Com a Reforma Tributária, o cenário fiscal muda drasticamente. A principal alteração está na introdução do IBS (Imposto sobre Bens e Serviços), da CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços) e do IS (Imposto Seletivo).
• IBS/CBS: não há previsão de alíquotas reduzidas para apostas. A alíquota padrão será aplicada, com recolhimento feito no Domicílio Tributário Eletrônico (DTE) do consumidor. O IBS será partilhado entre estados e municípios; a CBS substituirá o PIS/COFINS com alíquota nacional uniforme.

• IS (Imposto Seletivo): incidirá sobre produtos e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente, como jogos de aposta, fantasy sports e concursos de prognóstico. Previsto no art. 409 da Reforma e regulamentado pela LC nº 214/2025, terá base de cálculo na receita do fornecedor e será cobrado sem possibilidade de crédito. A arrecadação, embora pertença à União, será parcialmente distribuída aos entes federativos, conforme o art. 159 da Constituição.

Importante destacar que o fato gerador do IS ocorrerá no primeiro fornecimento do serviço, e a responsabilidade tributária recairá sobre o fornecedor, mesmo que domiciliado no exterior.

Podemos concluir, por enquanto...

A atual tributação sobre apostas já é pesada — e com a entrada em vigor do IS, prevista para 1.º de janeiro de 2027, será ainda maior. Não se pode alegar omissão do Estado, pois há incidência tributária em todas as etapas da cadeia.

Contudo, os impactos sociais seguem preocupantes. O vício em apostas compromete a saúde mental e o equilíbrio das relações familiares e financeiras. Apesar disso, é improvável que o Estado recue na legalização, dado o potencial arrecadatório e a natureza do modelo fiscal vigente: o Estado-Fiscal não costuma abrir mão de receitas significativas.

A legalização veio para ficar. Cabe agora ao Poder Público equilibrar os ganhos tributários com políticas eficazes de regulação, prevenção e tratamento dos efeitos colaterais de um mercado que, embora lucrativo, é gerador de negativas externalidades.


*Rosa Freitas é Doutora em Direito, advogada, sertaneja, poetisa e autora de artigos e livros jurídicos, dentre eles "A reforma tributária e seus impactos nos Municípios", "Gestão Municipal de Residuos Sólidos" e "A reforma tributária e suas implicações nas compras governamentais e serviços públicos", Editora Igeduc.


**Os artigos assinados expressam a opinião dos seus autores e não refletem necessariamente a linha editorial de O Poder.

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