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Os Censores Viram Pó na História - Crônica Satírica, por Emanuel Silva*

03/06/2025 -

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Em quatro atos e uma eternidade de esquecimento

Ato I – O Delírio do poder: quando o silêncio veste ultraje a rigor

“Cala a boca já morreu?” Que nada. Todo dia aparece um novo entusiasta do silêncio alheio, ressuscitando o velho cala a boca com pompa, gravatá, terno, capa e crachá. São os mesmos sintomas em corpos diferentes: febre de superioridade, delírio de pureza moral, aversão a pluralidade.
Há sempre um momento em que o censor se imagina arquiteto da moral, domador de palavras, curador da realidade. Caminha ereto, peito inflado de decreto, empunha a caneta como lança e ostenta o carimbo de “proibido” como se fosse medalha de honra. Confunde vaidade com virtude, neurose com zelo público.
Mas, para exercer sua cruzada, precisa primeiro enxergar inimigos por todos os lados.
E se não houver? Ele os inventa.

Porque o poder do censor nasce do medo — dos outros, do pensamento livre, e, sobretudo, de si mesmo.

Ato II – A Censura é um espelho trincado

Todo censor tem algo de Narciso: não suporta o que vê. Quer redesenhar o reflexo do mundo para que ele não o confronte. Mas há uma diferença fatal — Narciso afogou-se em sua beleza; o censor, em sua repulsa.
O livro que queima, a charge que mutila, a música que silencia: tudo isso revela menos sobre a obra e mais sobre quem a reprime. É o censor quem tem trauma da liberdade.

Quer eliminar o que não compreende, como se a fogueira apagasse a verdade. Mal sabe ele que palavras proibidas germinam em sussurros — e sussurros, juntos, viram vendaval.

Ato III – A Glória do censor é um vento fraco

No auge da cruzada, o censor é cortejado: colhe manchetes, bajulações e tapinhas dos covardes com microfone. E os áulicos da desplatinada — tão histéricos quanto servis — batem continência ao som do arbítrio. Há neles uma sensação de domínio: como se pudessem podar o pensamento com uma tesoura jurídica.

Mas glória construída sobre silêncio é como castelo de fumaça — impressiona no instante, evapora no tempo.
O mesmo povo que hoje aplaude o inquisidor, amanhã vai lembrar: foi ele quem calou a risada, escondeu o espelho, apagou a música, proibiu a dúvida.

Na terra de Macunaíma, o riso já é contravenção. E a sombra de Kim Jong Hung parece cada vez mais familiar.
Nada envelhece tão rápido quanto um ditador de palavras: a censura caduca, mas a vergonha publicada se eterniza.

Ato IV – O lixo da história tem nome e RG do censor

O fim do censor é sempre o mesmo: varrido para o canto escuro da história. Nem os censores da Albânia escaparam do esquecimento. Nenhum virou herói. Alguns até tentaram virar estátua — mas viraram alvo de pombo.

Alguns tentam se refugiar na patologia, buscando diagnósticos mais nobres que o simples ressentimento.

Transtorno obsessivo por controle? Síndrome da infalibilidade moral? Histeria legislativa?

Mas a causa é mais primitiva: medo. Medo da palavra, do riso, da crítica, do espelho.
E, acima de tudo, de si mesmo.

Porque quem censura, no fundo, não quer proteger ninguém. Quer ser o único a falar.

E quando isso acontece, o mundo o abandona. Primeiro com ironia. Depois com indiferença. Por fim, com nojo.

Epílogo – Para onde vão os censores?

Vão para as notas de rodapé dos livros que tentaram suprimir.

Para os escaninhos mofados de decisões que ninguém mais respeita.

Para as biografias que terminam em silêncio constrangido.

Para a memória coletiva que os resume com desdém:

"Fulano? Ah… aquele que tentou mandar na liberdade. Morreu de insignificância."

Porque no fim, toda censura é uma tentativa de apagar o mundo com borracha rota. Os censores de hoje são como borrachas rotas tentando apagar as palavras da liberdade. Esfregam, esfregam... mas só deixam manchas
Mas o mundo — esse sim, indomável — responde com tinta permanente, rabiscos de resistência, e um recado escrito em negrito na margem da história:

“Proibido esquecer os que tentaram nos calar.”


*Emanuel Silva, é Professor e Cronista


**Os artigos assinados expressam a opinia?o dos seus autores e na?o refletem necessariamente a linha editorial de O Poder.

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