Cultura, Sobre a Diversidade de um Conceito- 3 - Cultura e História, por Socorro Ferraz*
04/06/2025
Odisseu rei de Ítaca, uma das ilhas gregas, situada no mar Jônico, participou da Guerra de Troia e se perdeu na volta a Ítaca, chegando ao país dos Feácios. O rei dos Feácios, Alcinoo, o recebe bem, mas não sabe ao certo sua identidade. Durante sua estada nessa corte, o aedo Demódoco canta episódios que aconteceram na guerra de Troia, inclusive o episódio do cavalo de Troia. O rei Alcinoo percebeu como Odisseu se comoveu durante a narrativa e perguntou-lhe quem é, e de onde vem? Odisseu, então conta a Alcinoo toda sua epopeia desde que parti...
Odisseu rei de Ítaca, uma das ilhas gregas, situada no mar Jônico, participou da Guerra de Troia e se perdeu na volta a Ítaca, chegando ao país dos Feácios. O rei dos Feácios, Alcinoo, o recebe bem, mas não sabe ao certo sua identidade. Durante sua estada nessa corte, o aedo Demódoco canta episódios que aconteceram na guerra de Troia, inclusive o episódio do cavalo de Troia. O rei Alcinoo percebeu como Odisseu se comoveu durante a narrativa e perguntou-lhe quem é, e de onde vem? Odisseu, então conta a Alcinoo toda sua epopeia desde que partiu de Troia até sua chegada na corte dos Feácios. Nesse instante, nasce a História.
Os homens precisam de mitos e de fantasias, para escrever poesias, prosas, desenhar, pintar, descrever fatosalterando-os, muitas vezes em benefício dos seus conceitos. Freud, sempre considerou a fantasia e o mito como construções do homem frente ao real. O que isto significa para a construção da história? Se a cultura é um dos frequentes amparos da história, qual o papel do mito e da fantasia na construção da cultura? E na construção do real? Já que a cultura fundamenta a história e esta se apresenta como a mensageira da verdade, da realidade.
Freud impôs ao psicanalista a tarefa de se tornar crítico da cultura que testemunha. Na minha opinião os historiadores também deveriam se tornar críticos não apenas da cultura que testemunham, da qual muitas vezes são cúmplices, mas das culturas que fundamentam os seus estudos nos tempos e espaços diversos. Em O Futuro de uma Ilusão, Freud demonstrou a existência de um saber, que não se conhecia, até então – o inconsciente; através dele,pode-se entender os sintomas e o mal estar da coletividade humana.
Construiu um instrumental teórico sobre cultura articulado com as bases do saber psicanalítico para o qual o inconsciente pode se apresentar como individual ou coletivo e considerava como fenômeno social toda e qualquer atitude do indivíduo em relação ao outro.Reconheceu que não existe diferença entre cultura e civilização, e que ao estudar o outro, ele se torna estranho. Com seus estudos deu uma grande contribuição para a história, pois, desde a antiguidade somente de conhecer a narração de fatos como o objeto da história.
Para além da narração, o historiador tem que dominar alguns instrumentos de análise que facilite sua compreensão do fenômeno social, podendo discernir sobre mitos e fantasias que envolvem os fatos a serem estudados.
De um certo modo, o objeto de estudos,de um historiador torna-se estranho para ele. O historiador o reconhece fora de si; é nesse momento que se faz a história quando o estudioso se afasta do familiar e trata seu objeto de estudo, como estranho a si, como Odisseu ao ouvir o canto do aedo na corte dos Feácios. Na construção da história a prioridade é o social. Neste recorte pode haver outros como a história religiosa, a história econômica, a história política. Mesmo quando o historiador trata de uma biografia, em geral, faz pontes entre o indivíduo e a sociedade.
Desenvolvimento de um indivíduo as experiências anteriores
No desenvolvimento de um indivíduo as experiências anteriores que viveu continuam tendo efeito no seu presente. Assim também acontece com as nações; as suas práticas, seus experimentos e a condução na sua formação continuam influindo na contemporaneidade dessas nações.
Os mitos do século XIX e XX guardam uma certa distância dos descritos pela mitologia grega, mas continuam associados a cultura e a história de seus países e desses séculos.A história do século XX está plena de grandes mitos;nela, estão líderes políticos responsabilizadospelas mudançasna história de suas nações:Lenine e Stalin na Rússia, Hitler na Alemanha, Mao Tse-Tung na China e Mahatma Gandhi na Índia,para citar alguns.
Reconhecemos o papel do indivíduo na história, mas esses líderes não poderiam ter interferidona história de suas nações sem que as culturas de seus indivíduos não dessem suporte para tanto. Em geral as nações não têm uma cultura única; elas se constituem de várias culturas e são vividas por pessoas comuns. Outros fatores também contribuem para a história das nações, como a luta entre classes sociais, as lutas religiosas, determinadas conjunturas e relações de forças.
Neste trabalho, procuro demonstrar que se pode estabelecer uma ligação direta e às vezes determinante entre cultura e história através de vários exemplos: iniciamos pela Alemanha que se unificou como nação em 1870 e o Brasil que se tornou também uma nação independente de Portugal em 1822.
A análise da formação desses dois estados nacionais indica que Cultura e História andaram de mãos dadas,mesmo considerando as diferentes trajetórias realizadas. Nos dois casos entrou um elemento ideológico – o nacionalismo – que produziu efeitos diferentes. No Brasil, ele teve um efeito positivo, pois se tratava de enfrentar o domínio colonial português e, nesses casos, ele traz um elemento democrático; pode acontecer a união de diferentes etnias ou de classes, mesmo que sejam apenas para aquele evento, a libertação da Colônia.
Este não foi exatamente o caso brasileiro. A cultura escravocrata dominante não permitiu que este elemento pudesse se tornar hegemônico; portanto, durante a guerra da Independência do Brasil, haviam soldados negros combatendo, tanto nos batalhões militares brasileiros como nos dos portugueses, dependiam dos seus senhores, a quem serviam, no momento.
Na Alemanha, o nacionalismo influenciou a sociedade
Na Alemanha, o nacionalismo influenciou a sociedade no sentido de aderir à aspiração de purificar a nação e de eliminar as minorias, além de incutir na sociedade a crença na superioridade racial.
Sobre a relação da Alemanha com a ascensão do nazismo vejamos o que diz Norbert Elias, em seu livro Os Alemães: “o destino de uma nação ao longo dos séculos vem a ficar sedimentado no habitus de seus membros individuais. Não apenas no habitus,mas nas características de suas idiossincrasias, na estrutura social e nos comportamentos, que formam a personalidade de seus habitantes”, completa o historiador.
Por hábito, Norbert Elias entendia ser a segunda natureza ou saber social incorporado. Este conceito substituiu a antiga noção do caráter nacional, fixo e estático. O conceito de habitus implica em equilíbrio entre continuidade e mudança.
Isto não significa que o hábito seja estático.O hábito pode mudar pela educação, principalmente se esta tomar o rumo de substituir os velhos hábitos por novos hábitos, direcionados às crianças e aos jovens.
Para justificar o comportamento dos alemães ao longo do século XX, NorbertElias, baseado em alguns eventos históricos, cita alguns fatos que atingiram a população alemã: a devastação que a guerra dos 30 anos trouxe para aquela sociedade; a tardia unificação da Alemanha, se comparada a França e a Grã-Bretanha e o fato desta unificação haver acontecido dentro de um processo de militarização, onde os valores humanitários foram abandonados. Para este autor, estes fatores contribuíram, de maneira decisiva, para a brutalização de vários setores das classes médias alemãs.
A política racista dos nazistas, contra judeus, ciganos e negros não poderia ter acontecido se grande parte da sociedade não houvesse apoiado.Antes mesmo da ascensão de Hitler e do nazismo havia uma violência latente nas veias da sociedade burguesa, das classes médias, observou Teodor Adorno, numa palestra na Associação de Estudantes Socialistas da Universidade de Viena, em abril de 1967. Na sua fala, ele aborda casos específicos como os dos valentões do pátio da escola de sua infância: “os cinco patriotas - que atacaram um único colega- espancaram-no e quando ele reclamou ao professor, o difamaram como um traidor da classe”.
Este episódio lembrou outro, que presenciei na Alemanha, muitos anos depois da Segunda Guerra Mundial, precisamente em 1974 e 75, em Bochum e em Bielefeld, cidades da Westfália, no norte, região considerada politicamente mais avançada, onde o Partido Social Democrata era majoritário, na época; crianças estrangeiras, chilenas, brasileiras, bolivianas, mexicanas, cujos pais eram exilados políticos, eram cotidianamente espancadas e cuspidas por um grupo de crianças numericamente superior, no pátio da escola, na saída da escola, e perseguidas quando já estavam nas ruas. Este passado alemão, não quer passar.
Adorno continuou demonstrando em sua palestra que o fascismo nunca poderia ser enfrentado e derrotado se fosse visto apenas como o outro liberalismo, um patógeno exótico que viera de fora, porque ele estava dentro daquela sociedade. O fascismo não se constitui de elementos estranhos a qualquer sociedade ele se compõe de elementos básicos do nosso mundo comum, ele é interno não é estranho.
Autoritarismo não é exclusivo do indivíduo
O autoritarismo não é exclusivo do indivíduo, reflete as condições objetivas da sociedade moderna. Esta tendência pode ser detectada nos aspectos mais comuns da vida cotidiana.
Contemporaneamente a Alemanha é considerada uma democracia formal, mesmo assim pode produzir movimentos reacionários e de ressentimentos. Atualmente surgem grupos de extrema direita como o NPD – partido nacional democrático – neofascista.
A ideia que os europeus têm de si mesmos como civilizados e superiores supõe que existem outros povos com padrões inferiores
de civilização considerados incivilizados. Este conceito presidiu as colonizações da América, da África e da Ásia transmitindo a ideia de que pretos, índios e asiáticos devem servir aos descendentes dos brancos colonizadores. E aí, estiveram presentes todos os países colonizadores, como a França, Bélgica, Itália, Inglaterra, Espanha e Portugal para citar apenas a Europa ocidental.
Boa parte dos americanos brancos nascidos nos Estados Unidos têm também esta atitude de superioridade diante dos povos latinos da América ou diante de povos africanos e asiáticos. Um bom exemplo dessa atitude pode ser vista nos filmes americanos que exploram aventuras na África. Desce do céu ou de paraquedas ou de helicóptero um americano em plena floresta, encontra um nativo e a primeira comunicação é: “você fala a minha língua?”
Há uma percepção errônea da teoria e dos processos civilizatórios como uma teoria otimista, unilinear e de progresso da história humana, que promove um reconhecimento mais amplo do lugar dos processos civilizadores dentro da teoria geral. Isto deve ser repensado.
‘O processo civilizador’ no Brasil, presididopelo colonizador, obrigou índios e negros a recalcarem suas culturas a menosprezarem suas aparências físicas e respeitarema cultura, trazida pelo colonizadorapresentada como superior. A violência foi o meio para fazer valer o domínio dos portugueses.
O Brasil não tem passado nem presente livre dessa marca. O nosso passado é de extermínio e escravização dos indígenas e de deslocamento de africanos dos seus respectivos países e de dispersar famílias para melhor servir aos senhores; serviços exaustivos, muitas vezes até à morte. A sociedade branca, auxiliada pela fé católica, (houve exceções), acreditava que os pretos não tinham alma, que eram animais e, por esta razão poderiam ser escravizados, sem que fosse atormentada pela ideia do inferno. Transformando índios e africanos em escravos, brutalizou não apenas esses, mas toda população que apoiava esta instituição. Desde a elite branca aos brancos pobres.
A cultura do poder no Brasil, transmitiu a muitas gerações a assertiva de que o direito, quando não é sustentado pela violência física, não funciona. Isto é válido até para o século XXI. Esta crença esteve presente entre os movimentos sociais do século XX, como as Ligas Camponesas.
A bandeira de Francisco Julião “Reforma Agrária, na Lei ou na Marra” denuncia a presença também da violência como resposta à violência recebida pelos camponeses.Por ver tanta injustiça patrocinada pelo direito do Estado, pela polícia, pelas milícias a serviço de latifundiários, banqueiros e industriais reacionários é que os camponeses e os trabalhadores urbanos das organizações da luta armada acabaram por acreditar que precisariam de um poder físico violento para fazer valer os seus direitos à cidadania, representada no cumprimento das leis trabalhistas.
Assisti a invasão do engenho Serra, em Pernambuco, os churrascos com os bois alheios..., os assaltos a bancos, sequestros... em nome de uma ideologia que poderia lhes fazer justiça. A polícia, o exército e as milícias particulares estavam a serviço dos conservadores tradicionais e não a serviço do Estado, para fazer cumprir a lei.
A cultura de violência
Esta cultura da violência atingiu tanto a direita como a esquerda políticas. A tentativa dos comunistas de chegar ao poder em 1935, através de um putsch, deveu-se a esta ideia: somente se chega ao poder com o cano de um fuzil; era a cultura da época?
Se toda ideologia é uma mitologia, segundo Elias, faz sentido pensar que a população despolitizada, precisa de mitos. Podemos citar no Brasil Luís Carlos Prestes, Bolsonaro, Getúlio Vargas, Vergolino Lampião, Antonio Conselheiro, Frei Damião e muitos outros.
Já foi dito aqui que grande parte da cultura brasileira foi sedimentada na violência, que produziu a submissão: a colonização, a emancipação política, a proclamação da República... os golpes de Estado, mas não apenas nos marcos históricos que assinalamos, este traço aparece principalmente no cotidiano da sociedade, no racismo, no feminicídio, na desigualdade das classes sociais, no acesso à educação de qualidade,nos salvadores religiosos e tantas outras injustiças.
Como os mitos e os desejos reificados nas fantasias reforçam a cultura de uma sociedade? Primeiro tem que haver um fundamento; um acontecimento, que se repita e se torne um hábito social e que se transforme em promessa e que contenha um valor de pactuação social. Precisamos fazer a diferença entre mito e fantasia; os historiadores deveriam distinguir sese trata efetivamente de fantasias ou se estamos tomando nossas fantasias pela realidade. Nesse último caso, nos enganamos a nós mesmos...
No Brasil continuamos a cultivar o mito da subordinação a reis, rainhas, princesas, religiosos, (como Frei Damião no nordeste) aliás, a quem detém o poder. Todas estas entidades estão presentes nas manifestações mais populares, inclusive de quem pela origem sofreu com o processo civilizador’ brasileiro. O culto à monarquia aparece na maior manifestação popular do país, nas escolas de samba, no carnaval, como expressão de seus sonhos, de suas utopias. Para reconhecer a liderança de qualquer pessoa em sua área de atuação, colocamos um título que antecede o nome: o rei Pelé, a rainha Xuxa, o mito Bolsonaro, o rei das coxinhas, Emilinha Borba a rainha do rádio e outros.
Pesquisa
Na pesquisa sobre a Ocupação do Médio São Francisco em Pernambuco, que coordenei, nos anos 90 do século passado, encontrei livros de batismo de paróquias católicas dessa região, do século XIX e apenas um do século XVIII. Neles se encontram registros de batizados, com nome, data de nascimento, local, cor, raça e nome dos padrinhos dos nascidos de pais brancos, de pretos libertos, de escravos e de índios e dos padrinhos, inclusive.
Chama a atenção os padrinhos dos filhos de escravos batizados na Igreja Católica; os padrinhos masculinos dos filhos de escravos são seus próprios senhores, mas o inusitado da informação é que as madrinhas são em geral mulheres índias ou pretas libertas, nunca as mulheres brancas, casadas com os senhores proprietários.
Qual o significado dessa diferença? Que cultura se instalou nesses confins para tornar a discriminaçãouma prática rigorosa. Na minha visão de historiadora, esta diferença, faz muita diferença. A cultura da escravidão no Brasil alcançou os rincões mais longínquos (mesmo que no sertão ela tenha chegado numericamente inferior à região da zona da mata) e assim como o fascismo na Alemanha não é estranha à sociedade brasileira, faz parte intrinsecamente dela.
Ao alijar a esposa do branco proprietário de terras e de gados do compadrio, o senhor está assegurando que este afilhado ou afilhada se ficar órfão ou órfã não participará da divisão dos bens do proprietário. Na cultura religiosa da época, os órfãos seriam automaticamente adotados pelos padrinhos.
O historiador francês Paul Veyne, no seu livro Como se escreve a História (Edições 70, Lisboa, 1971) comenta que há dois princípios na construção da História:a especificidade, que se ocupa do caráter especial do indivíduo – os gregos usavam muito - e o da singularidade, que se constitui na particularidade, peculiaridade, extravagância, na distinção entre os outros. Com base nessa singularidade, podemos fazer os recortes para uma história econômica, história política, uma história social.
Dividimos os fatos em espaço e tempo mais pela singularidade do que pela especificidade, portanto o conhecimento histórico não se dá por inteiro, pela sua totalidade. Mesmo que o historiador faça uma história utilizando muitos rastros abrangentes dos acontecimentos sobre um tempo e um espaço, ela, a história, não será uma história total.
A escola francesa – LesAnalles – e a escola marxista fazem uma história macro, como a cultura material dos povos. A escola francesa mudou um pouco esta visãoao defender que todos os acontecimentos ordinários ou extraordinários são dignos dos estudos históricos. Neste enfoque está presente a relação íntima entre história e cultura.
Georges Duby, que teve sua formação de historiador na escola francesa confessa que é muito difícil a objetividade do conhecimento histórico; sendo a história escrita por um ser humano ela reflete muito a essência desse ser: a escolha do tema, a construção do problema e as hipóteses para resolvê-lo.Temos que levar em consideração no trabalho dos historiadores o meio em que viveram e sua própria personalidade.
Com esses enunciados, como podemos escrever ou defender uma história mais objetiva e mais científica?
Ao contrário do que afirma Castoriadis em A Criação Histórica, os acontecimentos não são fatos construídos independentemente uns dos outros. Um fato poderá desencadear outros, mas não devemos juntar ao conceito de processo a ideia de progresso. A história se faz também com muito retrocesso.
Expansão da cultura de massas
No século XX, com a expansão da cultura de massas, surge dentro do princípio da singularidade os estudos do cotidiano.A história é singular, ela pertence a essência do ser. A singularidade do indivíduo e da sociedade fazem únicos este indivíduo e esta sociedade.
Disse Claude Levi Strauss que “as diferentes sociedades humanas resultam apenas de combinações diferentes de um pequeno número de elementos variáveis. Será que é possível fazer estas combinações para a reprodução de sociedades?Todas essas possibilidades dependem da cultura dessas sociedades.
Os escritos históricos, em geral, estão associados aos lugares de partida, assim como a personalidade do pesquisador.Se a formação do narrador é a cultura popular
e se seu saber é transmitido pela oralidade, os seus escritos vão se destinar a um público com a mesma compreensão. É o caso da literatura de cordel que abrange um grande número de ouvintes e leitores.
Michel de Certeau relata em seu livro,“A Invenção do Cotidiano”, a viagem que realizou pelo nordeste brasileiro, em 1974.
Contatou lavradores de Pernambuco, do Crato e do Juazeiro, do Ceará; viu a situação desses homens comuns, conheceu através dessas falas o herói carismático da região, Frei Damião e registrou dois espaços: o socioeconômico da região, onde aflora a luta entre os poderosos e os pobres, campo de perpétuas vitórias dos ricos, auxiliados pela; e o espaço utópico onde se afirmavam os pobres com os relatos religiosos, milagrosos de Frei Damião. Segundo Certeau, o discurso pode ser lúcido, mas as palavras são falseadas e proibidas de dizer para não mostrar a injustiça não só dos poderes estabelecidos, mas de modo mais profundo a injustiça da História que reconhece uma ordem das coisas, mas não autoriza a mudança.
O herói milagroso
O herói milagroso, Frei Damião, vem do céu para vingar e redimir os desafortunados. A história do nordeste brasileiro está fundamentada na cultura da região.
Os heróis, os homens extraordinários e os homens comuns – combinação da ilusão do espírito e a desventura social – estão bem descritos em“O mal estar da Civilização e o Futuro de uma ilusão” por Freud. Este trabalho estabelece um contrato com o homem ordinário e conjuga o seu discurso com a multidão cujo destino comum consiste em ser enganada, frustrada, forçada ao trabalho cansativo, submetida portanto à lei da mentira e ao tormento da morte.
Estes homens comuns utilizam um quadro de referência vindo de um poder externo – a religião importada foi modificada pelos missionários. Reproduzem um sistema, que não lhe é próprio. Assim também como os cangaceiros de Lampião reproduziram um sistema de poder já existente, que eles supostamente combatiam.
A história escrita com base em documentos de arquivo, resquícios de algumas verdades, sobras, rastros e fios pode levar, se bem urdidos, à trama, que produziu o fato, tenta reconstruir um mundo, que o historiador nunca conheceu. Somente conseguirá encontrar o passado se usar bem a imaginação, se organizar o problema que tem em sua mente a ser resolvido e se conhecer bem a cultura da sociedade estudada.
O pesquisador da História é um inventariante. Ele faz a seleção do tema, das palavras antigas [ou novas] e seus significados, ele se afasta do mundo contemporâneo. Quando ele consegue produzir o discurso histórico – aí, nasce com ele o historiador.
Quando estudei os liberais e suas diferenças, no processo de emancipação do Brasil, no século XIX, descobri que suas propostas não estavam de acordo nem com a cartilha liberal, nem com minhas expectativas.
Ao fazer um mergulho naquele passado, com auxílio de algumas teorias e metodologias históricas e sociológicas descobri que não havia identidade sob a diversidade dos tempos e lugares. Ao estudar esta elite propositiva de uma nova sociedade, percebi que se tratava de propostas convenientes ao bem estar e ganhos daquelas classes.
Nunca esclareceram o que fariam com a instituição da escravidão e, quando os proprietários de terras e de homens recuaram o apoio à Revolução de 1817, os revolucionários tentando cooptá-los, foram ágeis na resposta, fundamentada na cultura da época: “por mais que nos seja honroso nunca dissemos que libertaríamos os escravos”.
Como diz Michel de Certeau, existe oculto em tal passado certa estruturação, que nos oferece resistência; por outro lado há também oculto em nossas intenções e preconceitos outro tipo de estruturação que determina o olhar de curiosidade do historiador. Nessas duas formas do “oculto’ emerge a verdadeira história, que articula os dois ocultosem um texto jamais encerrado.
Cabe ao historiador ao perceber o passado oculto, analisá-lo e revelá-lo num texto histórico com contexto cultural, para que haja sincronia entre a história e a cultura, que induziu ao fato.
O texto deve ser compreendido culturalmente, porque é um passado que deve ser visto por leitores do presente com suas atitudes, hábitos, idiossincrasias e julgamentos do presente.O texto histórico é revelador quanto a cultura do historiador e a cultura da sociedade no qual está inserido.
Todas as disciplinas ligadas à cultura de uma sociedade interessam à História. Há artistas que ao executar sua arte contam algo para o observador. PieterBruegel, o velho, que viveu há quase 450 anos atrás, tinha uma forma muito especial de mostrar não apenas o cotidiano da vida, principalmente dos camponeses, mas o que está além do horizonte, além do cotidiano, além da repetição. No seu quadro “Paisagem com a Queda de Ícaro” pode-se apreciar a paisagem e as figuras. Pode-se estudá-las, mas um investigador arguto pode constatar a História astutamente disfarçada.
A história de Ícaro e Dédalo, seu pai, faz parte da mitologia grega; os europeus a conheceram por Ovídio, poeta romano (viveu entre 43 a.C e 17 d.C). Bruegel, provavelmente tomou conhecimento dessa história mitológica e pintou um quadro com o desfecho da história. Mais que isto. Retratou uma sociedade hierarquizada, repetitiva e o porvir. Na pintura aparece a queda de Ícaro do céu ao mar testemunhada por um lavrador, um pescador e um pastor. Entretanto, eles não se abalam com a queda de Ícaro, olham noutra direção, cada um continua repetindo seu afazer. O lavrador preocupado em não cair do terreno acidentado, onde se encontra; o pastor vê, mas dá as costas para Ícaro, não o socorre; o pescador olha para cima e não vê o voo e nem vêÍcaro emaranhado nas suas linhas de pesca.
Todos parecem estar absortos em suas tarefas repetitivas do dia a dia, olhando em outras direções. Nenhum deles ajudaIcaro, visto sempre como símbolo da ambição; entretanto, Bruegel viu muito mais longe ao transformar a informação pictórica em uma cena de seu quadro que aponta para outras questões, talvez mais importantes.
Segundo o crítico de arte, Richard Mühlberger, autor do livro “o Que Faz De Um Bruegel Um Bruegel?a história de Ícarosempre foi interpretada como um aviso: as pessoas devem ficar satisfeitas com o que têm. A atitude das três testemunhas não entraram no mérito da questão; nenhum deles percebeu o valor da nova ideia de Dédalo ou a necessidade de oferecer ajuda a Ícaro.
A história disfarçada nessa cena indica os personagens Dédalo e Ícaro como inovadores, prevendo um mundo novo que pode surgir a qualquer momento e denuncia a cultura daquela sociedade, repetitiva e sem inovação em que viviam o lavrador, o pastor e o pescador.
Outra leitura dessa cena, feita por João Castel-Branco Pereira e Nuno Vassallo e Silva, em “As Idades do Mar” traz o significado de derrotar a ambição de ultrapassar os limites do possível, enquanto a vida segue sua ordem natural. Os autores reconhecem que os três personagens, que aparecem na cena, não têm o olhar para o mais importante recorte do quadro: o navio que se afasta da costa e se destina ao mar, aparta-se daquele velho mundo, que continua igual a si mesmo, mas no horizonte está um mundo novo de possibilidades e oportunidades...” que dará nascimento a uma nova cultura e história.
*Socorro Ferraz é historiadora.

Veja outras notícias
Brasil deixou sua indústria bélica ser sucateada, analisa neste artigo Marcelo S. Tognozzi*
13/12/2025
Rio Branco enxergava longe e sabia que o Brasil precisava de um Exército bem treinado e profissional. Naquele tempo as forças armadas eram a Marinha e o Exército, ambos influenciados por governadores que se achavam generais. Os estados tinham suas tropas e, muitas vezes, havia exércitos particulares, como nas guerras civis do Sul. Aquilo era um fordúncio, com soldados marchando descalços e sem treinamento.
Entre os militares enviados à Aleman...
Um general veterano conta que no início do século 20 havia três tipos de militares: os que ainda acreditavam na volta do Império, os que só queriam o soldo no fim do mês e os jovens turcos que acreditavam poder refazer a República do zero e mudar o mundo. Em parte, eles conseguiram. Eram oficiais enviados à Alemanha entre 1906 e 1912 para receber treinamento militar de primeira linha. O acordo foi costurado pelo Barão do Rio Branco e o então ministro da Guerra Hermes da Fonseca com o governo do imperador Guilherme II.
Rio Branco enxergava longe e sabia que o Brasil precisava de um Exército bem treinado e profissional. Naquele tempo as forças armadas eram a Marinha e o Exército, ambos influenciados por governadores que se achavam generais. Os estados tinham suas tropas e, muitas vezes, havia exércitos particulares, como nas guerras civis do Sul. Aquilo era um fordúncio, com soldados marchando descalços e sem treinamento.
Entre os militares enviados à Alemanha estavam Euclides Figueiredo, Bertoldo Klinger, Estevão Leitão de Carvalho e Cesar Augusto Parga Rodrigues criador da revista Defesa Nacional, porta-voz dos jovens turcos. Eram conhecidos assim por se identificarem com Mustafá Kermal Ataturk, fundador da República Turca, seguidor da doutrina militar prussiana. Queriam para o Brasil as reformas que Ataturk impulsionou na Turquia. E rezavam pela cartilha do positivismo de Benjamin Constant.
Mas a cooperação com a escola alemã durou pouco. Veio a 1ª Guerra e a França passou a ser a grande influenciadora do Exército brasileiro. Foi a partir da missão francesa que surgiram as escolas militares, doutrina, treinamento eficiente e unificação do Exército. A França formou uma geração de militares que pegariam em armas em 1922, 1924 e 1930, quando finalmente tomam o poder com a revolução liderada por Getúlio Vargas.
Governo ou geometria?
Os jovens turcos foram ver o presidente e entregaram um gordo documento de centenas de páginas, com gráficos, esquemas geométricos e outras firulas. Getúlio olhou aquilo e perguntou: “Isso é governo ou geometria?”. “É geometria aplicada ao governo”, respondeu um deles. Getúlio, raposa velha, arrematou: “Vocês são bons de quartel, mas na política se complicam”.
A França influiu na formação militar até 1940, quando suas defesas se mostraram um fiasco frente ao poderio bélico alemão. Com a 2ª Guerra, os Estados Unidos passaram a influir cada vez mais nas nossas forças armadas. Isso perdurou até o depois da redemocratização. Com o governo Fernando Henrique, começou a fase de submissão absoluta das Forças Armadas ao poder civil com a criação do Ministério da Defesa.
Os traumas do passado, especialmente do governo militar, fizeram com que esta submissão tivesse seus percalços, especialmente depois de 2023, com a posse de Lula. A esquerda vê com desconfiança as Forças Armadas, que vê a esquerda com desconfiança. Um sempre acha que o outro quer dar um golpe. E isso acabou influindo decisivamente na capacitação, investimento em equipamentos, armas e munições.
Indústria bélica sucateada
Existem situações que precisam urgentemente ser revistas, principalmente num momento em que o mundo todo dá sinais de conflitos iminentes. O Brasil deixou sua indústria bélica ser sucateada, depois de exibirmos uma performance acima da média produzindo blindados e foguetes no fim do século passado. Nós hoje poderíamos ter uma indústria de helicópteros capaz de abastecer o mercado interno e externo, mas comemos nas mãos dos franceses. Eles voltaram a ter hegemonia aqui. Com a já conhecida simpatia zero.
A coisa é pior do que se imagina. O presidente Lula tem à disposição helicópteros EC135 franceses obsoletos, com 18 anos de uso. É no mínimo falta de bom senso deixar o presidente da República voar nestas carroças aladas. Aliás, em outubro do ano passado, Lula e sua comitiva tomaram um susto com uma pane no Airbus francês presidencial, obrigado a sobrevoar a cidade do México por mais de 4 horas para queimar combustível. Simplesmente porque venderam um avião sem o equipamento que esvazia os tanques de combustível numa emergência. Claro que o presidente não sabia disso, mas quem comprou, sabia e imaginou que este tipo de situação nunca aconteceria. Será que haveria este sufoco se o avião presidencial fosse produzido pela Embraer?
O Brasil parece um imenso ferro velho militar quando se trata de aeronaves, navios e carros de combate. Nosso porta aviões tem 30 anos, o navio de desembarque de carros de combate é de 1966. Ambos são ingleses. Temos aqueles Mirage franceses obsoletos, puro ferro velho, e dos 36 caças Grippen suecos comprados recebemos apenas 11. Os outros não chegaram por falta de pagamento.
Na mão dos franceses
No quesito helicópteros, o Brasil está praticamente nas mãos dos franceses, os mesmos, aliás, que melaram o acordo com o Mercosul. Querem empurrar para a nossa Marinha helicópteros com trem de pouso fixo, quando os mais indicados para o pouso num convés em alto mar é o helicóptero com rodas, porque elas amortecem e evitam acidentes, especialmente à noite.
Existem vários fabricantes de aeronaves e armas no mundo. Ficar nas mãos de um só é temeridade. Temos submarinos sendo construídos com parceria francesa, inclusive um nuclear que nunca saiu do papel e já ficou obsoleto antes de existir, porque só deve virar realidade em 2032. O Brasil já foi uma potência em construção naval, mas perdeu fôlego e hoje entregou o mercado de plataformas da Petrobras para chineses e coreanos. E pensar que entre 1840 e 1910 tínhamos a segunda Marinha do mundo, rivalizando com os britânicos.
No dia 30 de setembro do ministro da Defesa José Múcio Monteiro foi ao Senado e falou sobre a situação de abandono das nossas Forças Armadas, responsáveis por defender 8 mil km de costa, 16,8 mil km de fronteiras e um espaço aéreo de 8,5 milhões de km quadrados. É muita missão para quem não tem dinheiro para o combustível, que dirá para as peças de reposição.
Necessidade para o país
O Brasil precisa de Forças Armadas bem equipadas e treinadas, como imaginou há mais de 1 século o Barão do Rio Branco. Não é normal um Exército incapaz de combater, uma Força Aérea que não voa e uma Marinha que não patrulha nossa costa.
Infelizmente ainda vale a piada da época dos jovens turcos. Instrutor francês no interior de Minas, vê soldados marchando com uniformes improvisados e pergunta: “Mon Dieu, onde está a brigada mecanizada?” E o comandante mineiramente: “Tá chegando professor. Assim que as mulas descansarem”.
*Marcelo S. Tognozzi é jornalista e consultor. Uma das principais referências da imprensa brasileira contemporânea.
NR - Autorizada a postagem do artigo, originalmente publicado no Poder360. O título foi mudado e os intertítulos inseridos à revelia do autor.
As aventuras de Cacimba 18 —Cacimba e o dia em que o céu virou chão
13/12/2025
Foi numa terça-feira que tinha cara de sábado, cheiro de quinta e preguiça de domingo. A cidade ainda tentava entender a história do trem que andava sem trilho quando outra coisa impossível resolveu acontecer:
O Céu desceu.
Desceu mesmo, encostou no chão como se estivesse cansado de altitude. No começo, o povo achou que era neblina. Depois, acharam que era castigo. Em seguida, disseram que era praga. Por fim, concluíram com toda a sabedoria popular:
— Isso só pode ser coisa de Cacimba.
O céu estava tão baixo que dava para passar a mão nele. E era macio.
Macio como a barriga de um boi dormindo.
Tinha gosto de chuva guardada e cheirava a lembrança molhada.
As crianças começaram a fazer bolhas de nuvem e arremessar umas nas outras. Os velhos, sempre mais sérios, passaram a medir o céu com fita métrica, dizendo que aquilo não podia estar dentro da ABNT celeste.
Por Zé da Flauta*
Foi numa terça-feira que tinha cara de sábado, cheiro de quinta e preguiça de domingo. A cidade ainda tentava entender a história do trem que andava sem trilho quando outra coisa impossível resolveu acontecer:
O Céu desceu.
Desceu mesmo, encostou no chão como se estivesse cansado de altitude. No começo, o povo achou que era neblina. Depois, acharam que era castigo. Em seguida, disseram que era praga. Por fim, concluíram com toda a sabedoria popular:
— Isso só pode ser coisa de Cacimba.
O céu estava tão baixo que dava para passar a mão nele. E era macio.
Macio como a barriga de um boi dormindo.
Tinha gosto de chuva guardada e cheirava a lembrança molhada.
As crianças começaram a fazer bolhas de nuvem e arremessar umas nas outras. Os velhos, sempre mais sérios, passaram a medir o céu com fita métrica, dizendo que aquilo não podia estar dentro da ABNT celeste.
Cacimba, claro, apareceu com a calma de quem já viu o impossível estacionar na porta de casa.
— Eita, o céu cansou de ficar pendurado. Desceu pra prosear.
Os macaquinhos nos ombros dele cochichavam:
— Diz que foi tu.
— Diz que não foi não.
— Diz que sim outra vez.
Cacimba riu, aquele riso que parece poeira brilhando no sol.
— Eu só chamei, meus filhos. Foi ele que veio.
E explicou, como se fosse a coisa mais simples do mundo:
— O céu se sente sozinho. Vive lá em cima sem ninguém pra fazer um carinho. Hoje resolveu encostar na terra pra sentir o pulso do chão.
Foi aí que começaram as estranhezas.
As galinhas, assustadas, botaram ovos quadrados.
Os cachorros latiram para o alto e responderam ao próprio eco.
Teve um vaqueiro que, ao ver o céu baixo demais, tentou laçar um pedaço azul para vender na feira como “nuvem de estimação”.
Tudo estava confuso, mas bonito.
Parecia que o mundo finalmente decidira descansar a coluna.
Só que, como toda coisa bonita demais, veio também o medo.
Dona Beata, a rezadeira, gritou que o fim dos tempos era aquilo mesmo.
Seu Zé do Açúcar jurou que viu o sol piscando.
E o padre anunciou que, se o céu continuasse ali, não dava mais pra prometer paraíso no alto — no máximo um bairro vizinho.
Cacimba então bateu o pife no chão, fez um som que parecia galope de estrela, daqueles que Dom Fredom gosta, e falou para o povo:
— Quando o céu vira chão, minha gente, é o mundo lembrando que tudo que é alto quer ser baixo e tudo que é baixo quer ser alto. É só um abraço grande.
E, com isso, ajoelhou-se, encostou a testa no chão e sussurrou uma coisa inaudível.
As nuvens estremeceram.
O azul fez um arrepio.
E o céu, lentamente, começou a subir de volta, como quem acorda de um sonho bom e não quer levantar.

No exato momento em que recuperou seu lugar lá em cima, caiu uma chuva miúda, fina, doce, parecendo lágrima feliz.
Cacimba se levantou, limpou o rosto com a manga da camisa e disse:
— O céu só queria ser ouvido. Igual a gente.
Depois sumiu pela rua estreita, com os macaquinhos discutindo se o céu tinha sotaque.
Desde então, vez ou outra, quando o entardecer fica pesado e dócil, o povo comenta baixinho:
— O céu tá ensaiando outra visita… Será que Cacimba chama de novo?
E ninguém duvida.
*Zé da Flauta é músico, compositor, filósofo e escritor.

Entrevista: “STF precisa ser só Corte constitucional”, diz jurista José Paulo Cavalcanti Filho
13/12/2025
O PODER: Recentemente o senhor disse...
Jurista, ex-ministro da Justiça, três vezes imortal — na Academia Pernambucana de Letras, na Academia Brasileira de Letras e na Academia de Portugal, sediada em Lisboa — e escritor, José Paulo Cavalcanti Filho pregou recentemente que o Brasil passe a ter um Supremo Tribunal Federal (STF) “mais constitucional”. Ele fez um comparativo entre a Corte Suprema brasileira e as de outros países, que julgam muito menos processos por ano e se atêm apenas a casos sérios relacionados à Constituição. “Essas Cortes julgam menos casos”, disse, ao acrescentar que se atuasse dessa forma, o STF deixaria de ser instância revisora de outros tribunais e também não admitiria mais decisões monocráticas (unilaterais dos ministros). “Claro que podemos ter problemas. Com o Supremo declarando que as novas regras, definidas pelo Congresso para a Constituição, seriam inconstitucionais. Não seria caso único no mundo”, enfatizou, na entrevista que segue abaixo.
O PODER: Recentemente o senhor disse que o Supremo Tribunal Federal (STF) tem dois problemas graves, um por dentro do outro. Que problemas são esses?
José Paulo Cavalcanti Filho: Um é estrutural e outro, conjuntural. Em relação ao problema estrutural, minha posição é que o Supremo julga casos demais, quando o que deveria era seguir a regra das Cortes Constitucionais importantes no Primeiro Mundo. Basta ver como julgaram, no ano passado: Estados Unidos, 80 casos; França, 80; Inglaterra, 82; Alemanha, 90; e Canadá, 44. Para muitos, o Canadá tem o melhor sistema judiciário do mundo. Com a Supreme Court of Canada se reunindo em janeiro, abril e outubro, para julgar apenas causas revestidas de public importance ? segundo Gentili (Protective Rights in a Worldwide Rights Culture).
Enquanto isso no Brasil, segundo a internet (com indicação “dados do STF”), são “aproximadamente 114 mil”. O CNJ [Conselho Nacional de Justiça] deveria fornecer um número exato, afinal sua função é exercer algum tipo de controle sobre essa atividade, mas ninguém tenha esperança nisso. Que, no seu site, apenas se vê “cerca de 110 mil”.
O PODER: O que o senhor aponta como mais impactante em relação a esses números?
A consequência nefasta desse número pantagruélico de casos é o excesso de decisões monocráticas tomadas pelo Supremo. Simplesmente porque não funcionaria, sem elas. O CNJ não sabe quantas foram. Ou não diz. Algo ruim, nos dois casos. Como se tivéssemos que escolher entre inércia (não se dar a esse trabalho) e prepotência (o considerar que isso não interessa a ninguém). Por sorte o Ministro Barroso nos salvou ao dizer em discurso recente, numa espécie de Prestação de Contas por sua gestão na presidência da Casa, terem sido no ano passado exatos 92.805 casos. Grave, aqui, é que decisões monocráticas existem só no Brasil.
O PODER: Nenhum outro país concede este tipo de decisão?
Em nenhum outro dos 193 Estados Membros da ONU [Organização das Nações Unidas]. Vale explicar um ponto. É que nos Estados Unidos e na Grã-bretanha, em situações de extrema gravidade e urgência, quando não esteja reunida a Corte, pode o ministro plantonista decidir. Mas essa decisão fica sem aplicação, até que seja convocado o plenário para deliberar sobre o caso. E vale, apenas, se a maioria (usualmente a totalidade) da Corte aprovar.
Ninguém decide sozinho, pois, essa é a regra de ouro para todos os tribunais do planeta (menos em nosso Supremo, talvez por se considerar melhor que os outros). Dado não fazer sentido, numa Democracia moderna, tanto poder concentrado em apenas uma pessoa. Devendo as decisões nesses outros países serem todas, sempre, coletivas. Não de um Ministro, apenas, mas do Tribunal como uma coletividade. Sem contar que o Supremo, nos tempos atuais, deseja ir ainda mais longe.
O PODER: Mais longe em que sentido?
Faz pouco, por exemplo, que o Supremo enviou ofício a todos os tribunais recomendando que, “nos feitos representativos de controvérsia, ainda que se vislumbre questão meramente infraconstitucional, seja admitido o Recurso Extraordinário”. A fim de permitir o pronunciamento do Supremo sobre a existência, ou não, de matéria constitucional em cada caso. Eventualmente, com Repercussão Geral. O que significa mais casos. E mais decisões monocráticas.
O PODER: E sobre a questão conjuntural que o senhor mencionou? Qual é o problema do STF quanto a isso?
Tudo começou com Prudente de Moraes e Ruy Barbosa, ao redigir a Constituição de 1891. Preocupados com o fim caótico do Império, e o início também caótico da República, decidiram recriar o Poder Moderador, até então exercido por Pedro II – que, com seu enorme bom senso, garantiu estabilidade ao país naquela quadra histórica conturbada. Esse papel foi por eles atribuído ao Supremo. Que, além de decidir questões da Constituição, também passou a ser instância revisora do Poder Judiciário. Como se dava com Pedro II; quando, por exemplo, comutou todas as condenações com penas de morte depois do caso Mota Coqueijo.
Fosse pouco ainda se auto-outorgou o Supremo, bem além disso, o papel de Poder Legislativo. E de Poder Executivo. Todos sabemos, tantas foram as decisões, nem será preciso dar exemplos. E as últimas, senhores, são estelares.
O PODER: Mesmo assim, o senhor poderia nos dar exemplos mais detalhados?
O ministro Dias Toffoli, por exemplo, decidiu que o caso do Banco Master é dele ? a partir de uma filigrana, pouco séria, de que haveria contrato do banqueiro com um deputado, no meio da papelada, o que garantiria foro privilegiado. Quando esse Deputado nem investigado é. Qual contrato?, ninguém sabe. O que diz?, também ninguém sabe. Nem saberá que paira, sobre o processo, um estranhíssimo “sigilo absoluto” decretado pelo ministro. O mesmo que andava em jatinhos particulares do Banco Master, em conversas secretas com Augusto Arruda Botelho, advogado de Daniel Vorcaro, dono do jatinho e do Banco.
Fosse pouco, o ministro Gilmar Mendes não aceita que o povo requeira no Senado o impeachment dele e de seus colegas, como regulado na Constituição (artigo 52, II) e na Lei 1.079, de 10/04/1950 (artigos 6º e 7º). E o dito artigo 52, quando se usa a sua mirabolante interpretação, nos leva a uma impossibilidade absoluta. Que ministros do Supremo, Advogado Geral da União e Procurador Geral da República estão, no tal artigo de nossa Constituição, indissoluvelmente juntos em casos de impeachment. Agora, segundo o ministro, só poderão ser julgados pelo Senado se um deles (o PGR) aceitar denunciar qualquer dos três. Inclusive o próprio. Não é uma interpretação séria, amigo leitor, perdão. Como ensina o Eclesiastes (1.2.), “Tudo é vaidade”. Fosse pouco, há também outros problemas.
O PODER: Ao seu ver, quais seriam esses outros problemas?
Como o espiral de um poder absoluto que passou a habitar o mais íntimo de cada um dos ministros, convertendo o Tribunal em um conglomerado formado por 11 capitanias hereditárias independentes. Que decide o que quiser, como quiser, e sem nenhum limite. Num crescendo. Virou regra. Com todos protegidos pelo corporativismo, onde nenhum ministro admite questionar decisões dos demais. Garantindo, assim, que suas próprias decisões também não o sejam. Sem contar que em vez de irem ao Supremo os mais respeitados juristas do país, o que vemos hoje é uma procissão enfadonha de advogados e amigos íntimos do presidente, integrando aquela Casa sobretudo para lhes emprestar apoio político, em evidente falta de respeito a seu passado.
O PODER: Na última semana, uma reportagem do jornal O Globo, noticiou que o escritório da mulher e filhos de Alexandre de Moraes tem um contrato com o Banco Master. O que o senhor acha sobre essa informação?
O contrato, conforme a reportagem, da jornalista Malu Gaspar, informa que que prevê “pagamento de R$ 129 milhões em três anos”. Parece que todos no Supremo acham isso natural. Ser ministro é algo bom, financeiramente, para a família (e o próprio ministro, claro). E nem apenas com ele, que muitos dos outros ministros têm também seus próprios escritórios por trás. Perdão, senhores, mas isso, em uma dimensão ética, também não está certo.
O PODER: Em sua opinião, o que poderia ser feito para superar esses problemas?
Antes de seguir no tema é preciso recusar, veementemente, proposta (que vem sendo apresentada por alguns grupos) de fechar o Supremo, recorrendo à força, o que nenhum espírito democrático pode admitir, pois nada seria pior que a volta da ditadura. A questão, então, passa a ser a de buscar uma solução adequada, madura, para o Brasil de hoje. E o curioso é que ela existe. Fazer com que o Supremo seja semelhante a todas as demais Cortes Constitucionais democráticas do mundo. Simples assim. O que nos remete somente a dois pontos que deveriam ser alterados.
O PODER: Quais seriam esses pontos?
O primeiro é que o Supremo passe a ser apenas uma Corte Constitucional. Como todos os demais tribunais similares, nos países democráticos. Julgando menos casos, somente os que interfiram na Constituição. Deixando de ser instância revisora de outros tribunais. E sem admitir mais decisões monocráticas, claro. Claro que podemos ter problemas. Com o Supremo declarando que as novas regras, definidas pelo Congresso para a Constituição, seriam inconstitucionais. E não valeriam. Não seria caso único, no mundo.
Na Índia, por exemplo, e apesar de a Constituição estabelecer que o presidente deve indicar os ministros da Corte Suprema, foi ela quem decidiu, há mais de 20 anos, que um collegium formado pelo presidente da Corte e pelos quatro ministros mais antigos é que escolheria seus novos membros. Proposta de um colegiado mais plural chegou a ser aprovada pelo Parlamento, em 2014. Mas foi derrubada, um ano depois, pelo próprio Supremo. Que a considerou “inconstitucional”. Qualquer semelhança com o Brasil não se deve ter como coincidência. Mas será que nossos ministros iriam ter coragem de nos converter em uma nova Índia?, eis a questão.
O PODER: E qual o senhor aponta como segundo ponto?
A partir de quando o Supremo for uma Corte assim, a última instância das causas infraconstitucionais passa a ser o STJ. Inclusive nos casos de Habeas Corpus. Com enormes vantagens para o funcionamento da Justiça no país. Diminuindo a duração dos processos e reduzindo uma instância, para início do cumprimento das penas. Reduzindo a impunidade que virou regra, em nosso país. E permitindo que o Supremo passe a se ocupar apenas da Constituição, função típica de uma Corte Constitucional.
O CNJ e o Supremo deveriam zelar para que a Constituição fosse respeitada. Mas, como dizia um antigo presidente da Suprema Corte dos Estados Unidos. Charles Evans Hugues, Constitution is what the judge say it is (Constituição é aquilo que o juiz diz que é).
O PODER: Em sua opinião, o que seria preciso para que tal mudança possa ser feita?
Isso requer apenas alteração da Constituição via PEC [Proposta de Emenda à Constituição]. Vontade política. E pode ser feita sem maiores problemas, ainda quando os poderosos ,ministros do Supremo não gostem e tentem trazer para seu curul (aquela poltrona em que sentam) alguns partidos políticos que se acostumaram a lhes usar nas suas demandas. Que contra egos, ou questões menores, o interesse coletivo deve prevalecer. Sempre. Em resumo, pode ser feito. E deve. Por ser o melhor, sem dúvida, para o nosso Brasil.
Mesmo em meio a crises internas, Congresso promete votar OGU até quinta-feira (18)
13/12/2025
Ao longo de uma semana tumultuada, destacada pelo anúncio de retirada, pelo governo dos EUA, das sanções referentes à Lei Magnitski impostas ao ministro Alexandre de Moraes (do Supremo Tribunal Federal) e sua esposa, da decisão do STF de perda do mandato de Carla Zambelli (PL-SP), da suspensão por seis meses do mandato do deputado Glauber Braga (PSol-SP) e tantas outras votações emblemáticas, o que mais se perguntou nos últimos dias foi: E o orçamento?
Isto porque o Congresso Nacional chega à metade do mês de dezembro sem ter aprovado o Orçamento Geral da União (OGU) com vistas a 2026. O que preocupa todo o Executivo Federal e o país como um todo.
Garantia de Alcolumbre
Por isso, em um pronunciamento que serviu muito mais como ajuste de contas em relação às cobranças diversas sobre o tema, o presidente do Senado e do Congresso Nacional, senador Davi Alcolumbre (União - AP), afirmou que a matéria deve...
Da Redação
Ao longo de uma semana tumultuada, destacada pelo anúncio de retirada, pelo governo dos EUA, das sanções referentes à Lei Magnitski impostas ao ministro Alexandre de Moraes (do Supremo Tribunal Federal) e sua esposa, da decisão do STF de perda do mandato de Carla Zambelli (PL-SP), da suspensão por seis meses do mandato do deputado Glauber Braga (PSol-SP) e tantas outras votações emblemáticas, o que mais se perguntou nos últimos dias foi: E o orçamento?
Isto porque o Congresso Nacional chega à metade do mês de dezembro sem ter aprovado o Orçamento Geral da União (OGU) com vistas a 2026. O que preocupa todo o Executivo Federal e o país como um todo.
Garantia de Alcolumbre
Por isso, em um pronunciamento que serviu muito mais como ajuste de contas em relação às cobranças diversas sobre o tema, o presidente do Senado e do Congresso Nacional, senador Davi Alcolumbre (União - AP), afirmou que a matéria deve ser votada até a próxima quinta-feira (18/12).
Muitos parlamentares acham que não haverá tempo hábil para isso, o que levará o Legislativo mais uma vez a, em meio aos embates com o Executivo Federal e o Judiciário, decretar uma espécie de “recesso branco” a partir do dia 22, permitindo aos deputados e senadores que se ausentem, mas sem que possa ser formalizado o recesso de fim de ano.
Norma constitucional
A impossibilidade se dá porque a Constituição deixa claro: O Congresso só pode parar os trabalhos do final do ano depois de votar o OGU. E antes de ir a plenário, a matéria ainda precisa passar pela Comissão Mista de Orçamento (CMO) pela última vez.
A sessão conjunta de senadores e deputados está marcada para às 9h de quinta-feira. Mas, segundo Davi, é possível que a proposta orçamentária seja votada ainda na quarta-feira (17/12). “Nós estamos organizando para quinta-feira, porque foi a data combinada com a Câmara dos Deputados, mas se conseguirmos adiantar, adiantarmos”, disse Alcolumbre aos jornalistas.
No aguardo do relatório final
A proposta orçamentária aguarda o relatório final do deputado Isnaldo Bulhões Júnior (MDB-AL). Segundo o presidente da CMO, senador Efraim Filho (União-PB), o texto deve ser publicado na segunda-feira (15/12). E a votação da matéria na comissão está prevista para o dia seguinte (16/12).
A CMO concluiu nesta semana a votação de 16 relatórios setoriais ao Orçamento. Foram estes os de: Agricultura, Desenvolvimento Agrário e Pesca; Assistência Social e Família; Cidades; Ciência & Tecnologia e Comunicações; Defesa; Educação e Cultura; Esporte; Fazenda, Planejamento, Indústria e Comércio; Infraestrutura, Minas e Energia; Integração, Desenvolvimento Regional e Meio Ambiente; Justiça e Segurança Pública; Mulheres e Direitos Humanos; Poderes de Estado e representações e Saúde.
Resta saber se vão resumir a briga que sempre acontece durante a votação do orçamento por acréscimos e retiradas de emendas para várias obras entre os parlamentares e bancadas dos estados e do Distrito Federal desta vez, em meio a um prazo tão exíguo.
TSE: partidos podem se desligar de federações até início do ano eleitoral de 2026
13/12/2025
Os cidadãos interessados a serem candidatos nas eleições de 2026 já tinham uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre as confederações, mas como isso ainda vinha suscitando dúvidas em toda a Justiça eleitoral, agora podem ficar satisfeitos. É que, independentemente do prazo para punições aos partidos que trocarem de federações partidárias, todos, sem exceção, poderão fazer suas trocas até o início do ano eleitoral de 2026.
A medida consiste numa regra de transição permitida pelo STF no início do ano e que foi reiterada essa semana pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O entendimento dos ministros do STF foi de que, como a lei estabelece um período de quatro anos para trocas de partidos entre a formalização das federações, os políticos ficariam prejudicados nas eleições de 2026, uma vez que a legislação ainda não fez quatro anos. Enquanto nos pleitos de 2028 e 2030, não haverá mais essa preocupação.
Hylda Cavalcanti/ Por HJur
Os cidadãos interessados a serem candidatos nas eleições de 2026 já tinham uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre as confederações, mas como isso ainda vinha suscitando dúvidas em toda a Justiça eleitoral, agora podem ficar satisfeitos. É que, independentemente do prazo para punições aos partidos que trocarem de federações partidárias, todos, sem exceção, poderão fazer suas trocas até o início do ano eleitoral de 2026.
A medida consiste numa regra de transição permitida pelo STF no início do ano e que foi reiterada essa semana pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O entendimento dos ministros do STF foi de que, como a lei estabelece um período de quatro anos para trocas de partidos entre a formalização das federações, os políticos ficariam prejudicados nas eleições de 2026, uma vez que a legislação ainda não fez quatro anos. Enquanto nos pleitos de 2028 e 2030, não haverá mais essa preocupação.
Multas e penalidades
Caso não tivesse sido aprovada essa regra de transição, o partido que resolvesse trocar de federação poderia ser submetido a multas e outras penalidades pela Justiça eleitoral. O Supremo é a Corte máxima do país, mesmo assim, os tribunais regionais eleitorais vinham recebendo uma enxurrada de pedidos de consulta sobre como ficaria a situação das federações no próximo ano.
Por isso, durante sessão realizada na noite da última quarta-feira (10/12), os ministros do TSE não aceitaram um pedido de consulta sobre o tema ajuizado à Corte superior pelo partido Cidadania e reiteraram, oficialmente, a posição do STF.
Tema superado
Para o relator da consulta, ministro Antonio Carlos Ferreira, a questão já foi analisada e decidida pelo STF no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) relatada pelo ministro Luís Roberto Barroso, em agosto de 2025. Na ocasião, o STF declarou constitucional a lei que criou as federações partidárias, exceto quanto ao prazo de registro, que deve ser o mesmo exigido para a criação de partidos políticos.
O Supremo definiu, porém, que nas Eleições Gerais de 2026, os partidos que formaram federações em 2022 podem alterar sua composição ou constituir nova federação antes de completar quatro anos, sem aplicação das penalidades previstas na legislação, de modo a permitir que essas agremiações cumpram o prazo legal de registro de federações no ano eleitoral de 2026.
Políticos repercutem decisão do STF que reverteu votos da Câmara e determinou cassação de Zambelli
13/12/2025
O sábado (13/12) está sendo de repercussões por parte de parlamentares de oposição ao Governo e aliados de Carla Zambelli (PL-SP), em função da decisão formalizada pelo plenário virtual do Supremo Tribunal Federal (STF) de decretar a perda imediata do mandato dela, até então deputada federal. Zambelli foi condenada por dois crimes em julho passado pelo STF e está presa na Itália, para onde fugiu. O Tribunal determinou que a Câmara dos Deputados dê posse ao seu suplente em, no máximo, 48 horas.
Com o julgamento, o STF desfez deliberação da Câmara, que na última quarta-feira (10/10) manteve o cargo da parlamentar. Zambelli foi condenada por unanimidade pela 1ª Turma do STF pelos crimes de invasão de dispositivo informático e falsidade ideológica, no ataque hacker aos sistemas do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Os integrantes do colegiado definiram 10 anos de prisão para a parlamentar, além da cassação, inelegibilidade e pagamento de m...
Da Redação
O sábado (13/12) está sendo de repercussões por parte de parlamentares de oposição ao Governo e aliados de Carla Zambelli (PL-SP), em função da decisão formalizada pelo plenário virtual do Supremo Tribunal Federal (STF) de decretar a perda imediata do mandato dela, até então deputada federal. Zambelli foi condenada por dois crimes em julho passado pelo STF e está presa na Itália, para onde fugiu. O Tribunal determinou que a Câmara dos Deputados dê posse ao seu suplente em, no máximo, 48 horas.
Com o julgamento, o STF desfez deliberação da Câmara, que na última quarta-feira (10/10) manteve o cargo da parlamentar. Zambelli foi condenada por unanimidade pela 1ª Turma do STF pelos crimes de invasão de dispositivo informático e falsidade ideológica, no ataque hacker aos sistemas do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Os integrantes do colegiado definiram 10 anos de prisão para a parlamentar, além da cassação, inelegibilidade e pagamento de multa.
“Desrespeitou princípios”
No voto, Moraes reiterou que a deliberação da Câmara “desrespeitou os princípios da legalidade, da moralidade e da impessoalidade”. O ministro Flávio Dino, por sua vez, destacou que, segundo dados oficiais do Legislativo, desde quando a condenação se tornou definitiva, foram gastos R$ 547 mil em recursos públicos para manter o gabinete da deputada, mesmo com sua completa inatividade funcional e constando como foragida.
O líder do PL na Câmara, deputado Sóstenes Cavalcante (RJ), criticou a decisão e disse que o STF “avançou sobre as competências do Poder Legislativo”. O parlamentar afirmou que o Supremo “voltou a rasgar a Constituição” ao anular a sessão da Câmara que rejeitou a cassação do mandato de Zambelli por não alcançar o número mínimo de votos exigido. E que, ao seu ver, a decisão “compromete a soberania da Casa e o resultado das urnas”.
“Voltou a rasgar a Constituição”
“O STF endossou a canetada de Alexandre de Moraes (ministro da Corte) e voltou a rasgar a Constituição. Não houve independência entre ministros. Houve alinhamento para confirmar uma decisão que atropela a soberania da Câmara, o voto popular e o Estado de Direito”, frisou o parlamentar.
Cavalcanti ainda cobrou do presidente da Casa, deputado Hugo Motta (Republicanos-PB), que não aceite o que ele classificou como “avanço do Judiciário sobre o Legislativo”. Até o fechamento desta edição, Motta não se pronunciou a respeito nem da fala do deputado e nem sobre a decisão do Tribunal.
Julgamento na Itália
Na próxima quinta-feira (18/12), está marcado pela Justiça italiana o julgamento do pedido da defesa de Zambelli para incluir no processo de extradição dela, apresentado pelo Brasil ao governo italiano, novas provas.
Dependendo do resultado do julgamento, a Corte de Roma pode decidir no mesmo dia sobre o processo de extradição. Mesmo assim, caso decida pela extradição, conforme as regras, depois de ser aprovada pela Justiça daquele país (se for o caso), a decisão ainda terá de ser chancelada pelo governo da Itália.
— Com Agências de Notícias
Surpresa pela direita - Ratinho tem contra Lula o mesmo desempenho de Tarcísio
13/12/2025
A revelação foi feita pelo sociólogo Antônio Lavareda, do institudo Ipespe, analisando na CNN os mais recentes dados das pesquisas de opinião, particularmente o Datafolha, divulgado esta semana. Flávio Bolsonaro apresenta um desempenho um pouco abaixo, 37%, mas não pode ser liminarmente descartado. Pode ter jogo para ele, aguardemos pesquisas que alcancem as repercussões do seu anúncio de pré-candidatura. Vamos, por agora, comparar as posições de Tarcísio e Ratinho.
Por que nossa surpresa?
Ratinho, é verdade, foi reeleito, está no se...
A pouco menos de um ano para as eleições gerais de 2025, o governador do Paraná, Ratinho Júnior (PSD), apresenta um surpreendente desempenho em cenário de segundo turno contra o atual presidente Lula. Tarcísio de Freitas (Republicanos), governador de São Paulo, alcançaria hoje 42%. Ratinho Junior (PSD) chegaria a 41%. Nas duas comparações, o atual presidente fica com o mesmo índice: 47%.
A revelação foi feita pelo sociólogo Antônio Lavareda, do institudo Ipespe, analisando na CNN os mais recentes dados das pesquisas de opinião, particularmente o Datafolha, divulgado esta semana. Flávio Bolsonaro apresenta um desempenho um pouco abaixo, 37%, mas não pode ser liminarmente descartado. Pode ter jogo para ele, aguardemos pesquisas que alcancem as repercussões do seu anúncio de pré-candidatura. Vamos, por agora, comparar as posições de Tarcísio e Ratinho.

Por que nossa surpresa?
Ratinho, é verdade, foi reeleito, está no segundo governo e faz uma gestão muito bem aprovada. Porém, ainda é pouco conhecido pelo eleitorado nacional, especialmente nas regiões Norte, Nordeste e Centro Oeste. Ou seja, tem muito espaço para crescer. Considere-se que o Paraná é um Estado com muito menos visibilidade nacional do que São Paulo. E só há pouco tempo Ratinho começou a ser percebido como candidato pelo restante do país. Tarcísio é citado como potencial presidenciável desde que foi eleito. E São Paulo é São Paulo.

Potencial
O filho do comunicador Ratinho também é bom no ramo e, ao mesmo tempo, craque na política. Está solidamente ancorado no PSD, o partido de Kassab. Legenda por legenda, o paranaense leva vantagem.

Kassab empoderado
O futuro é uma bola de cristal opaca. Mas, a simples constatação do desempenho de Ratinho triplica o cacife de Gilberto Kassab, o cacique do PSD, no tabuleiro da sucessão. A pelota das forças do centrão e da direita chegou naturalmente aos seu pés, na grande área adversária. A bola procura os craques, como se falava antigamente na linguagem do futebol.

Desdobramentos
As possibilidades são diversas, com repercussões tanto no jogo nacional como nos estaduais. O PSD, protagonista, não tem por que fazer alianças ou abrir mão do seu candidato. Verdade que Kassab anunciou esta semana que seu candidato será Tarcísio. Isso, se ele se licenciar em abril e estiver na urna em agosto. Caso contrário, a reciprocidade é provável. Desenho de um possível fato novo no cenário da disputa. E tudo o que os favoritos mais temem em eleição é o tal do fato novo.
(José Nivaldo Junior e equipe O Poder)
Margarida Cantarelli e Maria Lectícia vão comandar APL
13/12/2025
Breve histórico
A Academia Pernambucana de Letras foi fundada em 26 de janeiro de 1901, por Carneiro Vilela e mais 19 escritores pernambucanos, com a missão de “promover a defesa dos valores culturais do Estado, especialmente no campo da criação literária”. Foi a terceira academia de letras do Brasil, sendo precedida apenas pela Academia Cearense de Letras e pela Academia Brasileira de Letras.
Perfil
A Academia Pernambucana de Letras destaca-se no cenário local e nacional pela produção literária de seus acadêmicos, pela contribuição ao desenvolvimento da cultura literária, pelo estudo da língua portuguesa e...
Uma dupla de ouro. As acadêmicas Margarida Cantarelli e Maria Lectícia Monteiro Cavalcanti serão eleitas, na próxima segunda-feira (15/12), presidente e vice, respectivamente, da Academia Pernambucana de Letras - APL. Margarida já ocupou o cargo com brilho por dois mandatos.

Breve histórico
A Academia Pernambucana de Letras foi fundada em 26 de janeiro de 1901, por Carneiro Vilela e mais 19 escritores pernambucanos, com a missão de “promover a defesa dos valores culturais do Estado, especialmente no campo da criação literária”. Foi a terceira academia de letras do Brasil, sendo precedida apenas pela Academia Cearense de Letras e pela Academia Brasileira de Letras.

Perfil
A Academia Pernambucana de Letras destaca-se no cenário local e nacional pela produção literária de seus acadêmicos, pela contribuição ao desenvolvimento da cultura literária, pelo estudo da língua portuguesa e por zelar e divulgar o patrimônio literário do Estado, dentro e fora dele.

Atividades
Tais resultados são alcançados através da realização, individual ou colaborativamente, de seminários, colóquios, festivais e feiras literárias, prêmios literários, lançamento de livros, cursos, rodas de leitura, edição de livros e revistas, recitais de música, saraus, entre outras ações.

Confira
Agora, a chapa completa que formará a nova diretoria.
CHAPA JANEIRO 2026/2028
Presidente: MARGARIDA DE OLIVEIRA CANTARELLI
1ª Vice-presidente: MARIA LECTICIA MONTEIRO CAVALCANTI
2º Vice-presidente: JOSÉ MÁRIO RODRIGUES
SECRETÁRIO-GERAL: LOURIVAL HOLANDA BARROS
1º Secretário: GEORGE FELIX CABRAL DE SOUSA
2º Secretário: JOSE ANGELO CASTELO BRANCO
Tesoureira: ANNA MARIA VENTURA DE LYRA E CESAR
Comissão de Contas:
ALVACIR RAPOSO
JOSE NIVALDO JÚNIOR
CICERO BELMAR
Suplente da Comissão de Contas:
ROBERTO JOSE MARQUES PEREIRA
Diretora da Biblioteca: FLÁVIA SUASSUNA
Diretor do Arquivo: SILVIO NEVES BAPTISTA
Diretor de Publicações: FÁBIO LUCAS DE BARROS E SILVA
Diretor da Memória: LUZILA GONÇALVES FERREIRA
Diretor de Eventos Culturais: CICERO BELMAR
SP sofre consequências de ciclone, com cerca de 2,5 milhões de pessoas ainda sem energia
13/12/2025
São Paulo — maior cidade do Brasil e da América Latina, além de ser considerada uma das maiores metrópoles do mundo—, segue neste sábado (13/12) o seu quarto dia sem luz em mais de 500 mil imóveis. Considerando-se a média feita pelos institutos sociais de cinco pessoas morando, em média, em cada residência, isso representa aproximadamente 2,5 milhões de pessoas sem acesso à rede elétrica e nem à internet.
Os dados da defesa civil, entretanto, são desencontrados em relação aos anunciados pela Enel — concessionária de energia elétrica que opera na cidade. A companhia aponta que ficaram sem luz 2,2 milhões de clientes (residências) no primeiro dia e que já foi restabelecida a situação de 1,8 milhões de residências.
Ciclone extratropical
O caos começou na quarta-feira (10/12), quando a passagem de um ciclone extratropical pela cidade provocou ventos fortes, queda de árvores e danos à red...
Da Redação
São Paulo — maior cidade do Brasil e da América Latina, além de ser considerada uma das maiores metrópoles do mundo—, segue neste sábado (13/12) o seu quarto dia sem luz em mais de 500 mil imóveis. Considerando-se a média feita pelos institutos sociais de cinco pessoas morando, em média, em cada residência, isso representa aproximadamente 2,5 milhões de pessoas sem acesso à rede elétrica e nem à internet.
Os dados da defesa civil, entretanto, são desencontrados em relação aos anunciados pela Enel — concessionária de energia elétrica que opera na cidade. A companhia aponta que ficaram sem luz 2,2 milhões de clientes (residências) no primeiro dia e que já foi restabelecida a situação de 1,8 milhões de residências.

Ciclone extratropical
O caos começou na quarta-feira (10/12), quando a passagem de um ciclone extratropical pela cidade provocou ventos fortes, queda de árvores e danos à rede elétrica. Na noite desse primeiro dia, cerca de 200 milhões de imóveis ficaram sem energia, número que já baixou drasticamente de quinta-feira e ontem, mas que continua grandioso neste sábado.
E que, mais que nunca, aponta o quanto as mudanças climáticas atrasam o desenvolvimento e a vida das pessoas, quando não colocam em risco a própria sobrevivência da população.
Na noite de ontem, a Justiça de São Paulo acolheu pedido feito pelo Ministério Público para que a Enel restabeleça a energia nestes locais. Até as 11h deste sábado, eram, no total, 567.605 as residências ainda afetadas.

Mais complexo, em alguns locais
Por meio de uma nota pública, a companhia informou que, em certas localidades, o restabelecimento é mais complexo por envolver a reconstrução da rede, substituição de postes, transformadores e, em alguns casos, a recondução de cabos quilométricos. A determinação judicial foi de que se a eletricidade não for retomada o mais rápido possível, serão aplicadas multas e outras penalidades à Enel por não ter mantido uma boa infraestrutura para operacionalização da rede por ela coberta.
“Mesmo com a mobilização tardia de equipes, a empresa não forneceu previsão clara e precisa de restabelecimento, ampliando a vulnerabilidade de idosos, crianças, pessoas com deficiência e eletrodependentes, além de paralisar unidades de saúde e atividades econômicas”, ressaltou a decisão judicial.

Quedas de árvores, postes e desabamentos
Conforme dados do Corpo de Bombeiros de São Paulo, foram atendidos na quarta-feira, 1.642 chamados para quedas de árvores, 26 para desabamentos e cinco para enchentes. Nos dias seguintes, mesmo em menor quantidade, os chamados prosseguiram para quedas de árvores e socorro a desabamentos de casas e estabelecimentos comerciais.
O ciclone extratropical que provocou chuvas e ventanias em São Paulo também atingiu municípios da Região Metropolitana de SP, atingidos por fortes ventos de até 100km/h em alguns pontos.

— Com Agências de Notícias
O populismo exótico de Jânio, por Natanael Sarmento*
13/12/2025
Marketing
Supostamente antissitêmica a liderança busca se “conectar” diretamente com as massas populares. Sua retórica vende ilusões e promessas “salvacionistas”. Produzem epifanias milagrosas para trair multidões de seguidores, num misticismo político beatífico.
Para o povo e sem ele
Produto de determinações históricas, o populismo tem função sistêmicas materiais e ideológicas e bases de sustentação. Não organiza ou eleva a cidadania, não busca governar com o povo.
Terreno fértil
O populismo se desenvolve com mais desenvoltura nas sociedades inorgânicas, desorganizadas, de tessitura “gelatinosa”. Nas populações difusas e carentes, com demandas reprimidas, desejosas de mudanças nas quais os acenos de esperança do líder corres...
No populismo destaca-se a figura do “líder carismático”. O líder apresenta-se acima de instituições e interesses classistas e do sistema vigente.
Marketing
Supostamente antissitêmica a liderança busca se “conectar” diretamente com as massas populares. Sua retórica vende ilusões e promessas “salvacionistas”. Produzem epifanias milagrosas para trair multidões de seguidores, num misticismo político beatífico.
Para o povo e sem ele
Produto de determinações históricas, o populismo tem função sistêmicas materiais e ideológicas e bases de sustentação. Não organiza ou eleva a cidadania, não busca governar com o povo.
Terreno fértil
O populismo se desenvolve com mais desenvoltura nas sociedades inorgânicas, desorganizadas, de tessitura “gelatinosa”. Nas populações difusas e carentes, com demandas reprimidas, desejosas de mudanças nas quais os acenos de esperança do líder correspondem aos anseios das legiões de seguidores. É aparentemente “antissistêmico”, mas reproduz o sistema dominante.

Jânio
O populismo janista teve o traço do exotismo do líder. Jânio caminhava como “homem do povo”, cabelos desgrenhados, bolachas no bolso, vestimenta descuidada. Consta que até as caspas faziam parte da personagem. O professor de gramática abusava das figuras de linguagem, nas ênclises e mesóclises dos “fi-lo” e dos “dar-vos-ei” ...
Vassourada
Na conjuntura dos anos 1960, permeada pelos escândalos de corrupção do governo, o oposicionista usou a vassoura símbolo da campanha eleitoral “para varrer a corrupção” de forte apelo moralista. Foi o grande mote da campanha.
A disputa
Na corrida presidencial concorriam três andores. O da coligação situacionista formado pela PSD-PTB e outros com o Marechal Teixeira Lott. A oposição PTN/UDN/PR/PL de Jânio e Adhemar de Barros pelo Partido Social Progressista.

Voz das urnas
Jânio arrasou como fenômeno eleitoral obtendo 48,26 dos votos. Com mais de 2 milhões de votos de vantagem sobre o segundo. Lott obteve 32,3%.
Meteórico
A passagem de Jânio na presidência foi meteórica. Assumiu em janeiro de 1961, renunciou em agosto do mesmo ano.
Marcas
Apesar de breve, a governança janista deixava sua marca. Resumidamente, ambiguidades, surpresas e banalidades.

Banalidades
O presidente normatizou a transmissão de ordens através de bilhetinhos. Ocupou-se de trivialidades quais uso de biquínis, brigas-de-galo, proibição da lança-perfume, etc.
Falando sério
Nas questões sérias envolvendo a política externa Jânio surpreendeu russos e americanos. Evidente que não foi a força do minúsculo PST a base que garantiu a vitória janista. A principal força da coligação era a UDN, partido historicamente alinhado aos interesses dos Eua.
No entanto
Para surpresa geral Jânio adotava política independente e nisso contrariava os EUA e os seus apoiadores udenistas. Manifestou-se contra o bloqueio econômico dos Eua à Cuba. Desejo de reatar relações diplomáticas com a URSS interrompidas no governo Dutra por determinação dos EUA. Condecorou heróis comunistas, o cosmonauta russo Yuri Gagárin e o Comandante Ernesto Che Guevara.
O Corvo pula o umbral
O assaz golpista da UDN Carlos Lacerda, o Corvo, salta do umbral palaciano, rompe com Jânio e publica matéria denunciando suposta trama do presidente para fechar o Congresso Nacional.

Blefe?
Jânio Quadros apresentou a sua renúncia em 25 de agosto de 1961. Para alguns, uma jogada política, blefe no qual apostava todas as fichas dos capital de 5 milhões de votos para obter poderes amplos de cônsul romano. Jogada, ou não, Jânio perdeu o cargo de Presidente. O golpe de 64 cassa os seus direitos políticos e fica fora da ribalta.
O retorno
Com a redemocratização, em 1985, Jânio volta à ribalta na disputadíssima eleição para Prefeito de São Paulo. Os institutos de pesquisas davam como certa a vitória de Fernando Henrique do PSDB. No segundo lugar ficava Eduardo Suplicy do PT. Jânio figurava em terceiro. Os jornais publicaram foto de FHC sentado na cadeira de Prefeito, antes do pleito, mas ele perdeu.
Urnas
Na única pesquisa válida do voto popular, a da urna, Jânio ultrapassou todos os concorrentes favoritos e venceu.
O troco janista foi bizarro. No primeiro dia de trabalho como prefeito eleito da capital posa para foto borrifando a cadeira com desinfetante. Questionado, respondeu: “Desinfeto porque nádegas indevidas a sentaram!” O exótico populista morreu em 1992, na cidade de São Paulo, aos 75 anos. Sem mais nádegas a declarar.
*Natanael Sarmento é professor e escritor. Do Diretório Nacional do Partido Unidade Popular Pelo Socialismo – UP/80.


