imagem noticia

Ensaio - A carta de Trump, o espantalho e o câncer: quem realmente sabota o Brasil?

16/07/2025 -

imagem noticia
Por Jorge Henrique de Freitas Pinho *

1. Preâmbulo — Da carta ao castigo: quem acorda um governo em coma?

Aprendi muito cedo, em minha experiência com quatro governos e mais de três décadas de vida pública, que na política as pessoas não batem nos adversários para que eles se afastem — batem para que eles se aproximem.

Essa máxima, que parece cínica à primeira vista, é na verdade uma das chaves mais realistas para entender a lógica do poder.

É essa máxima, portanto, que me ajuda a interpretar a carta enviada por Donald Trump ao presidente Lula e ao empresariado brasileiro, lida por Eduardo Bolsonaro.

Ao contrário do que alardeou a imprensa militante, a carta não foi um ataque ao Brasil — mas um ultimato ao governo que insiste em se afastar da realidade geopolítica que sustenta o país.

A sequência dos fatos é clara. Lula foi eleito em 2022 num clima de revanche simbólica, institucional e diplomática.

Desde então, acumulou uma série de gestos hostis em relação aos Estados Unidos: comparou uma possível volta de Trump ao “nazismo americano”, endossou propostas para substituir o dólar nas transações do BRICS e debochou reiteradamente da tradição ocidental, conservadora e liberal, que deu ao Brasil suas maiores oportunidades de desenvolvimento.

Internamente, Lula sustentou-se numa retórica polarizadora e numa aliança com o Judiciário que vem, há anos, desfigurando as bases da liberdade de expressão e do devido processo legal no país.

O ministro Alexandre de Moraes, seu principal escudeiro institucional, chegou a afirmar — com ares de arrogância teatral — que “só se preocuparia com um porta-aviões americano no Lago Paranoá”, como se a soberania nacional pudesse ser garantida por frases de efeito ou blindada contra a lógica do mundo. Mas a realidade não costuma se curvar ao discurso.

Trump, mesmo diante dessas provocações, manteve até meados de 2025 uma postura surpreendentemente pragmática.

Aplicara ao Brasil apenas a tarifa-base de 10%, inserida no pacote geral da política “Liberation Day Tariffs” contra diversos países, num gesto que não distinguia o Brasil como alvo específico.

Paradoxalmente, essa mesma política beneficiou o agronegócio brasileiro ao restringir exportações chinesas e ampliar a demanda externa por commodities brasileiras como a soja.

Durante esse período, portanto, não houve retaliação direta. Se havia desconforto, ele ainda não se traduzia em ação concreta.

Mas Lula insistiu em empurrar o país para o abismo estratégico. Na recente cúpula dos BRICS realizada no Brasil, decidiu transformar o encontro num palanque ideológico antinorte-americano, assumindo o papel subalterno de boneco de ventríloquo de Xi Jinping e de Putin.

Assim, os verdadeiros líderes da China e da Rússia sequer compareceram, deixando para o Brasil a tarefa de sustentar o discurso que nem eles mesmos ousaram defender presencialmente.

Foi ali, no teatro da submissão diplomática, que Lula cavou a fenda que separa soberania de servidão.

O resultado foi previsível. Trump resolveu cumprir as advertências que já havia feito ao bloco dos BRICS nos primeiros meses de seu novo mandato.

E, para esse fim, Trump escolheu o elo mais frágil para servir de exemplo: o país governado por quem decidiu afrontar abertamente os fundamentos da ordem ocidental.

O Brasil, governado por um palanque ambulante e por ministros descolados da realidade, tornou-se o laboratório da reação americana.

A carta de Trump é o segundo estágio dessa reação.

O primeiro foi verbal — nos discursos em que alertou contra a conivência com regimes autocráticos.

O segundo, agora formal, consiste numa carta que conjuga convite e ameaça: convida os empresários brasileiros a buscarem segurança jurídica e liberdade econômica nos Estados Unidos, ao mesmo tempo em que sinaliza que a paciência americana tem limite.

O terceiro estágio, já anunciado, será a aplicação de tarifas de até 50% sobre produtos brasileiros a partir de agosto — caso o Brasil siga fazendo ouvidos moucos aos avisos.

Quarto estágio: caso o Brasil reaja com tarifas próprias, Trump prometeu que os EUA refletirão esse percentual sobre os 50% já anunciados. Por exemplo: se o governo brasileiro retaliar com 20%, a tarifa americana subirá para 70%.

Trata-se de um mecanismo de retaliação escalonada, explicitamente projetado para inibir reações emocionais, forçar correções imediatas e demonstrar que qualquer resposta agressiva será punida com velocidade e parcimônia calculada .

Ou seja: o prejuízo ainda não se concretizou — mas está claramente anunciado. E não se trata de um castigo inevitável, mas de uma resposta condicional.

Se houver dano, este decorrerá menos de uma hostilidade americana e mais da teimosia do atual presidente brasileiro em manter-se surdo aos sinais do mundo real.

A resposta americana, nesse sentido, opera em três níveis: é econômica, ao impor custos concretos; é geopolítica, ao punir o realinhamento com regimes que atentam contra a ordem liberal; e é simbólica, ao demonstrar que o Brasil já não é tratado como uma democracia confiável, mas como um satélite em processo de desintegração estratégica.

A carta também expressa, com todas as letras, o repúdio de Trump àquilo que considera uma “caça às bruxas” contra Jair Bolsonaro e uma afronta à soberania digital dos Estados Unidos, representada pelas ordens de censura emitidas pelo STF contra plataformas americanas em solo americano.

Não se trata apenas de uma disputa retórica ou de uma divergência diplomática. O que está em jogo é o princípio fundamental da Primeira Emenda da Constituição americana, que garante, em termos absolutos, a liberdade de expressão no território dos EUA.

Ao tentar obrigar empresas sediadas nos Estados Unidos a suprimirem conteúdos conforme critérios políticos internos do Brasil — e muitas vezes com base em decisões sigilosas, sem contraditório ou fundamentação pública — o STF ultrapassa os limites da jurisdição nacional e colide diretamente com a ordem constitucional americana.

Esse tipo de extravasamento judicial não é lido lá fora como defesa da democracia — mas como ativismo autoritário disfarçado de zelo institucional.

O nome técnico, no mundo anglo-saxão, é "judicial overreach", que significa “excesso de atuação judicial” — quando o Judiciário ultrapassa seus limites constitucionais. E a reação de Trump não é apenas um gesto de lealdade pessoal.

É, acima de tudo, um ato soberano de contenção simbólica. Uma mensagem clara de que a liberdade de expressão nos Estados Unidos não será limitada por tribunais estrangeiros, ainda que sob a máscara de preocupações com o “ambiente democrático”.

Mais do que um ataque, a carta representa um contra-ataque civilizacional. Ela demarca a fronteira entre dois projetos antagônicos: de um lado, a expansão silenciosa de um sistema de controle global por meio da linguagem; de outro, a memória de uma tradição política que, com todas as suas contradições, ainda reconhece que a censura, uma vez instaurada, nunca se detém nos limites inicialmente prometidos.

Não é preciso recorrer a teorias conspiratórias para perceber isso: basta lembrar que, à época das eleições presidenciais de 2022, a Ministra Cármen Lúcia — numa entrevista amplamente divulgada — defendeu medidas excepcionais de controle da informação, sugerindo que tais restrições seriam provisórias, “apenas até o fim do pleito”.

Ocorre que Lula venceu — e a censura institucionalizada não apenas permaneceu como se intensificou, tornando-se política de Estado legitimada por decisões judiciais secretas.

A lição é simples e antiga: quando o poder se dá o direito de calar, jamais devolve espontaneamente a palavra ao povo.

Portanto, trata-se, na verdade, de uma denúncia que vai além do Brasil: envolve princípios universais de liberdade, segurança jurídica e confiança internacional.

A esquerda se recusa a admitir o óbvio: os Estados Unidos não estão retaliando o Brasil — estão tentando acordá-lo.

A reação histérica à carta foi mais reveladora do que a própria carta. Quando um corpo está em coma, qualquer tapa soa como violência. Mas, em certas circunstâncias, o tapa é a última chance de evitar a morte cerebral.

Se o Brasil quiser sobreviver ao câncer político que o consome, precisará ativar seu sistema imunológico antes que o colapso se torne irreversível.

Essa carta é, ao mesmo tempo, o diagnóstico e o primeiro sinal da quimioterapia. E, como toda quimioterapia, ela dói. Mas, ao contrário do câncer — ela pode salvar.





2. O fato: a carta e o convite ao discernimento

Eduardo Bolsonaro leu, em vídeo público, uma carta enviada pelo atual presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Nela, criticam-se as escolhas do governo brasileiro no campo geopolítico e alerta-se sobre os riscos econômicos que tais posturas podem acarretar. Mas o núcleo da mensagem foi outro: um convite explícito ao empresariado nacional para que avalie a migração de seus investimentos ao solo americano — um ambiente mais estável, previsível e respeitoso com o capital produtivo.

O gesto, ainda que carregado de simbolismo estratégico, foi apresentado por setores da esquerda como uma afronta à soberania nacional. Reagiram com gritos de traição, denúncias de sabotagem e acusações de complô internacional. Mas nenhuma dessas reações resiste ao crivo da razão.

Trata-se, claramente, de uma inversão projetada: uma tentativa de transformar o alerta em agressão, o diagnóstico em crime, a crítica externa em conspiração.

Como dizia Cícero, “quando se quer esconder a verdade, começa-se por acusar o mensageiro”. E foi exatamente isso que fizeram com Eduardo Bolsonaro — confundiram o portador com o autor da mensagem.

Mas a carta não foi um ato bélico. Foi um ultimato diplomático, redigido com o bisturi de quem entende que às vezes é preciso doer para curar.

Se o Brasil não estivesse brincando de potência antiocidental, o convite americano soaria como uma parceria estratégica.

O que gera incômodo não é o gesto dos EUA, mas o espelho que ele oferece: um reflexo incômodo da nossa própria decadência institucional.

Transformar Trump em vilão e Eduardo em laranja do império é não apenas desonesto — é estrategicamente burro.

A mensagem veio de fora, mas não por acaso: veio porque por dentro o país padece de um mal maior.

Como diria Pascal, “a infelicidade dos homens nasce de não saberem ficar quietos em seu quarto”. O problema está no quarto — e não na janela que se abre para fora.

No fundo, não se trata de uma carta. Trata-se de um teste de lucidez. A esquerda, ao reagir com fúria, revelou o quanto teme a verdade: teme que o povo perceba que a crise que nos atinge não vem de Washington, mas de Brasília; não nasce do mercado, mas da ideologia; e não é causada por cartas — mas por cartas marcadas.

3. As Falácias da Indignação Fabricada

3.1. A falácia do espantalho: quando se combate o que nunca foi dito

A primeira e mais difundida distorção foi a que atribuiu a Eduardo Bolsonaro a absurda ideia de que o empresariado brasileiro deveria “levar usinas nas malas”. Ele jamais disse isso. A frase sequer existiu — e, no entanto, ganhou vida própria, circulando em memes, manchetes e comentários como se fosse literal.

Essa técnica — antiga, mas eficaz entre os desavisados — chama-se falácia do espantalho.

Consiste em caricaturar o argumento do oponente, empalhá-lo grotescamente, e depois exibir sua queima simbólica como se fosse uma vitória racional. É o triunfo da retórica sobre a honestidade intelectual.

Como ensinava Aristóteles na Retórica, o debate legítimo exige que se combata o argumento em sua forma mais forte — e não em sua versão mais frágil.

Fazer o contrário é fugir do real embate de ideias e buscar apenas a humilhação teatral do adversário.

Nesse caso, o que Eduardo fez foi ler, de forma direta e transparente, uma carta de Trump com apelo ao empresariado.

Em momento algum sugeriu que fábricas inteiras fossem desmontadas e levadas como bagagem de mão.

O convite era claro: avaliar, racionalmente, ambientes mais seguros de operação para investimentos produtivos — algo que empresários fazem todos os dias, em todos os países.

Mas a militância optou pelo delírio. E ao transformar um gesto de lucidez estratégica numa pantomima de traição, revelou mais sobre sua própria fragilidade do que sobre qualquer suposta deslealdade.

Como já advertia Confúcio, “quando o discurso se afasta da verdade, o ridículo se disfarça de virtude”.

3.2. A falsa dicotomia: entre crítica legítima e patriotismo fabricado

A segunda distorção consistiu em afirmar — ou, mais comumente, insinuar — que criticar o governo Lula seria o mesmo que atacar o Brasil.
Esse raciocínio, além de intelectualmente desonesto, é politicamente infantil.

Transformar o governo em sinônimo da pátria é a mais antiga tentação dos regimes personalistas.

Confundir o Estado com o governante de ocasião é um vício típico das democracias em erosão.

O verdadeiro patriotismo, ao contrário, exige coragem para resistir àquilo que corrompe a nação por dentro — ainda que essa corrupção venha travestida de legitimidade eleitoral ou de promessas bem-intencionadas.

Como ensinava Platão em A República, o bem da cidade deve estar acima do bem do governante.

A fidelidade a um país não se mede pelo silêncio diante de seus erros, mas pela lucidez com que se expõem seus desvios, na esperança de que ainda haja tempo para corrigi-los.

Patriota não é quem aplaude tudo — é quem protege o que permanece. E proteger o Brasil, neste momento, exige justamente separar o que é essencial daquilo que é transitório; o que é república daquilo que é propaganda; o que é Nação daquilo que é partido.

Como advertia Marco Aurélio — o filósofo, não o ministro — “o que prejudica a coletividade não pode beneficiar o indivíduo”. Se o governo prejudica o país, criticá-lo não é sabotagem — é dever moral.

3.3. O sofisma do apelo emocional: entre a indignação fabricada e a verdade dos atos

A terceira manipulação retórica foi a mobilização de um apelo emocional desproporcional — quase sempre teatralizado.

O gesto de Eduardo Bolsonaro foi pintado com tintas carregadas: “traição à pátria”, “submissão ao imperialismo”, “o fim do mundo”. Nenhuma dessas expressões resiste a uma análise sóbria dos fatos.

O que houve foi a leitura pública de uma carta oficial, assinada por um chefe de Estado, cuja existência e conteúdo são verificados, legítimos e pertinentes ao debate internacional.

Eduardo não inventou a mensagem, tampouco distorceu seu teor. Limitou-se a fazer, com naturalidade, uma interpretação política coerente com sua cosmovisão conservadora — algo perfeitamente legítimo numa democracia.

O alarde posterior foi uma tentativa clássica de desviar o foco da substância para o escândalo — do conteúdo para o mensageiro.

Como ensinava Aristóteles, “o orador desonesto não apela à razão, mas às paixões da plateia”.

E foi isso que se viu: uma tempestade de narrativas emocionalmente infladas, cujo objetivo era deslegitimar o interlocutor sem discutir o mérito.

É a lógica do linchamento moral: quando se quer impedir o pensamento, grita-se. E quando se quer desviar a culpa, acusa-se o outro de crime inexistente.

A verdadeira ameaça à pátria não está na leitura de uma carta estrangeira — está na incapacidade de encarar com maturidade os sinais do mundo e as consequências de nossas escolhas.

3.4. A redução ao absurdo: quando a paranoia ideológica se disfarça de patriotismo

A quarta distorção lógica foi a redução ao absurdo: transformou-se a leitura de uma carta em ato de sabotagem nacional.

Chamou-se de traição um gesto que, objetivamente, não envolveu qualquer quebra de sigilo, entrega de informação estratégica ou proposta de ação concreta contra o Brasil.

Eduardo Bolsonaro leu um documento público — e interpretou seu conteúdo à luz de sua visão de mundo.

Pintar isso como crime de lesa-pátria revela menos sobre o gesto em si e mais sobre a paranoia ideológica de quem o condena.

Como ensinava Epicteto, “não são os fatos que nos perturbam, mas os juízos que fazemos sobre eles”.

O juízo foi deliberadamente deformado para alimentar uma narrativa — e não para compreender a realidade.

Há aqui um jogo retórico perverso: o gesto banal é inflado artificialmente para gerar indignação popular e reforçar a ideia de que há inimigos internos conspirando contra o país.

Mas o verdadeiro veneno da política não está em quem lê cartas — e sim em quem escreve discursos dissimulados para camuflar seus próprios erros.

A histeria fabricada esconde o que deveria ser debatido com seriedade: os erros diplomáticos do governo Lula, sua submissão cega ao eixo sino-russo e a sucessão de bravatas que nos isolaram das grandes democracias ocidentais.

Como ensinaria Pascal, “a imaginação é a grande mentirosa da alma” — e, neste caso, mentiu com perfeição.

4. Quem realmente moveu o capital para fora?

Acusar Eduardo Bolsonaro de incentivar a evasão econômica é, no mínimo, uma inversão grotesca da causalidade.

Eduardo não criou os paraísos fiscais. Ele tampouco inventou a insegurança jurídica, a carga tributária sufocante ou o desprezo ideológico por quem empreende. Ele apenas expôs um sintoma — e foi atacado como se fosse a doença.

A verdade incômoda é que o capital brasileiro já vem fugindo há décadas, silenciosamente, guiado por um instinto de sobrevivência.

As maiores empresas do país têm subsidiárias no exterior, algumas registradas em regimes tributários muito mais benevolentes que o nosso.

E não é por acaso: a burocracia asfixia, o Estado é predador, e os governos — especialmente os do espectro socialista — costumam tratar o lucro como pecado e a liberdade econômica como ameaça.

Como ensinava Hayek, “não há nada mais perigoso que um governo que pretende saber o que é melhor para todos”.

Quando o Estado abandona sua função de garantidor neutro das regras e passa a punir os que produzem, o capital não milita: ele migra. Silencioso, pragmático e obediente às leis de mercado, ele não carrega bandeiras — carrega planilhas.

E muitos dos que hoje acusam Eduardo de antinacionalismo são os mesmos que, por anos, financiaram campanhas políticas com recursos oriundos dessas mesmas estruturas internacionais. A hipocrisia, portanto, não é apenas intelectual — é patrimonial.

Como dizia Confúcio, “o homem nobre culpa a si mesmo; o homem vulgar culpa os outros”.

Ao preferir atacar o mensageiro, a esquerda tenta ocultar o desastre sistêmico de sua própria política econômica.

Mas o capital, diferentemente da militância, não se deixa enganar por slogans. Ele responde a incentivos reais — e já faz tempo que o Brasil tem oferecido apenas desestímulos.

5. O delírio etílico da geopolítica: quando o “lugar de fala” vira lugar de perigo

Lula revelou seu descompasso com o mundo logo nos primeiros passos do terceiro mandato. Propôs, com tom jocoso, que Vladimir Putin e Volodymyr Zelensky resolvessem a guerra “tomando uma cevejinha num butiquim”. Foi solenemente ignorado por ambos — mas nada aprendeu com o silêncio.

Em vez de fazer autocrítica ou reconhecer o abismo entre sua retórica e a realidade internacional, Lula insistiu no erro com a arrogância típica de quem acredita que seu “lugar de fala” o habilita a falar de tudo — mesmo quando não é ouvido por ninguém.

Como advertia Aristóteles, o excesso de autoconfiança é o vício do intempestivo: aquele que age antes de pensar, movido pela ilusão de domínio sobre o que não compreende.

O resultado foi tragicômico: Lula passou a se comportar, na arena global, como um bêbado abandonado pelos companheiros que o desprezaram — e que, em sua frustração, volta-se contra os que julga serem culpados por seu isolamento.

Não ataca a China ou a Rússia, que o ignoraram. Ataca os Estados Unidos e o Ocidente, que representam, em sua lógica invertida, os responsáveis por sua exclusão da mesa dos adultos.

Como ébrio em delírio etílico, Lula confunde desprezo com conspiração e desconsideração com ofensa.

Sua diplomacia passou a operar não como estratégia de Estado, mas como desabafo de botequim.

E como todo ébrio deixado sozinho à mesa, Lula passou a ofender não os que o ignoraram, mas os que julgava responsáveis por sua humilhação.

Não mirou Putin, nem Zelensky — mirou justamente os pilares da ordem liberal que sempre desprezou: a liberdade de expressão, a economia de mercado, a autodeterminação das nações. Aquilo que ele nunca compreendeu tornou-se seu novo inimigo.

Mas o mais grave não é o delírio — é o perigo que ele produz.

Lula não está só nesse porre geopolítico. Carrega consigo uma comitiva embriagada: ministros ofuscados pela vaidade, juristas de estimação, empresários adestrados por subsídios, “comentaristas políticos” pagos com dinheiro público, militantes viciados em slogans — e até mesmo inocentes úteis que ainda precisam despertar.
Todos compartilham o mesmo copo ideológico, agora servido com a cachaça do medo — e nenhum deles tem coragem de chamar o bêbado à razão.

Como advertia Confúcio, “aquele que não domina a si mesmo buscará dominar os outros para esconder sua fraqueza”.

Em vez de contê-lo, seus aliados o inflamam. Em vez de lhe oferecer um banho frio de realidade, incentivam sua retórica embriagada.

Eles não apenas se calam diante da insensatez — aplaudem. Gritam com os clientes, insultam o dono do bar, derrubam garrafas, expulsam os moderados.

Como na caverna de Platão, preferem as sombras da ideologia à luz incômoda da verdade.

Estão todos em transe — mas com crachás oficiais, verbas públicas e cargos de comando.

E como em toda bebedeira coletiva, quem sofre não são os embriagados — é o dono do bar. Aquele que não bebeu, que não gritou, que só queria um lugar para trabalhar e descansar. É ele quem paga pelos copos quebrados e pelas dívidas deixadas no balcão.

No caso brasileiro, o dono do bar é o povo. O trabalhador que madruga para sustentar sua família. O pequeno empresário sufocado por tributos. O agricultor que gera alimento e riqueza. São eles que arcam com os desatinos diplomáticos de um governo ébrio de ideologia.

E não haverá ressarcimento.

Porque, ao fim da noite, os ébrios vão embora rindo, impunes — enquanto o país amanhece com os estragos. A conta será paga por todos, menos por quem bebeu.

Como dizia Lao-Tsé, “governar uma grande nação é como cozinhar um pequeno peixe: exige cuidado, não violência”. Lula e seus companheiros, no entanto, preferiram fritar o peixe no álcool da retórica embriagada — e ainda culparam os peixes pelos incêndios na cozinha.





6. A metáfora da quimioterapia: Trump e o chacoalhão necessário

O Brasil não enfrenta apenas uma crise política ou econômica — enfrenta um câncer institucional.

As metástases já são visíveis: aparelhamento ideológico, censura disfarçada de proteção democrática, descontrole fiscal crônico, insegurança jurídica paralisante e hostilidade constante à livre iniciativa.

Como todo câncer, essa doença exige um tratamento drástico. E, tal como na medicina, a quimioterapia dói. Ela enfraquece antes de fortalecer. Intoxica antes de purificar.

Todavia quando não há mais alternativas brandas, a única esperança de cura é atravessar o desconforto com lucidez e coragem.

A dificuldade maior, porém, é que o remédio só funciona quando o corpo doente reconhece a doença e colabora.

Um organismo que se recusa a aceitar sua enfermidade sabota seus próprios anticorpos.

O mesmo vale para as nações: quando o governo nega o colapso ético e institucional, apenas acelera sua decomposição.

Nesse quadro, os anticorpos ainda possíveis — o empresariado responsável, os cidadãos lúcidos, os servidores públicos com ética, a juventude que ainda busca sentido — precisam despertar.

A carta de Trump, lida por Eduardo Bolsonaro, não foi um ataque: foi um choque externo.

Um gesto que lembra o desfibrilador aplicado no paciente inconsciente: violento, sim — mas motivado pelo desejo de reanimar a vida.

Como ensinava Viktor Frankl, “entre o estímulo e a resposta, há um espaço”. E é nesse espaço que mora nossa liberdade de escolher.

O Brasil pode escolher reagir. Pode escolher retomar o rumo, acordar da hipnose ideológica, restaurar o equilíbrio fiscal, institucional e moral.

Mas se insistirmos em dormir — amparados por narrativas confortáveis e orgulhos feridos — a metástase moral e econômica pode se tornar irreversível. E, nesse caso, nem Trump, nem carta, nem anticorpos bastarão.

6.1 – A tática do escudo humano: quando o governo se protege com o povo

Há formas de tirania que não marcham com botas, mas se disfarçam de vítimas. Não são os regimes declaradamente opressores que mais assustam — são os que manipulam a linguagem da compaixão para se esconder da responsabilidade.

O governo Lula, acuado pelas consequências de seus próprios atos, não responde com argumentos — responde com escudos simbólicos: o povo, a pátria, a soberania. Usa-os como trincheiras morais, como quem diz: “Se nos atacam, atacam vocês.”

Mas essa confusão entre governo e nação, entre Estado e partido, é uma fraude política e uma falácia filosófica.

Como alertava Confúcio, o início de toda restauração ética está em “chamar as coisas pelo nome justo”. E o nome justo disso não é patriotismo — é instrumentalização.

Guardadas as devidas proporções sociopolíticas e éticas, a tática retórica de Lula e seus aliados lembra a do Hamas: provocam o inimigo, desafiam abertamente a lógica geopolítica — e, quando recebem a resposta, correm a se esconder atrás de inocentes.

Não literalmente com escudos humanos, mas com escudos semânticos. Usam a imagem do povo brasileiro como biombo de seus delírios diplomáticos. E ao serem atingidos, dizem: “Olhem o que estão fazendo com nosso país!”

Mas não é o Brasil que está sendo punido — é o projeto ideológico que o sequestrou. A resposta americana não foi uma agressão à nação, mas uma reação ao desrespeito que o atual governo vem cultivando como doutrina.

É o mesmo truque de sempre: criar a crise, gerar o dano e depois encenar o martírio. Como alertava Viktor Frankl, “a dor que não se transforma em responsabilidade vira instrumento de manipulação”.

Simone Weil dizia que “o uso político da dor alheia é a mais indigna forma de usurpação simbólica”.

É isso que assistimos: um governo que se coloca como o próprio corpo da pátria — e, assim, torna qualquer crítica uma suposta agressão à soberania nacional.

Quando na verdade, o que está sendo questionado é sua própria conduta, sua arrogância, sua incapacidade de governar sem inflamar a ideologia.

Usar o povo como manto sagrado é o último recurso de regimes em declínio. É o gesto de quem já não tem argumento nem virtude — apenas escândalo e chantagem emocional. A população vira escudo. A soberania vira slogan. A pátria vira biombo de seus próprios erros.

Como advertia Hannah Arendt, “os totalitarismos modernos não se impõem pela força bruta apenas — eles seduzem pela inversão moral.”

E o que vemos hoje é essa inversão em sua forma mais primitiva: o agressor posando de vítima, o incendiário vestindo a toga de bombeiro, o responsável pelo colapso posando de defensor da estabilidade.

Cabe a nós, como cidadãos e como pensadores, recusar esse teatro de sombras. Não se trata de escolher entre Trump e Lula, entre direita e esquerda — trata-se de reconhecer o óbvio: quem provoca reações geopolíticas deve responder por elas.

E quem usa o povo como escudo, não merece falar em nome do povo — merece ser desmascarado diante dele.

7. O sistema imunológico da não-cumplicidade

A salvação de uma república enferma não virá de fora, nem de cima — virá de dentro e de baixo, do que ainda resta de lucidez em seu tecido social.

O verdadeiro antídoto para o colapso institucional é o despertar da consciência cívica, antes que a degradação se torne irreversível.

Quando a população compreender que o colapso não se origina nas críticas — mas sim na persistência de um sistema adoecido que se recusa a se reformar — então o sistema imunológico da república poderá ser reativado.

Como ensinava Confúcio, “governar é retificar os nomes” — e enquanto continuarmos chamando censura de proteção, desgoverno de democracia e aparelhamento de justiça, não haverá cura possível.

O que nos adoece não é o choque da verdade, mas a adaptação passiva à mentira. Não é o tapa que nos mata — é o silêncio cúmplice diante da falsidade.

A infecção mais letal de um corpo político não é externa, mas interna: ela se chama conformismo.

Como lembrava Hannah Arendt, “o maior mal é cometido por pessoas que não decidem ser nem más nem boas, mas apenas se recusam a pensar”.

Uma democracia que abandona o pensamento crítico em nome da lealdade cega já não é mais uma democracia — é uma febre disfarçada de vitalidade.

Resta, pois, a cada cidadão, a escolha silenciosa e decisiva: ser anticorpo ou ser célula corrompida.

Aqueles que ainda sentem incômodo diante da mentira, mesmo que em silêncio, ainda são sinais de que o corpo da república — embora doente — não está morto.






8. Conclusão — A verdade não pede licença

Num país adoecido, a verdade é sempre percebida como agressão. Mas ela não fere — ela desperta. O problema é que muitos preferem a febre da ideologia ao remédio da lucidez.

É fato: Eduardo Bolsonaro cometeu excessos no passado. Em certos momentos, optou por frases infelizes, como a menção ao AI-5 ou a insinuação de que o STF poderia ser fechado por “um cabo e um soldado”.

Em outras ocasiões, Eduardo adotou um tom combativo que obscureceu conteúdos legítimos, permitindo que a forma ofuscasse o mérito. Ao reduzir o debate a chavões, perdeu-se a chance de convencer pelo argumento.

Mas neste episódio, não foi o incendiário — foi o mensageiro. Limitou-se a ler uma carta oficial de um aliado internacional, cujos termos refletem uma realidade geopolítica concreta.

Fingir que ele é o vilão do enredo é apenas mais uma forma de preservar o tumor onde está — e de culpar o termômetro pela febre que revela.

A coragem de olhar o real não está em quem grita mais alto, mas em quem se recusa a ser enganado.

Como ensinava Confúcio, "aquele que reconhece seus erros está no caminho da sabedoria". E como advertia Pascal, “a verdade ofende só os que vivem da mentira”.

Recusar-se a ouvir não é resistência — é cumplicidade com a anestesia. E, neste momento, calar diante do que foi dito na carta de Trump é como desligar os monitores e culpar o médico pelo diagnóstico.

Em tempos de propaganda, pensar é subversivo. Em tempos de silêncio imposto, escutar é um ato de coragem.

E neste caso, o que se exige do Brasil não é gritar de volta, mas escutar com maturidade. A verdade, afinal, nunca pediu licença — apenas mostrou o espelho.

9. Epílogo — O que é que a vida está querendo nos dizer?

Há alguns anos, estive à beira da morte, internado com uma grave infecção por covid. Mesmo debilitado, relutava em admitir o óbvio: eu estava doente. Continuava trabalhando, falando, insistindo — como se negar a doença fosse o mesmo que curá-la. Mas o corpo não aceita truques. A cada dia, eu piorava.

Até que, num momento de lucidez, recordei o ensinamento de Lúcia Helena Galvão:
“Pergunte à vida o que ela está querendo lhe dizer.”

E eu perguntei. Sem disfarces. Sem heroísmos de fachada. Sem a arrogância de quem acredita ser insubstituível.

A resposta veio com a simplicidade das verdades essenciais: “Pare. Cuide-se. Você está doente. Se morrer, não será o mundo que sofrerá — será sua família. Volte ao essencial antes que o colapso seja irreversível.”

Foi isso que me salvou. Não um discurso inflamado, nem um remédio milagroso — mas o reencontro com a verdade que eu tentava abafar.

A cura começou no instante em que aceitei o diagnóstico e abandonei a ilusão da normalidade. Só então os tratamentos surtiram efeito e meu organismo teve forças para reagir.

O Brasil está hoje diante da mesma encruzilhada. A carta de Trump foi um símbolo. Não de guerra — mas de alerta.
Um chamado duro, direto e necessário.

A reação do governo brasileiro não foi um silêncio constrangido. Foi histeria coletiva. Foi gritaria institucional. Foi o barulho típico de quem, ao ouvir o diagnóstico, prefere destruir o médico em vez de tratar a doença.

Mais do que uma carta, o que se ouviu foi o estalar de um tapa na cara de um paciente em coma. E, como ocorre nesses casos, quem ainda sonha reage com violência — não por maldade, mas porque foi arrancado de sua anestesia ideológica.

A febre da ideologia continua sendo preferida ao remédio da lucidez.

O sistema político-institucional brasileiro reage com espasmos, distorções, acusações e vitimismo.

Não quer ser curado — quer apenas manter a aparência de vitalidade enquanto o tumor cresce no escuro.

Como bem ensina Lúcia Helena, a vida fala por símbolos. Ela envia sinais. E quando não os escutamos, ela grita.

A pergunta não é mais o que Trump quis dizer, o que Eduardo deveria ou não ter feito, ou o que a imprensa distorceu.

A pergunta é outra. Mais íntima. Mais radical. Mais necessária. É a pergunta que me salvou — e que talvez ainda possa salvar o Brasil: “O que é que a vida está querendo nos dizer?”

E mais do que isso: “Ainda temos coragem de escutar antes que seja tarde demais?”

Como diria Lao-Tsé: “Os sinais vêm antes das tragédias — mas os cegos preferem os ruídos da própria voz.”

Lembro com ternura de quando meus filhos, Beatriz e Luiz Eduardo, ainda pequenos, contraíam infecções e precisavam tomar antibióticos orais.

Reclamavam do gosto com uma comparação inusitada: diziam que tinha gosto de "esquilo frito” — iguaria que, ao que me consta, nunca esteve no cardápio brasileiro, muito menos no da nossa casa.

Eu ria, mas não podia me compadecer demais de seu paladar violado. Era preciso curar. Era preciso debelar a infecção.

E o amor, nesses momentos, se manifestava não no alívio imediato, mas na firmeza silenciosa de quem sabe o que está em jogo.

O Brasil hoje está doente. A carta de Trump é o antibiótico. A histeria que se seguiu, o grito da criança que rejeita o remédio. Mas amar um país é também não ceder ao gosto corrompido de sua anestesia ideológica.

10. Pós-escrito — A última escuta

10.1 Da cervejinha à jabuticaba: a diplomacia Infantilizada e o custo da irresponsabilidade geopolítica

Ainda no início de seu mandato, Lula ousou propor — com uma sinceridade constrangedora — que Putin e Zelensky resolvessem a guerra na Ucrânia “numa boa conversa, tomando uma cervejinha”.

Não se tratava de uma metáfora retórica, mas de um esboço real de posicionamento internacional.

A diplomacia brasileira, que já foi num passado anterior aos governos petistas admirada por sua sobriedade, passou a ser conduzida como se estivesse num bar de esquina — com sentimentalismos improvisados e um descompromisso assustador com a tragédia humana.

A resposta global foi o silêncio. Um silêncio eloquente. Putin não respondeu. Zelensky não respondeu. Os chanceleres do mundo civilizado também não.

Resultado: a proposta foi tratada com o desprezo que se reserva aos comentários de um adolescente mimado que, pela força das circunstâncias, se viu sentado no trono de um adulto.

A ausência de resposta foi, em si, uma forma de julgamento. Nenhum líder sério respondeu à proposta da “cervejinha da paz” entre Putin e Zelensky — porque ali não havia diplomacia, havia delírio. A indiferença não foi silêncio: foi sentença.

Agora, como que tropeçando novamente sobre o próprio script, Lula oferece jabuticaba a Trump para selar a paz — como se a leveza tropical pudesse substituir a sobriedade diplomática, e a caricatura de um gesto apagasse os efeitos de dois anos de afrontas.

O que para alguns parece bom humor, para o mundo é apenas confirmação da ausência de gravidade institucional. A política externa brasileira, que já foi conduzida com reserva, respeito e prudência, transformou-se em um teatro simbólico de frutas e frases, onde a autoridade se dissolve em performance e o país escorrega para o papel de figurante dissonante num palco que exige lucidez.

E é exatamente nesse ponto — entre a fruta e a falácia — que se revela o real custo da irresponsabilidade geopolítica: o Brasil, outrora fiador da moderação hemisférica, torna-se isca e moeda, enquanto os verdadeiros estrategistas atravessam ilesos o rio das decisões internacionais.

É essa travessia — e o lugar que Lula escolheu nela — que os próximos tópicos desvelam.

10.2. A retórica da multipolaridade e a realidade da subserviência

A insistência em desmontar a lógica do dólar nas transações do BRICS, apresentada por Lula como um ato de coragem geopolítica, revelou-se, na prática, um gesto precipitado, desarticulado e diplomaticamente desastroso. O próprio chanceler russo, Sergey Lavrov, declarou em entrevista recente que o Brasil havia “precipitado o debate”, criando ruído técnico e político onde deveria haver estratégia coordenada.

Quando até um aliado estratégico como a Rússia — notoriamente pragmática — recua publicamente diante do voluntarismo brasileiro, é sinal inequívoco de que o país deixou de ser protagonista e passou a ser peso morto diplomático. Ninguém confia em quem se antecipa aos fatos por vaidade pessoal. A diplomacia, quando conduzida por impulsos ideológicos, não é resistência — é imprudência.

Mais do que isso: em seus arroubos de grandeza e numa retórica embriagada de revanche histórica, Lula se prestou ao papel simbólico do boi de piranha — expressão nascida nas margens dos rios amazônicos para designar o animal sacrificado de propósito, lançado às águas infestadas para distrair os peixes carnívoros e permitir que a boiada verdadeira atravesse incólume.

Enquanto o presidente brasileiro vociferava contra o dólar, exaltava ditaduras fracassadas e tentava transformar o BRICS num palanque antiocidental, China e Rússia observavam à distância, com a frieza de quem protege seus interesses, mas precisa de um peão barulhento para ser devorado em seu lugar.

O Brasil tornou-se o boi chamativo, atolado no lodo simbólico do confronto. E como manda o rito da travessia amazônica, os dentes da reação internacional vieram primeiro sobre ele — enquanto os verdadeiros artífices do bloco atravessavam ilesos, negociando nos bastidores, com silêncio estratégico, as condições mais vantajosas para suas economias e posições globais.

A ironia é trágica: quem se dizia líder do Sul Global foi abandonado no meio do rio. A retórica da multipolaridade, que poderia ter sido construída com prudência e realismo, foi transformada por Lula num delírio de subversão irresponsável — e o Brasil, que deveria ser respeitado como potência diplomática, passou a ser tratado como moeda de troca geopolítica, útil apenas enquanto distrai os tubarões reais do tabuleiro mundial.

Hoje, mesmo os demais parceiros do BRICS — como Índia e África do Sul — negociam com os Estados Unidos condições significativamente mais vantajosas do que aquelas impostas ao Brasil. Porque não é o discurso inflamado que define a dignidade de uma nação, mas a capacidade de agir com sobriedade, consistência e responsabilidade institucional.

Ao inverter esse princípio, Lula não apenas empobreceu a posição internacional do Brasil — ele a vulgarizou. Fez da diplomacia um teatro de sombras, da liderança um capricho performático, e do país que governa, um animal ferido lançado às piranhas — não em nome da coragem, mas como distração sacrificial no roteiro dos verdadeiros estrategistas globais.

A cúpula dos BRICS realizada no Brasil foi o ponto culminante dessa deriva simbólica. Os principais líderes — Xi Jinping e Vladimir Putin — sequer compareceram. Mandaram representantes. Lula, por outro lado, tratou o evento como um comício ideológico, abraçando regimes como Irã, Venezuela, Belarus e Etiópia, tentando forçar suas entradas no bloco como se o BRICS fosse uma extensão de sua militância pessoal.

Com isso, o Brasil não apenas se isolou dos países ocidentais — rompeu sua própria credibilidade interna dentro do BRICS. Índia e África do Sul manifestaram, mesmo que discretamente, desconforto com o novo rumo do bloco. E o que era para ser uma conferência de alinhamento estratégico tornou-se uma encenação dissonante. O Brasil — outrora fiador da estabilidade hemisférica — converteu-se em agente de desestabilização e ressentimento, promovendo sua própria irrelevância como se fosse bravura.

10.3. Trump e o Gatilho das Consequências

A resposta de Trump não foi intempestiva. Foi lógica. Foi técnica. Foi calculada.

Lula desferiu socos diplomáticos durante dois anos — provocou, isolou, debochou e encenou sua rebeldia ensaiada — e agora se mostra surpreso com a reação. Como se o mundo estivesse obrigado a tolerar indefinidamente sua performance.

A carta foi apenas o prenúncio da ação. O anúncio da tarifa de 50% sobre produtos brasileiros não caiu do céu — foi o desfecho de uma cadeia de escolhas inconsequentes.

E, como se não bastasse, depois de vociferar por dois dias, a reação do presidente brasileiro foi gravar um vídeo matinal — com os olhos semicerrados, cabelo desalinhado e um tom pueril — oferecendo “jabuticaba ao Trump” e dizendo que “quem come jabuticaba não briga”.

Ora, isso não é diplomacia — é desconexão simbólica com a realidade. Um país não sobrevive de fruta tropical, mas de coerência estratégica.

Quando o presidente troca o verbo geopolítico pela metáfora rural, não está tentando pacificar — está tentando encobrir o desastre que ele mesmo causou.

10.4. Entre a Piada e o Colapso: O Niilismo Performático no Poder

Há um traço comum em toda essa sequência: a recusa em levar o real a sério. A proposta da cervejinha, o isolamento no BRICS, a provocação contra o dólar, a carta ignorada, a retaliação tarifária e a oferta de jabuticaba — todas essas ações formam uma curva contínua de desresponsabilização simbólica, típica do que Nietzsche chamou de niilismo performático: a recusa da verdade em nome da teatralidade.

Esse tipo de niilismo não grita — ri. Não assume erro — transforma tudo em meme. Não corrige o curso — dobra a aposta em cima da própria ilusão.

A jabuticaba, nesse contexto, não é só uma fruta — é uma alegoria do Brasil que não se dá mais ao respeito. Um país que acredita poder driblar o peso da realidade com o charme da tropicalidade.

Mas, infelizmente, o mundo não sorri de volta. Ele aproveita a oportunidade para aplicar tarifas.

10.5. A diplomacia como espelho do caráter nacional

Um governante que não honra o peso de sua palavra compromete o nome de sua nação. Um estadista que oscila entre insultos e frivolidades — da cerveja à jabuticaba — não projeta paz: projeta desorientação.

O povo brasileiro é maior do que essa farsa simbólica. Não merece pagar 50% a mais sobre seus produtos porque seu presidente decidiu brincar de geopolítica.

Não se trata de escolher entre confronto ou submissão. Trata-se de recuperar a dignidade estratégica, o respeito pelas alianças históricas e a gravidade dos ritos diplomáticos.

É possível defender os interesses nacionais sem desmoralizar a nação. Mas, para isso, é preciso governar com maturidade — e não com alegorias tropicais.

Lula não está sendo atacado — está sendo chamado à razão. E como todo orgulhoso que não aceita crítica, prefere fazer piada com fruta a admitir que errou.

O problema é que quem governa com jabuticaba pode terminar levando o país ao fundo do cesto — onde as frutas já não estão doces, e sim podres.

10.6. O impacto real: da argentinização simbólica à venezuelização estrutural

A carta de Trump pode ter parecido uma grosseria para os que vivem de retórica, mas para os que vivem de produção, comércio e risco — ela soou como sirene de evacuação.

No curto prazo, o Brasil tende a viver uma argentinização econômica:

– perda de credibilidade internacional,
– desvalorização cambial,
– aumento da inflação,
– retração dos investimentos,
– tentativa populista de controle de preços ou tributos,
– e, por fim, a erosão silenciosa da classe média.

Esse estágio ainda permite resgate — mas exige lucidez, humildade diplomática e compromisso com instituições previsíveis.

Se essa inflexão não ocorrer, o segundo estágio se insinua com lentidão e depois se instala com brutalidade: a venezuelização estrutural.

Aqui já não se trata apenas de economia:

– as instituições passam a operar sob um manto de exceção permanente;
– a censura deixa de ser pontual e vira método;
– a moeda perde seu valor simbólico e passa a ser substituída por favores;
– o Estado deixa de servir ao povo e passa a alimentá-lo apenas para usá-lo como escudo.

Neste ponto, não se trata mais de esquerda ou direita — trata-se de colapso civilizacional, onde as palavras perdem o sentido, os contratos perdem a força e o povo perde o chão.

A escalada não é imediata. Ela começa no câmbio, passa pela fila do pão, contamina a confiança jurídica e termina no silêncio forçado. A história já escreveu esse roteiro — mas só repete para quem não soube escutá-la.

10.7 — O Espelho Final: Entre a Cumplicidade e a Consciência

Se você chegou até aqui, não carrega mais o direito de alegar ignorância.

O que foi dito não é um manifesto político, nem um panfleto partidário. É um espelho.
Um espelho incômodo, talvez — mas necessário.

O Brasil não precisa de mais slogans. Precisa de consciência. Não precisa de salvadores. Precisa de cidadãos despertos.

Não nos faltam palcos — nos falta lucidez.
Não nos faltam narrativas — nos falta coragem de olhar a realidade.

O país não precisa do mi-mi-mi da esquerda, travestido de justiça social, enquanto negocia nos bastidores o poder pelo poder.

Também não precisa de Reinaldo Azevedo revirando os olhos, com sua ironia cansada e suas defesas cifradas, como quem protege, com vocabulário rebuscado, o patrocinador de sempre.

Tampouco precisa de youtubers fardados ou lavradores inflamados, fazendo caras e bocas diante das câmeras, como se fossem sacerdotes da verdade — quando, na verdade, não passam de artistas do algoritmo.

Esse teatro ideológico, com cenários mal pintados e personagens previsíveis, já nos custou demais.

A histeria performática não redime a covardia interior. A gritaria dos extremos serve apenas para abafar o chamado da consciência.

A história não é feita apenas por quem governa. Ela é moldada, dia após dia, por aqueles que — em silêncio ou em voz alta — consentem ou resistem.

O momento exige grandeza. E grandeza, hoje, começa com uma pergunta simples, mas difícil de encarar: De que lado estou? Do lado da anestesia ou da escuta? Do lado da propaganda ou da verdade?

Talvez não possamos mudar tudo.
Mas podemos mudar o suficiente para não nos tornarmos cúmplices do colapso.

Quem cala diante da mentira, morre com ela.
Quem escuta o chamado da vida — mesmo que tarde — ainda pode atravessar o deserto.

O tempo da negação acabou. O que está em jogo já não é apenas o futuro do Brasil. É a dignidade de quem ainda tem olhos para ver, ouvidos para ouvir e coração para discernir.

Seja essa consciência.

Seja esse ponto de virada.

Seja o início da cura.

10.8 — O Peso da Escolha: Entre a Omissão Histórica e a Pressão Cívica

Não se trata mais de perguntar “o que vai acontecer com o Brasil”. A verdadeira pergunta, agora, é: o que o Brasil — enquanto sociedade viva — vai permitir que aconteça consigo mesmo?

A travessia em que nos encontramos não será decidida apenas nos gabinetes de Brasília, nem nos escritórios de Washington. Ela será decidida na consciência coletiva de um povo que precisa, finalmente, assumir a responsabilidade pelo próprio destino.

Aqueles que detêm o poder real neste país — banqueiros, empresários, militares, juízes e estrategistas de bastidor — sabem que Lula só chegou até aqui porque houve quem visse vantagem na sua volta ao jogo político, mesmo após ter sido condenado em três instâncias.

A máquina que o reconduziu à cena não nasceu da vontade popular, mas da engenharia de bastidores — jurídico-midiática — que operou sob o disfarce da legalidade.

E dentro desse tabuleiro, é justo reconhecer que Bolsonaro, embora não responsável por essa soltura, cometeu um erro estratégico grave ao acreditar que vencer Lula seria mais fácil do que enfrentar um adversário novo e limpo. Não foi conivência — foi cálculo político mal feito. E o preço está sendo pago por todos nós.

Do outro lado, temos a população. Essa mesma população que, desde a Proclamação da República, foi reduzida a espectadora — ora iludida, ora anestesiada, ora acuada — das maiores sandices cometidas em seu nome.

O povo brasileiro, por vezes sábio e valente, mas quase sempre boquiaberto e inerte diante do absurdo, precisa decidir se continuará esperando “ver no que vai dar” ou se enfim compreenderá que já deu — e que é hora de reagir.

A escolha está posta: pressionar o governo brasileiro a parar de brincar de ideologia e começar a negociar como gente grande, ou continuar brincando de bravata até o colapso nos alcançar. Xi Jinping, muito mais poderoso, já o fez.

E o fez por sabedoria, não por submissão. Porque quem governa uma nação não deve disputar quem grita mais alto, mas quem garante mais estabilidade, mais soberania e mais futuro para seu povo.

O tempo da teatralidade acabou. Agora é o tempo do discernimento estratégico.

Ou o Brasil se reconhece doente — e busca cura com quem pode oferecer tratamento —
Ou continuará fingindo saúde até que nenhuma quimioterapia seja mais possível, apenas a necropsia, mas antes disso vai preferir ficar na confortável e condenável condição de vítima das circunstâncias.

A história ainda não escreveu sua última linha.

Mas o Brasil, neste instante, segura a caneta com mãos trêmulas.

Resta saber se vai escrever um epitáfio…

Ou um novo começo.

(*) O autor é advogado, procurador do Estado aposentado, ex-Procurador-Geral do Estado do Amazonas e membro da Academia de Ciências e Letras Jurídicas do Amazonas.

NR - Os textos assinados expressam a opinião dos seus autores. O Poder estimula e acolhe a diversidade de ideias.
imagem noticia-5

Deseja receber O PODER e artigos como esse no seu zap ? CLIQUE AQUI.

Confira mais notícias

a

Contato

facebook instagram

Telefone/Whatsappicone phone

Brasília

(61) 99667-4410

Recife

(81) 99967-9957
Nós usamos cookies e outras tecnologias semelhantes para melhorar a sua experiência em nosso site.
Ao utilizar nosso site e suas ferramentas, você concorda com a nossa Política de Privacidade.

Jornal O Poder - Política de Privacidade

Esta política estabelece como ocorre o tratamento dos dados pessoais dos visitantes dos sites dos projetos gerenciados pela Jornal O Poder.

As informações coletadas de usuários ao preencher formulários inclusos neste site serão utilizadas apenas para fins de comunicação de nossas ações.

O presente site utiliza a tecnologia de cookies, através dos quais não é possível identificar diretamente o usuário. Entretanto, a partir deles é possível saber informações mais generalizadas, como geolocalização, navegador utilizado e se o acesso é por desktop ou mobile, além de identificar outras informações sobre hábitos de navegação.

O usuário tem direito a obter, em relação aos dados tratados pelo nosso site, a qualquer momento, a confirmação do armazenamento desses dados.

O consentimento do usuário titular dos dados será fornecido através do próprio site e seus formulários preenchidos.

De acordo com os termos estabelecidos nesta política, a Jornal O Poder não divulgará dados pessoais.

Com o objetivo de garantir maior proteção das informações pessoais que estão no banco de dados, a Jornal O Poder implementa medidas contra ameaças físicas e técnicas, a fim de proteger todas as informações pessoais para evitar uso e divulgação não autorizados.

fechar