
É Findi - São João Na Fogueira, por Romero Falcão*
20/06/2025 -
"Espetáculo" Contrafeito
Quem não tem saudade do futebol arte? Era difícil perder um passe. Na chuteira de Sócrates uma calculadora - com direito à precisão do calcanhar. Os lançamentos à longa distancia de Rivelino, a bola viajava no tempo certo, caía pronta pra finalização. O domínio de Zico, a beleza elegante de Falcão. Não retrocederei até Pelé, por compaixão. Hoje, a invenção dos ingleses virou correria, bordoada. Jogo feio, previsível, tedioso. Não, não, não aguento, me falta paciência pra assistir à partida, por mais que o locutor se esforce, narre um "espetáculo" contrafeito.

Imprestável para Reciclagem
Na música o andor é o mesmo. Letra chinfrim, dois neurônios, três acordes fazem baita sucesso, lotam casas de show, arrebanham milhões de seguidores nas redes sociais. De repente o ilustre desconhecido torna-se celebridade, rimando feijão com macarrão. Uns dirão que estou velho, engrossando o coro: "na minha época era melhor, hoje é um lixo". Sim, estou velho, mas não burro. Noventa por cento da rainha das artes - a música - produzida atualmente, é puro lixo, imprestável para reciclagem.
Pilares Fundamentais
Assim como no futebol, na música, no carnaval, o São João arde na fogueira, se debate, implora pra sanfona um remoto alavantú, anarriê. Todos os anos é mesma cantilena, sanfoneiros, estrelas da MPB, reunidos, clamando, não deixem morrer Luiz Gonzaga. Não permitam que invadam o nosso sertão com ritmos completamente fora do contexto da festa junina. Mas a grana é poderosa, acaba com romantismo, tudo vira empresa, negócio, orçamento, meta. O futebol não escapou. O santo João já não faz milagre. Cá com os meus sofríveis botões: as gerações atuais perderam referências, régua e compasso. Tudo é permitido, inclusive a mistura de ritmos, não importa o conceito, a cultura da região, as raízes da celebração, tradição, a essência das gerações anteriores. Parece que a diversidade, o multicultural, de certa forma, errou na mão, jogou tinta demasiada no quadro, tornando a tela confusa. Não é questão de viver no passado, e sim conservar pilares fundamentais que ergueram a estrutura.
Afinal, não se despreza o avô porque o neto nasceu. Sei que haverá alegações, tudo muda, é o fluxo da modernidade. Então parafraseio o príncipe, Paulinho da Viola: tá legal, eu aceito o argumento, mas não altere o São João tanto assim, sei que a moçada não tá nem aí. Todavia, a velha guarda está sentindo a falta de um triângulo, zabumba, sanfona, dignidade para o artista criador do festejo.
*Romero Falcão, é um cronista que se arrisca a fazer poema torto, autor do livro: Asas das Horas, com prefácio do Prof. José Nivaldo.
