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Cultura, Sobre a Diversidade de um conceito – 24 - Quando o Teatro Falta ... Por Alain Kerlan

29/07/2025 -

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Peut-on parler de théâtre
si ne nous parvient pas le souffle des voix ?
Guy Bruit

A humanidade e as diversas culturas em que ela se incarna têm em comum e em compartilhamento algumas experiências ontológicas fundadoras, dispersas entre o viver e morrer. Uma antropologia filosófica que considere tais experiências com plena atenção fará necessariamente foco sobre os rituais através dos quais essas experiências comuns se exprimem diversamente na pluralidade das culturas.

Esses rituais dão relevo ao que Gadamer denominou invariantes antropológicos. Este filósofo alemão nos convida a reencontrar, na obra de arte e na experiência da arte, quaisquer que sejam, para aquém da diversidade cultural e histórica que as caracteriza, a presenças de três invariantes : o fogo, o símbolo, a cerimônia.

L’humanité et les diverses cultures où elle s’incarne ont en commun et en partage quelques expériences ontologiques fondatrices, qu’elles déploient entre vivre et mourir. Une anthropologie philosophique qui leur porte pleine attention s’arrêtera nécessairement aux rituels par lesquels ces expériences communes s’expriment diversement dans la pluralité des cultures. Ils signalent ce que Gadamer appelait des invariants anthropologiques. Le philosophe allemand nous invite à retrouver, dans l’œuvre d’art et l’expérience de l’art, quelles qu’elles soient, en-deçà de leur diversité culturelle et historique, la présence de trois invariants : le jeu, le symbole, la cérémonie.

O teatro e a cultura : diversidade e unidade

Não seria o caso de ampliar a proposta de pertinência destes três invariantes do domínio das artes para toda a cultura? Esta questão, esta perspectiva poderiam parecer puramente especulativas. Não obstante, elas me chegaram, elas se impuseram a mim existencialmente, carnalmente, no âmago de uma experiência na qual uma parte considerável da humanidade se encontra atualmente embarcada, por ocasião de uma pandemia que se estende de um extremo a outro de um planeta Terra mundializado: a experiência e a provação do confinamento.

Raras, muito raras são as experiências efetivamente comuns à humanidade inteira, e compartilhadas em um mesmo tempo e mesmo espaço. Os anos 2020 e 2021, « os anos Covid 19 » poderiam muito bem figurar nos anais como aqueles representativos dessa muito rara experiência comum, de um muito singular « millésime » antropológico.

Estes anos Covid 19 ainda fazem parte do tempo presente, no momento em que escrevo, mas eu estou convencido que eles permanecerão de forma muito particular - pelo menos para aquelas e aqueles que terão sido poupados pela doença e pela angústia, e que têm a sorte de viver sob regimes políticos e sociais suficientemente preocupados com a sorte de todos - como a experiência de uma relação estranhamente paradoxal. com a cultura.

Entenda-se aqui « cultura » não somente o que expressa a definição sociológica ou antropológicacorrentes, como aquela frequentemente citada e atribuída a E. B. Tylor : a cultura como « esse todo complexo abarcando simultaneamente as ciências, as crenças, as artes, a moral, as leis, os costumes e as demais faculdades e hábitos adquiridos pelo homem… »

(Edward Burnet Tylor Primitive Cultura, 1871) ; esta definição tem o defeito de homogeneizar o que ela reúne sem dizer minimamente o que justifica esse agrupamento.

Tentemos antes compreender o que há de comum entre a atividade de ir a um café para tomar o aperitivo de final de tarde, com amigos (ou mesmo sozinho, observando os demais clientes e os passantes…), a atividade que nos conduz a cruzar a porta de um teatro, sentar-se na platéia no lugar indicado pelos bilhetes comprados com antecedência de vários dias, e ainda o juntar-se com amigos à multidão impaciente no hall de uma sala de cinema… Tais experiências, e muitas outras, como flanar inocentemente e enfim com a face à mostra por nossas ruas preferidas - cada um aqui contribuirá com seus depoimentos - o confinamento estrito ao qual nós somos forçados assim como este outro confinamento que constitui o fechamento sine die dos locais onde poderíamos viver tais experiências, dá a elas um relevo impressionante, uma espessura inesperada.

E precisamente porque tais confinamentos nos privam de tais experiências. É devido ao fato de que tais experiências nos fazem falta que nós conhecemos, nessa falta mesma, a profundidade, o enraizamento ontológico destas experiências ordinárias que constituem o tecido insubstituível de nossas vidas.

Que cada um aqui se permita essa pergunta simples, interrogue suas próprias carências: o que falta a alguém quando este alguém aspira a enfim reencontrar seu terraço de café favorito, seu restaurante habitual, a entrada na sala de cinema que logo escurece para acolher as luzes e sombras da tela de projeção, o que falta senão uma certa forma de jogo, senão de cerimônia, senão uma espécie de prática simbólica ?

Esta única questão, esta « experiência em pensamento » como a denominaria alguém familiarizado com a filosofia analítica, produz esse efeito de manter juntos, num mesmo pertencimento, tanto nossas maneiras de viver e de fazer (a cultura « ordinária ») quanto nossas práticas e prazeres culturais mais « refinados » (a « alta-cultura) , em suma, tanto a arte de viver quanto a arte dos museus, ao invés de hierarquizá-las do inferior ao superior de uma escala cultural.

A falta do teatro é a falta de quê?

A experiência do confinamento, para mim, e acredito que também para muitos de nós, conduz inexoravelmente a um paradoxo durável. Eis que nos vemos subitamente liberados do tempo dos encargos, e beneficiários de um tempo devolvido a nós mesmos; liberados em última análise do tempo devotado à reprodução da força de trabalho, e ricos de um tempo livre para “si mesmo”, para este famoso “ócio” (skolè,?????), privilégio do homem livre para os gregos antigos, livre para consagrar seu tempo ao cultivo de si, ao aperfeiçoamento de si-mesmo, ao benefício da cidade.

E na euforia momentânea desse tempo suspenso (momentânea, pois ela dura somente o tanto que nós fingimos ignorar que um dia será preciso pagar caro em termos de crise econômica e social pela suspensão do tempo roubado), uma espécie de sede de cultura pode nos ganhar: leiamos, escutemos música, visitemos os museus do mundo que abrem de par em par suas portas virtuais!

Na França, que tem a pretensão de ser o país da cultura, esta sede se encarnou no mais alto nível do Estado no discurso político de acompanhamento e de gestão do confinamento decretado: a própria palavra presidencial foi portadora num primeiro tempo de mensagem otimista do tempo recuperado para a cultura, convidando cada cidadão a dela usufruir.

Em última análise, uma maneira de retomar o sentido mais profundo da cultura por ocasião da pandemia, tal como definiam tal sentido tanto Hannah Arendt quanto Hans Georg Gadamer. Diante da questão “O que é uma obra de cultura?”, ambos davam a mesma resposta: uma obra da cultura - um romance, um quadro, uma composição musical, uma coreografia, uma peça de teatro, etc... - é algo que nos leva a nos deter, a parar, que exige que o tempo dos engajamentos habituais seja posto em suspensão e se abra noutro tempo, um tempo regenerador, o tempo do jogo, da cerimônia, do símbolo.

O confinamento nos brindaria então, acidentalmente, com o “presente” dessa suspensão regeneradora?Acreditamos que muito em breve terá sido necessário renunciar a esse encanto. O tempo dos compromissos cotidianos usuais está certamente suspenso, e nossa disponibilidade em relação à cultura maior do que jamais esteve.

Não obstante, percebemos bem depressa, uma vez esse tempo recuperado, que nenhuma das ofertas virtuais que nos lançam os teatros, os museus, as salas de concertos e os auditórios, nem mesmo aquelas proporcionadas pelos próprios artistas por trás de suas câmeras web, nenhuma dessas ofertas consegue cumprir duravelmente a promessa.

Virtualizados, o teatro, o concerto, o quadro do museu que nós nos reencontramos ou descobrimos não estão lá, e nos fazem falta nessa falsa presença; ou mais precisamente, nós descobrimos que nos falta alguma coisa que nós penamos em nomear, e que dever-se-ia chamar de “teatralidade”, no que diz respeito ao teatro, e outros termos equivalentes no que diz se refere ao concerto, ao museu... 

O próprio filme irremediavelmente reduzido à disponibilidade permanente da pequena tela e às plataformas da internet não aplaca nossa sede do cinema, de fato vem a aguilhoá-la no contexto dessa falta. E mesmo a leitura do romance, que melhor consegue, sem dúvida, cumprir a promessa feita pelo tempo suspenso, não pode se alimentar indefinidamente dessa suspensão; quando não nos resta mais que ela, quando passamos de livro em livro sem outra perspectiva além dessa passagem, o tempo recuperado se corrompe e mesmo se inverte: lemos “para passar o tempo”, distantes do ideal de se beneficiar dessa suspensão regeneradora.

Dentre todas as faltas, no domínio da cultura, que o confinamento agudiza, a falta do teatro vem, para mim, em primeiríssimo lugar. O teatro me faz falta. O que é então o teatro, para que ele assuma tal falta junto a mim?

Como e por quê o teatro me faz essa falta particular, dentre as demais faltas? Tentar compreender isso é talvez um caminho para compreender o que é o teatro, para melhor distinguir seus componentes e traços constitutivos, essenciais, melhor compreender o lugar e o papel do teatro na nossa existência e em nossas sociedades. É a esse exercício de pensamento que eu gostaria presentemente de convidar o leitor: a falta do teatro é a falta de quê?


Há todo tipo de teatro, de obras teatrais e de formas de “mise en scène” destas obras, todo tipo de experiências de teatro, boas ou ruins. Porém, na situação de falta que é aqui o fio condutor de nossa análise, é claramente ao melhor de nossa experiência teatral que essa falta nos envia. É essa, aliás, a razão pela qual essa falta pode ser um excelente e precioso “analisador”, se nós seguirmos longe o bastante os caminhos que ela nos abre.

Nesse sentido, nossa falta do teatro assinala para nós, em nossa experiência do teatro, o “melhor” do teatro; em nossa experiência de apreciadores do teatro, de espectadores, e não de praticantes. Este é o meu caso, e sem dúvida o caso da maior parte dentre os eventuais leitores deste texto. A experiência de um diretor, de um ator ou de um escritor de peças de teatro é outra; mas o que eles têm a dizer do teatro a partir dessa experiência não pode deixar de alimentar, aprofundar e iluminar nossa experiência de expectador.

A melhor definição desse tempo forte do teatro, em direção do qual sinaliza nossa falta do teatro, eu a localizo precisamente em texto de um espectador amante do teatro, e que se pretende espectador esclarecido, Guy Bruit. Há, escreve ele, “momentos de graça, momentos no curso dos quais o teatro se faz presente, com aquilo que ele é o único a poder nos oferecer” . Esses momentos de graça, momentos n curso dos quais o teatro, em sua natureza mais profunda, é literalmente revelado ao expectador exposto a ele, não deixam de evocar o que o grande diretor inglês Peter Brook chama de teatro sagrado.

Tal denominação não designa, para seu autor, que trouxe Shakespeare à cena como nenhum outro anteriormente, um gênero de teatro, mas a plena presença do teatro, o teatro em sua plena presença, quando ele se faz plenamente presente. E o teatro pode sê-lo, de forma semelhante, em Sófocles, em Racine, em Shakespeare ou em Tchekhov: “Édipo, Berenice, Hamlet ou As Três Irmãs”, escreve Peter Brook numa obra cujo título, já por si, O espaço vazio, evoca o teatro em sua aparição, seu surgimento, “encenados com amor e beleza, inflamam o espírito e lembram que se pode sair da monotonia quotidiana ”.

É por esta razão, esclarece ele, que teria sido possível denominar o teatro sagrado de “o teatro do invisível-tornado-visível”, formulação sem dúvida mais justa, mas sem o mérito da concisão. Se há de fato na experiência teatral do expectador, nesses momentos de graça, alguma coisa que transcende a experiência da vida, esta transcendência não diz absolutamente respeito a uma forma de misticismo.

O invisível que advém pelo teatro não é aquele de um outro mundo qualquer, mas a própria carne deste mundo tangível, cuja maior parte “escapa a nossos sentidos”, como bem sabemos e como reafirma Peter Brook. A evocação de Tchekhov, dessas Três irmãs que ele faz figurar ao lado de Édipo e de Hamlet, não deixa nenhuma dúvida: qual teatro, melhor que aquele de Tchekhov, tem o poder de esboçar escapadas profundas sem jamais se situar além da banalidade das vidas ordinárias? Peter Brook afirma isso com grande pertinência na breve descrição do dramaturgo em uma curta frase: “De fato, Tchekhov era um médico que, com doçura e com destreza infinita, sempre preservava a vida de camadas muito finas de tecidos.”

Ler o teatro. Teatro e literatura.

A experiência da falta do teatro permite então, se se deseja começar a analisá-la, tomar consciência de que há alguma coisa que apenas o teatro aporta; tal experiência nos permite igualmente pressentir que este aporte não é redutível a um passatempo que nos distanciaria e nos aliviaria, por certo tempo, do fardo e dos encargos da existência, ao nos permitir um esquecimento passageiro; se há, no teatro, uma dimensão de passatempo, se há vínculos com nossas existências, trata-se de um passatempo que exalta, amplifica, aprofunda nossas vidas.

Tudo isso permanece ainda excessivamente geral, sem dúvida. Seria desejável ir mais longe, e se perguntar: o que se faz presente quando teatro está presente 5 ? E ainda mais concretamente: quais são os elementos e condições dessa presença plena do teatro? Nessa experiência de pensamento pode ser prolongada e especificada interrogando-se os substitutos e os recursos com os quais tentamos nos consolar quando nos privamos do teatro, como o somos presentemente muitos de nós mundo afora.

Teria sido para amenizar esta falta que eu empreendi ler e reler um dos meus dramaturgos preferidos, Anton Tchekhov? Sim, sem dúvida, mas nessa iniciativa obtendo a confirmação de que o teatro, se ele é de fato um gênero literário, como estabelecem de saída todas as definições e teatro, não pode se contentar exclusivamente da voz interior do leitor, mesmo se este leitor pode, aqui e acolá, escutar ou mesmo adivinhar uma outra voz além da sua.

Quando lemos um romance, é de fato necessário que uma voz traga internamente o texto ao qual nossa leitura dá vida, mas nós teríamos dificuldade em identificá-la, e mesmo de escutá-la plenamente. Trata-se de uma voz que poderíamos chamar de silenciosa, mas silenciosa somente para aqueles que nos cercam, ou mesmo para nós próprios, se nos situamos no exterior de nossa leitura. Mas se permanecemos no interior de nossa leitura, uma voz efetivamente estará lá, simultaneamente anônima e íntima, vaga e precisa, com e sem timbre. Uma espécie de voz branca, da mesma forma que falamos de escrita branca.

Uma voz silenciosa, se ousamos dizer. Muito rapidamente, quando eu tento reencontrar o teatro através do texto onde estão inscritas minuciosamente todas as palavras e vírgulas que dizem os atores em cena, tornam-se patentes, tratando-se do universo teatral, a insuficiência e a inadequação da voz interior que me permitia dar vida a todo um mundo romanesco. A razão disso não podeser a multiplicidade de personagens: esta pode ser ainda mais abundante em um romance.

A dificuldade reside antes no fato de que todos os personagens do teatro estão inteiramente inscritos em suas falas e nos diálogos que os ligam uns aos outros, bem como no fato de que o próprio autor se exprime apenas e exclusivamente através das falas de seus personagens. Como o escreveu Marie-Claude Hubert em uma de suas obras especializadas que eu consulto à medida que avança minha reflexão, o que esta especialista universitária chama de “a opacidade do texto dramático” adviria “do fato de faltar ao dramaturgo o discurso comentador do romancista”. Com efeito, acrescenta ela, “sua escrita não é jamais subjetiva, toda confissão lhe é interditada”.


O leitor do texto de teatro

Certamente o leitor do texto de teatro se esforça, então, em “escutar” a pluralidade de vozes, em dar corporeidade, pelo menos à corporeidade vocal, aos personagens que ele sabe estar sob os signos escritos que ele decifra. Rapidamente tal esforço se configura como em vão. Sim, de tempos em tempos um dentre eles parece sem dúvida emergir do limbo onde permanece; mas essa outra voz nascente não é mais que um eco longínquo, um vago esboço do personagem que pena em tomar forma na leitura solitária.

O teatro só existe plenamente na palavra proferida pelos personagens que através dele se encarnam, na polifonia das palavras que eles trocam entre si e que lhes permite ser, na vibração e nos timbres de voz dos atores que os representam.

Tenho frequentemente prazer, ao sair do teatro, de ler e reler o texto da peça cuja representação acabei de assistir. Nessa leitura, com efeito, eu posso ainda e durante um certo tempo, escutar em mim a voz dos atores-personagens, seu timbre, seu fraseado, seu ritmo, sua respiração. De certo atores, pelo menos: a memória das vozes se mostra bem frágil e limitada, e se podemos reconhecer uma voz já escutada, escutá-la em si é uma outra coisa.

Como a arte do teatro, arte efêmera, a memória das vozes frequentemente se apaga bem depressa, e poucos dias bastam para que minha leitura não consiga mais a ressuscitá-las; e se eu me demoro a empreender tal leitura, eu abro o livro somente para constatar que tais vozes mergulharam de volta no silêncio.

Certas vozes, é verdade, resistem. Tendo escutado já há alguns anos Jeanne Moreau ler Histoire d’enfant , do escritor Peter Handke, eu escuto esse texto na voz de Jeanne Moreau em toda leitura que eu posso fazer atualmente dessa obra. Não se trata, certamente, de um texto de teatro, mas de uma narrativa: eu tenho certeza, contudo, que se eu decidisse a ler a peça do mesmo autor intitulada La chevauchée sur le lac de Constance, eu escutaria sob certas palavras escritas a voz de Jeanne Moreau, mesmo que eu não tivesse tido o privilégio de assistir à representação em que ela encarnou um dos personagens.

De forma semelhante, em minha leitura nos dias atuais do texto de La vie de Galiléede Berthold Brecht, me acontece de escutar ainda algo da voz de Roland Bertin que encarnou o sábio na montagem teatral de Antoine Vitez. Mas o mais frequente, uma vez que uma voz teatral sobrevive em nós, é que esta voz permaneça como uma espécie de depuração dela própria, algo como o equivalente sonoro de uma silhueta, seu contorno sonoro se assim podemos dizer, algo que distingue esta voz de qualquer outra, com relevo para a singularidade, o estilo, que persiste encontrando seu eco em nós.

É preciso então render-se à evidência: o texto teatral não passa de um esqueleto, uma ossatura, ou mais apropriadamente, como também escreveu Marie-Claude Hubert, “o texto, como tal, não passa de uma partitura”.

A comparação merece ser levada até o fim: ela é pertinente para o teatro, assim como para a música, para a teatralidade, em boa parte, assim como para a musicalidade. Muitos dos que receberam educação musical, por ocasião da aprendizagem de um instrumento, aprenderam a ler a música numa partitura, a “transcrever” essas notações em dedilhados, e a produzir, permitir escutar a música codificada; mas quantos escutam a música quando lêem uma partitura? Estes são muitos mais raros, e apenas estes são plenamente músicos.

Eu me lembro de um compositor convidado por uma emissora de rádio a quem se perguntou qual seria, para ele, a melhor interpretação de uma obra que ela estava prestes a escutar. Sua resposta ainda hoje impressiona o não-músico que eu sou: “é aquela, respondeu ele, que eu ouço assim que eu a leio na partitura”.

Maestro de orquestra musical

Sim, um maestro de orquestra musical ouve a sinfonia que ele dirige quando consulta a partitura sob seus olhos, e sua regência é portadora de todos os esforços que ele despende para obter dos músicos que ele rege aquilo mesmo que ele ouve.

Ocorre o mesmo em relação ao diretor teatral face a esta outra partitura que é o texto de teatro, e este diretor sente-se assegurado de ver, escutar, pressentir a peça no texto, muito mais do que o faria o amador e mesmo o amante do teatro.

O próprio leitor comum não consegue ler o texto teatral sem lançar mão implicitamente de rudimentos de encenação. Sem que ele, diretor, tenha disso consciência, ei-lo conduzido por uma espécie de necessidade inerente à leitura desse gênero literário que é o teatro, ei-lo engajado em um trabalho de elaboração, destinado a dar minimamente corpo, pelo menos por alguns toques, às imagens interiores que começam a se fazerem mundanas a partir do texto lido.

Ei-lo que começa a associar um timbre de voz, uma menção de gesto, a tal ou qual personagem; a lhe dar o esboço quase sem imagem de uma face; ou antes lhe dar a máscara própria deste personagem; a seguir as indicações cênicas, as marcações, em linguagem técnica, que são as únicas intervenções diretas do autor; a tentar imaginar os lugares, segundo as indicações de cenário consentidas pelo autor. No mais das vezes, contudo, essas marcações são notavelmente lacônicas: “ele entra”. “Ela sai”. “Tal personagem se junta a eles”. “Marina, bocejando”:”Risos, trocas de beijos, ruídos”.

Estas duas últimas marcações são retiradas do teatro de Tchekhov. As indicações de cenário deste autor, poder-se-ia imaginar, deveriam ser muito densas e detalhadas, tanto é forte a presença dos lugares, na imagem que conserva todo espectador que assistiu, nem que tenha sido uma única vez.

A cerejeira Não obstante, olhando-se de perto, a precisão inegável que o autor fornece é de fato aquela de um esboço, que não busca nada além de organizar as grandes linhas, as massas, os planos, as sombras e as luzes de um espaço-tempo ao mesmo tempo visual e sonoro, simultaneamente “real” e simbólico: “Um quarto que se continuava a chamar “quarto das crianças”. Uma das portas conduz ao quarto de Ania; chega a aurora; o sol vai em breve nascer.

O mês de maio, as cerejeiras j;a estão em flor, mas do lado de fora faz frio; friagem branca. As janelas estão fechadas.” É de fato dessa imagem que tenho em mente quando me lembro da montagem de A cerejeira, dirigida por Peter Brook, montada em Paris, no Teatro das Bouffes du Nord.

No entanto, nenhum cenário nesta montagem, eis que o Teatro das Bouffes du Nord é um teatro cujo interior desapareceu por inteiro devido a um incêndio, dos bastidores ao poleiro, permanecendo apenas uma estrutura de concreto e restos de gesso enegrecidos pelas chamas e pela fumaça! Tal é a magia do teatro, sua ilusão específica, e ao escolher este local desnudo para nele instalar seu trabalho, decidindo conservá-lo nesse estado, Peter Brook quer vincular-se a ele da forma mais aproximada possível.

Ele sabe que um mundo inteiro pode nascer de um simples círculo traçado sobre o chão desnudo. Eu posso, diz ele, “tomar não importa qual espaço vazio e chamá-lo de uma cena. Alguém atravessa esse espaço vazio enquanto outro alguém o observa, e isso é suficiente para que o ato teatral seja iniciado”.

É por esta razão que este diretor teatral, como alguns outros, não considera minimamente as marcações e as indicações de cenário como um guia de estrada, uma imagem pronta a reproduzir em três dimensões. Peter Brooke chega mesmo a julgar que “os melhores autores dramáticos são aqueles que menos se explicam”, e que eles assim procedem “como se soubessem que um acréscimo de indicações seria inútil”.

E ele conclui com uma reflexão que nos conduz ao coração da insuficiência do texto lido: estes autores, escreve ele, “se dão conta que o caminho que leva à verbalização de uma palavra passa por um processo paralelo ao processo original. Isso não pode ser nem evitado, nem simplificado.”

O corpo do teatro. Uma palavra poética encarnada et revelada Está, portanto, bem claro: o teatro somente se manifesta no que denominamos representação; quando ele é levado à cena por atores, face a um público. Ou ainda, como o dizia Molière em texto destinado ao leitor na abertura de O amor médico, “sabemos bem que as comédias são feitas exclusivamente para serem encenadas”. E ele prossegue sem esconder a insuficiência da leitura, aconselhando reservá-la “às pessoas que têm olhos para descobrir na leitura todo o jogo do teatro”.

O teatro

O teatro só se faz presente quando o escrito se faz carne, fôlego, se encarna no corpo de um comediante; o comediante, cuja carne e o sangue, como o diz Peter Brooke, são o instrumento d teatro. Nós vamos ao teatro para ouvir uma palavra autêntica, viva, encarnada. Sob o texto escrito, que a princípio não passa de um agregado de signos sobre o papel, latejam palavras, uma fala, que os signos apenas transcrevem e que o teatro em ato, a cada representação cada vez nova, arranca do reino do silêncio.

Nós vamos ao teatro para participar, através de nossa presença e nossa expectativa, à revelação de uma palavra poética, encarnada, aquelas de Shakespeare, de José Saramago, de Nelson Rodrigues, de Anton Tchekhov ou de Brecht, dentre tantas outras.

Para Peter Brooke, cujo intuito aqui poderia ser o mesmo de todo diretor de teatro que sabe que a essência mesma do teatro está em jogo em cada encenação, o texto de Shakespeare é a pista das palavras, mesmo “que ele quisesse que nós a disséssemos, palavras enquanto sons, emitidas por bocas humanas e para as quais timbre, pausa, ritmo e gestos são parte integrante do sentido”, palavras que são, cada uma das quais, “a pequena porção visível de todo um universo oculto”.

Privados do teatro como estamos atualmente, é com satisfação, em um primeiro momento, que muitos amantes do teatro, eu dentre eles, acolheram as iniciativas de algumas emissoras de televisão, de plataformas especializadas na internet, e mesmo de alguns teatros, no sentido de propor aos espectadores captações video grafadas de representações teatrais. Captação: o próprio termo poderia nos manter em alerta.

Claro, compreende-se o que o termo pretende significar, e que aqueles do teatro prezam particularmente, consistindo em compartilhar nestas imagens “captadas” nada além de um pouco dos rastros do efêmero.

O termo não deixa de abarcar, de um lado, a ideia de “captura”, de um teatro que poder-se-ia considerar vítima de uma contrafação, cativo da imagem, traído pelas imagens que lhes são roubadas, e de outro lado, o tema da “captação”, e mesmo do “desvio”, como se diz no caso da captação ou desvio de herança …

Mas queremos crer, esperar que vamos poder passar do texto do teatro à sua encenação! Rever, por exemplo, a representação de Rei Lear de Shakespeare, proposta por André Engel, ou descobrir na montagem de Catherine Hiegel, membro societário da prestigiosa Comédie Française, Le jeu de l’amour et du hasard de Marivaux, peça teatral em que o dramaturgo, no primeiro terço do século 18, no período da realeza francesa triunfante, sob o encobrimento da comédia, ataca as relações sociais de então ao inverter os papéis do patrão e do empregado.

A montagem

A montagem a que o espectador pode ter acesso graças à “captação” que é proposta por uma cadeia de televisão tem início com a cena de um empregado travestido em cintilante aparência de patrão, rodopiando e em cambalhotas diante de um casal suntuosamente vestido, uma jovem mulher com seios valorizados em seu vestido luminoso, um homem idoso, em botas e chapéu, a mão pousada sobre apoio de mão de bengala, com distinção e elegância.

Nós estamos, sem dúvida, do lado dos patrões. O banco de pedra sobre o qual eles estão sentados se encontra no início de vasto terraço com vista para os jardins e a fachada de um castelo. Na sequência, o diálogo que abre a peça entre esses dois personagens se inicia. Não evitemos nosso prazer.

Que felicidade ouvir elevarem-se as vozes de atores notáveis, descobrir personagens começando a tomar corpo por intermédio dos corpos desses atores, de ser tomado pela palavra poética quando ela inicia seu desabrochar. E esta luz imersa na qual banha a cena, os atores, a decoração dos interiores, a alusão provocativa aos costumes, como não tirar prazer dessa experiência? Mas... Mas bem depressa, a decepção vem, a expectativa é frustrada: o teatro esperado não comparece. No máximo, recebe-se um espetáculo captado, revestido da nostalgia de tudo o que lhe faz falta.

Esta experiência frustrante, que ilustro aqui a partir de uma experiência pessoal, todo amante do teatro a conhece, creio eu, e poderia agregar sua própria experiência. Pouco importa a peça teatral. O que está em questão, aqui, diz respeito a toda captação filmada. Nossa decepção tem, pelo menos, o mérito de relançar a reflexão: por que o teatro, e mais exatamente a teatralidade, se entendemos por esse termo a essência mesma do teatro, o que contribui para sua especificidade, por que essa teatralidade escapa às imagens que tentam restitui- la? De minha parte, disposto que eu estava a me abrir ao prazer que me prometia a captação do Jeu d l’amour eu du hasard, “bom público” por vontade própria, enfim, a decepção começou a dar seus primeiros sinais já a partir da cena de abertura ou do preâmbulo, aquela do empregado saltitante.

Por quê? Simplesmente porque teria sido necessário poder seguir a deambulação do olhar, com meu olhar, pois o personagem-empregado ia de um lado a outro da cena. Ora, este olhar, meu olhar, foi substituído por outro olhar: o olhar da câmera, que havia decidido acompanhar o movimento do empregado, deslizando com ele.

Esta breve panorâmica horizontal começava a me privar do engajamento de meu próprio corpo de espectador, primeiro momento da desencarnação em curso: os próprios personagens se tornavam progressivamente, eles próprios, imagens, mesmo que consideremos que algo da magia do teatro e da doação de si mesmos que fazem os atores e as atrizes de teatro aos personagens resistia e tentava de tempos em tempos retornar.

Progressivamente, numa captura [fílmico-televisiva – N.T.], o tornar-se imagem da carne do teatro se sobrepõe. Como é necessário que a câmera faça seu trabalho para permitir ao espectador ver, espectador cujo olhar ela substitui com seus meios próprios, eis que a câmera penetra o espaço teatral, o fraciona em planos, e, na crença ilusória que ela abarcará mais desse interno, substitui o bloco da presença encarnada que é o teatro pela linguagem cinematográfica e suas convenções.

Eis um “plano americano” para nos “aproximar” dos dois personagens que iniciam um diálogo, em seguida um “plano fechado”, quando não um grande plano, a fim de que vejamos “melhor” a surpresa e a emoção que se apoderam da jovem mulher e se inscrevem sobre o rosto da atriz. Eis que, contudo, a emoção que se nos deseja entregar “a domicílio”, sublinhando-a ostensivamente, torna-se impossível; eis que passamos a não ver mais que o exagero do grão de beleza sobre a face, aquela do rouge e da sombra de maquiagem sobre as maçãs do rosto. A ilusão teatral, em si mesma, se esvai: não se pode mais acreditar nela.

No pior teatro: a copresença carnal dos espectadores e dos atores dos casos, a captação enseja uma dupla desencarnação: aquela dos atores, e com esta, aquela de todo o universo que convoca o teatro e do qual ela é portadora: aquela dos próprios espectadores, despossuídos da parte que sempre lhes cabe, para que o teatro seja teatro.

Como o pior pode ter seu melhor, a captação indica no âmago do que lhe falta inelutavelmente o que pertence propriamente ao,que lhe é substancial. A representação teatral, segundo Peter Brook, “não é uma coisa em si: ele deve achar em cada espectador um eco particular.”

Acrescentemos que este eco, emocional e intelectual, passa pelo corpo. O corpo do espectador faz eco àquele dos atores. É preciso dizer mais uma vez aqui: o instrumento do teatro é antes de mais nada e carne e o sangue do ator. Não é à toa que falamos de “espetáculo vivo” para nos referirmos ao teatro. O adjetivo “vivo” deve ser tomado aqui em seu sentido primeiro.

Ele não diz apenas que o teatro é perecível porque se trata de uma arte efêmera - a dificuldade de uma captação no sentido de conservar algo desse espetáculo é disso testemunha - ele nos fala também acerca da relação essencial para nossas próprias vidas, sua necessidade vital como amplificação da vida. Como o escreveu Antonin Artaud com essa exaltação vital que percorre sua escrita, “o teatro é o único local do mundo e o último meio coletivo que nos resta de atingir diretamente o organismo”.

Aliás, nossas lembranças mais intensas de momentos teatrais não se configuram geralmente sob a forma de imagens, no sentido visual, sob a forma de quadros. Essas lembranças combinam uma boa parte de nossos sentidos e de nossa sensibilidade. Guy Bruit se recorda, nesse diapasão, de um grande momento de teatro que “abalava os nervos”, mesmo “no limite do suportável”. Tratava-se de uma criação de Ariane Mniuchkine, que se tornou legendária, 1793.

Na cena rememorada

Na cena rememorada via-se um grupo de mulheres preparando peças de tecido destinadas a servir de compressas para os feridos no front da guerra revolucionaria. O que aqui abalava os nervos? A conjunção de gestos, de palavras, e sobretudo de ruídos crescentes, sem cessar com a repetição intensificada e paroxística de gestos que pareciam sem fim; “o barulho, mais e mais lancinante e intenso, desses panos rasgados, que acompanhava as palavras”.

O teatro ;é simultaneamente “corpo-a-corpo” e “coração-a-coração”: donde a intensidade e a especificidade da emoção que ele nos permite compartilhar. Esta emoção se anuncia desde a presença física do ator ou da atriz. Certas montagens contemporâneas fazem a escolha de abandonar toda e qualquer cortina, qualquer fronteira entre a cena e a sala; algumas vezes, mesmo, o espectador, ao chegar, descobre o ator já no palco, ou em sua proximidade.

Eu devo confessar que então eu experimento um certo incômodo, um mal-estar difuso. Será que essa presença ameaça para mim a necessária ilusão teatral? Isso é sem dúvida e em parte exato: vou precisar de um certo tempo para que o ator e seu personagem habitem o mesmo corpo. GUY Bruit ressalta que entre o corpo do ator – “o corpo oferecido, este homem, esta mulher em sua totalidade” - e nós espectadores “se cria uma relação muito perturbadora e fascinante”. Tal relação se sustenta sobre a fragilidade do corpo do ator face a nós, que sabemos, e que acompanhamos.

Ela permanece latente sob o personagem, e faz pesar “uma incerteza sobre o que vai fazer o ator”. Esta fina análise se acrescenta à particularidade da ilusão teatral: nós temos “necessidade de crer nisso”, ou mesmo de fazer “como se acreditássemos nisso”, sem passar a ser bobos, e mesmo sem que se apague em nós a empatia que temos pelo ator, e que participa da emoção que nos fornece o teatro.

É por excelência sobre a face do ator que se inscreve a fragilidade do corpo como totalidade. Um plano aberto numa captação, pelo menos num primeiro momento, pode nos agredir como uma espécie de blasfêmia, como uma forma violenta de despudor. Mas bem rápido esta captação provoca o riso que decorre de um jogo que passa dos limites, desmedido, e a fragilidade do corpo se aproxima da paródia do grand guignol .

Como se a face se se ridicularizasse ao macaquear uma máscara. Na língua da Grécia, de onde nos vem o teatro, ???????,theatron , um mesmo vocábulo, ????????, prosôpon, serve para designar tanto a face quanto a máscara de teatro. Face, e máscara, trata-se da mesma coisa?

Absolutamente não. Segundo uma especialista sábia, Françoise Frontisi-Ducroux, esta particularidade lexical deve ser compreendida à luz do que se entende por face na cultura da Grécia antiga. Se em nossa cultura moderna, a face releva de interioridade, se ela abriga e “preserva, por trás da clausura das pálpebras, os segredos da vida interior”,para um grego da Atenas do século V antes de nossa era , “ela é o projetor ou o espelho de uma personalidade orientada para o exterior”.

Nisto se situam a magia do jogo teatral, e a intensidade próxima do sagrado da emoção, da qual a face nos concede uma graça: nesse deslizamento da interioridade mais íntima e mais profunda para a superfície oferecida aos olhares e à troca de olhares sobre o rosto do ator. O rosto, então, sem cessar de ser para nós este envelope íntimo, se faz máscara.

Como diz tão apropriadamente Guy Bruit , lembrando-se de uma interpretação da Nina de La Mouette de Tchekhov, por uma jovem bela e talentosa atriz: nesses momentos, a face “é em sua superfície única” toda a emoção do personagem, no caso, do “desespero de Nina, à beira da loucura”, e “é o olhar desta superfície que nossos olhos encontram”. Olhar: é precisamente ao que alude o termo “teatro” em sua etimologia grega, este theatron derivado do verbo theaomatai, que significa«olhar ».

O lugar do teatro

Devemos examinar aqui o que se apresenta sob a forma de um paradoxo, ou pelo menos de um dado contra-intuitivo: a necessária ilusão teatral se corrompe, e mesmo se desfaz, no “realismo” da captação filmada, na repetição da impressão de realidade cinematográfica que ela engendra.

O paradoxo, podemos agora compreendê-lo, é aparente: essa constatação nos coloca, contrariamente, o mais próximos possível da especificidade do teatro e da experiência que ele nos permite viver.

É um fato: basta um espaço vazio, sem outro cenário que paredes nuas, para tornar possível a ilusão teatral e nossa aquiescência feliz à sua convenção, ao passo que o realismo de um cenário destinado a nos dar a impressão de que estamos no início do terraço de um castelo -impressão multiplicada, deve-se insistir, pelos enquadres que isolam os personagens do espaço teatral e os reduzem a um mosaico destacado em outro plano - ao passo, então, que esse realismo insistente não para de impedir que se assuma a ilusão necessária.

Sim, repetimos aqui, um simples círculo, traçado mesmo de forma virtual por um simples gesto no espaço, basta ao espectador para que a lha de L’île aux esclaves 13 de Marivaux se faça presente, para que as armadilhas e perigos da noite espreitem para além desse limite, para que La tempêtede Shakespeare nos impregne de seu clima. Peter Brook, ainda decididamente muito precioso: “Eu posso considerar não importa qual espaço vazio e denominá-lo cena. Alguém atravessa esse espaço vazio , enquanto que outro alguém o observa, e isso é suficiente para que o ato teatral seja iniciado.”

Pode parecer curioso que o teatro seja definido como um espaço vazio, e mesmo como o espaço vazio como tal. Com efeito, temos ainda o hábito de associar a ideia do teatro à imagem de um prédio suntuoso, de prestígio, guarnecido do vermelho dos veludos e do ouro de seus balcões; e esta imagem intimida aqueles que não têm familiaridade com este mundo, e os envia a um lugar e a rituais separados e reservados, a um mundo que não é o deles.

Nós esquecemos (ou ignoramos) que o teatro elisabetano do tempo de Shakespeare viu multiplicarem-se salas na periferia próxima de Londres, e que os Shakespeare, Ben Johnson ou John Fletcher escreviam tanto para a elite aristocrática quanto para o povo mais simples.

A forma cilíndrica do teatro elisabetano lembra o circo das arenas onde se desenrolavam os muito populares combates de animais. Os grupos de atores improvisavam nesses espaços seus cavaletes, e ofereciam seus espetáculos antes da criação de espaços permanentes, como faziam nas granjas, nos quintais de albergues e mesmo de escolas, além de outros espaços públicos abertos. Tais espaços prolongaram o espírito popular dos locais externos até o advento do recinto fechado dos teatros permanentes.

Os encenadores do século XX que decidiram abandonar o ouro e os veludos do teatro do século precedente buscavam sem dúvida reviver esse espírito popular, ressuscitando mesmo o teatro ambulante.

Na França

Na França, uma instituição cultural como Les Tréteaux de France 14 , dirigida por pelo ator e encenador Robin Renucci, perpetua esse intento. Não se trata, contudo, de um retorno ao passado. Bem ao contrário, este movimento se insere em movimento vanguardista.

Voltando à questão dos lugares, do teatro como lugar, as pessoas vinculadas ao teatro iniciaram uma pesquisa que se poderia comparar àquela dos pintores entre os séculos XIX e XX, buscando recuperar uma modalidade de arte da qual as injunções figurativas e sociais haviam sido minimizadas pela fotografia, relançando e reencontrando o caminho das fontes profundas, dos elementos constitutivos que são o gesto, as cores, o traço, a superfície, o espaço pictórico.

O espaço vazio do teatro, o vazio do espaço através do qual o teatro começa e recomeça incessantemente, busca abrir espaço, todo espaço, para o desabrochar encarnado da palavra poética, para a troca de olhares orquestrados pela pulsão orgânica, para a ilusão de que não somos jamais ingênuos, mas à qual aderimos pela promessa de uma experiência compartilhada de ultrapassagem do cotidiano, hic et nunc.

Em termos filosóficos, poder-se-ia falar de uma experiência de transcendência no seio mesmo da imanência: em termos políticos, podemos propor que o espaço vazio do teatro é a condição da reunião e de uma comunicação autêntica.

O que é esse “espaço vazio” que se deve preencher, pergunta-se Peter Brook em sua obra epônima ? Significativamente, este autor tenta responder aludindo ao que o espaço vazio não é: ele é, diz o autor, alguma coisa que os indivíduos “não encontram nem na rua, nem em suas casas, nem no bistrô, nem na amizade, nem no divã do psicanalista, e muito menos na igreja ou no cinema”.

Emmanuel Kant via no acordo entre os homens a condição que permitiria, segundo ele, o julgamento compartilhado, o senso estético e a prefiguração de uma sociedade reconciliada. O teatro dá corpo a esta prefiguração, ressaltando adicionalmente que o acordo no seio de uma sociedade política viva não ode prescindir do debate e do dissenso: o espaço vazio do teatro e a ilusão teatral que pode se pôr em marcha tão logo essa ilusão se instale se alimentam da reunião de um público unido pela emoção compartilhada, mas igualmente pelo distanciamento reflexivo de cada um.

Privados da possibilidade de atuar e de ir ao encontro do público tão logo um confinamento drástico decidiu pelo fechamento das portas dos teatros, considerados com “não-essenciais”, face a esse dado político extraordinário, alguns grupos teatrais haviam decidido, mesmo ameaçado, como forma de resposta, encenar em lugares públicos: os pavilhões das estações férreas, as entradas de fábricas e dos templos de consumo que são os grandes centros comerciais…

As condições criadas pela extensão da pandemia não permitiram, infelizmente, dar continuidade a essa resposta. Que ela tenha sido proposta, contudo, é indício da natureza profundamente política do lugar da arte teatral.

A questão sempre retomada do lugar, de um outro lugar, um dos pontos nevrálgicos do teatro contemporâneo, como se o lugar ideal do encontro com o público e do desenvolvimento da palavra política estivessem ainda a encontrar, esta questão participa da função política do teatro, inscrita em sua forma artística mesma.

Jean Vilar, apropriando-se do imenso espaço vazio da Cour du Palais des Papes em Avignon, lugar altamente simbólico do poder eclesiástico e político na Europa, para nesse espaço dar vida ao que ele denominou teatro popular, ilustrou esse ponto indelevelmente. Ainda hoje, mais de setenta anos após a criação do Festival Internacional de Avignon, sem dúvida a mais importante manifestação teatral do mundo, o florescimento da palavra poética no espaço do Pátio de Honra do Palácio dos Papas permanece como emblema insubstituível dessa função política do teatro, e para o público imenso que tem a felicidade de se reunir nesse evento durante uma noite de verão, uma experiência sem igual.

O teatro como reunião. Entre comunhão e cidadania Pois é necessário aludir a este ponto: sem o encontro com o público, o teatro, arte viva, arte efêmera, não pode se fazer presente. O que falta quando o teatro falta é, no final das contas, para os atores e para o encenador, a realização do teatro no encontro com o público; e para o próprio espectador, a experiência de fazer corpo com um público.

Um escrito, no extremo, pode considerar seu trabalho como realizado quando o manuscrito é concluído, no sentido de quea própria escrita desse texto se alimentou da ostulação de um leitor potencial. Mesmo um pintor, também aqui em termos extremos, pode pelo menos esperar contar com o olhar que destinará às suas telas aqueles mais próximos do primeiro círculo de reconhecimento, amigos, confrades..

. Para aqueles do teatro - como sem dúvida aqueles da dança, outra arte viva e efêmera - expor aos demais o trabalho mesmo considerado “terminado” não significa estar enfim face ao trabalho “concluído”.

Esta conclusão somente adviria da presença ativa do público. Este termo “conclusão” deve ser aqui entendido em toda a sua extensão: o termo de um movimento, uma realização, mas sobretudo uma completude. O público é, dessa maneira, a parte necessária para que o teatro seja plenamente ele mesmo.

Todos aqueles vinculados ao teatro o dizem e o vivem, dos atores e do encenador ao conjunto de técnicos que compartilham, juntos, cada encenação. O espectador, por sua vez, vive igualmente isso a partir de sua poltrona. Se for o caso de fazer apelo a uma lembrança de experiência teatral que ilustra o ponto aludido acima, se impõe de imediato a lembrança de uma encenação de Tambours sur la Digue peça teatral da escritora e dramaturga francesa Hélène Cixous, na montagem de Ariane Mnouchkine.

Em primeiro lugar, o local da encenação. O teatro de Ariane Mnouchkine abarca locais diversos, interiores e exteriores. Ela constrói nestes locais, então, sua plataforma de cena, e os lances de arquibancadas onde se instalarão os espectadores. Nesta ocasião, o dispositivo havia sido instalado na grande área central de um conjunto importante de prédios históricos da cidade de Lyon, Les Subsistances, que haviam anteriormente sido um convento, depois um prédio militar, reconvertido presentemente em centro cultural.

A encenação teve então lugar ao ar livre, em fim de verão, talvez mesmo no início do outono. Para se proteger do provável frio da noite, portanto por precaução - mas também para fazer parte de uma espécie de ritual - os atores e o pessoal técnico de apoio propuseram aos espectadores utilizar, durante o espetáculo, uma coberta quente, de cor caqui, como de hábito em material militar.

A peça, Tambours sur la digue, é uma obra teatral poética e política, em forma de conto. Eminentemente política: a história que ela conta se passa numa Ásia imaginária, mas ecoa fortes inundações que haviam atingido a China em 1998; ela ilustra a luta do povo para tentar sobreviver face às manobras de um poder corrputo, pronto a sacrificar algumas cidades por seus próprios interesses.

A montagem repousa sobre a manipulação, por atores ocultos na sombra, de marionetes em primeiro plano, que se misturam com personagens em “carne e osso”. Profundamente encantador, o espetáculo literalmente gruda o espectador em seu assento pela emoção.

Naquela noite

Naquela noite, eu me senti total ente tomado pela magia da ilusão teatral. “Eu”? Sim, aquela emoção era minha. Mas eu devo igualmente, ou mesmo prioritariamente, dizer “nós”: a intensidade da escuta, os olhares dos quais o meu fazia parte, a extensão e a espessura do silêncio no qual se refugiava o meu próprio, a sensação de meu próprio corpo em meio aos outros corpos, tudo isso participava de fato de um “nós”.

Eu tomei subitamente consciência de tudo isso porque eu havia, por um breve instante, posto os olhos sobre o público instalado nas arquibancadas situadas sob a minha. O frescor da noite se havia imposto, e todos estavam abrigados em suas cobertas de socorro. E de súbito eu tive essa visão: “nós” não formávamos mais que um corpo, assij unidos sob uma cor uniforme, mas um corpo dotado de centenas de cabeças!

Esta imagem ainda viva permanece para mim o símbolo mesmo do teatro: uma unidade emocional que reúne e une profundamente uma multidão de desconhecidos, mas que preserva da fusão a multiplicidade de “cabeças”, símbolo de uma diversidade cognitiva lembrando que o teatro se dirige igualmente à inteligência de cada um, à necessidade de cada um compreender, e que o famoso distanciamento brechtiano é inerente ao teatro ao mesmo título que a emoção, da qual somente ele, o teatro com seus meios, nos possibilita a graça.

Compreender, dizia Brecht, é o maior prazer da humanidade. Sim, o teatro é também o prazer da inteligência. Ao efeito de “distanciamento”, Vitez preferia falar de “estranheza”. Pouco importa o termo. O importante diz respeito a este poder do teatro, por seus meios próprios, de nos “dar a pensar”, e mesmo nos provocar a pensar, na medida em que o teatro nos conduz a ver diversamente, a olhar diversamente, como se fosse pela primeira vez, aquilo que nós nem percebemos mais.

A imagem do corpo unificado sob múltiplas cabeças me parece assim trazer uma iluminação preciosa para, talvez, melhor formular uma preocupação legítima e que é talvez como a cruz das “pessoas de cultura”. O teatro quer ser para todo mundo.

Mas nem todo mundo vai ao teatro. Pior ainda, a cerimônia do teatro permanece reservada a poucos, e sempre os mesmos. Fomo vamos fazer para que o teatro seja teatro de todos? Qual é o caminho adequado da democratização? Como tornar o teatro plenamente popular? A questão pode ser colocada de forma mais radical: como abrir o teatro ao povo, como “devolver” o teatro ao povo?

Eu me recordo da resposta que havia sido fornecida, no curso de um de seus debates, que fazem também parte da vida do teatro, um amigo sociólogo, especialista em teatro, Emmanuel Wallon. O « povo », ele dizia em substância, esta entidade o mais frequentemente não-encontrável, não existe sem o tempo e os lugares que contribuem a fazê-lo existir. Assim, o “povo” não preexiste ao teatro, e é por isso que que é vão pretender “ir procurá-lo”. É preciso raciocinar de forma inversa: é o teatro que faz que o povo, em certos momentos, exista.

É a representação teatral que faz que, sob a unidade emocional de um “mesmo” corpo de homens e mulheres de todas as origens e de todos os status sociais, o médico ao lado do empregado de banco, são interpelados individualmente, mas juntos, conduzidos a pensar sem dúvida diferentemente, mas numa comunidade emocional e intelectual. O teatro é nesse sentido uma ferramenta poderosa de educação política para a democracia a pela democracia.

E é um dever para os poderes na democracia, permitir ao taro ser esta ferramenta, simplesmente permitindo-lhe ser ele mesmo, ser tudo o que ele pode ser: jogo, cerimônia, símbolo.

O jogo, no sentido antropológico do termo, advém de todos os lugares onde a vida viceja em excesso. O jogo, como o diz de forma bela Gadamer, é um excedente da vida. É a vida que transborda e que quer se olhar nesse transbordamento.

A cerimônia, nesse mesmo espírito, é antes de tudo a suspensão do tempo do engajamento cotidiano, de forma a “ter tempo” para despender com os seres, com as coisas, com as aparências. O espaço vazio necessário ao teatro pode ser qualificado de espaço-tempo. Todas as sociedades humanas, todas as culturas fazem a gestão desse tempo em que o tempo “gasto” pode se regenerar. O teatro preserva e amplifica, quanto a isso, uma das fontes mais preciosas que permanecem em nossa cultura, e mesmo, sob formas diversas, em todas as culturas: em linguagem filosófica, poder-se-ia aqui encontrar um belo exemplo de “universo singular”.

O símbolo, por si só, poderia enfim dizer o essencial acerca do teatro. O termo, cimefeito, em sua etimologia, ????????, symbolon, envia a uma tradição de hospitalidade na Grécia antiga. Quando se recebia e hospedava um hóspede, no momento em que ele deixava seu domicílio você deveria quebrar em duas uma xícara, fragmentos da hospitalidade. O hóspede levaria com ele uma das metades, você, anfitrião, guardaria a outra.

Se no futuro, você próprio, ou um de seus descendentes, se apresentasse à porta daquela que havia sido seu anfitrião, você poderia mostra-lhe sua meia xícara: se ele tivesse à mão sua metade de xicara, mesmo herdada de um parente, a totalidade estaria restituída. A hospitalidade poderia ser retribuída. O símbolo é, portanto, o que reúne.

Nesse sentido, o teatro é símbolo duplamente: inacabado sem o complemento do público, certamente, mas este público, em si, não faz corpo como povo potencial a não ser através dele, o teatro.

Para concluir

Eu teria claramente podido iniciar minha exploração das faltas ressentidas, na condição de privação do teatro, em que me encontro ainda no momento em que escrevo essas linhas, mencionando os primeiros prazeres que eu aspiro reencontrar assim que as portas do teatro se reabrirem, e assim que o teatro tenha reconquistado seu lugar no coração de uma vida social aberta sobre o mundo e sobre os outros: o prazer do jantar compartilhado no restaurante próximo antes ou depois da apresentação, tendo ao fundo o rumor dos sons das louças e do serviço; a multidão que se aperta e se cruza no hall e nos corredores, as faces sobre as quais a expectativa do espetáculo é legível como pode sê-lo aq esera de um prazer prometido sobre a face de uma criança; o silêncio que se fará quando a cortina se erguerá; o compartilhamento do divertissement que é sempre e indissociavelmente o teatro, mesmo o mais circunspecto; a taça levantada no bar do teatro, no entreato, em meio a espectadores apressados; no final do espetáculo, a descida das escadas a rua reencontrada, em meio a uma multidão ainda dividida entre o silêncio que prolonga o espetáculo e a necessidade de falar sobre ele...

Eu poderia ter começado desse ponto, pois esses prazeres, pois esses prazeres se situam entre os primeiros: mas ao risco de banalizá-los e de perder de vista o sentido profundo. Eu sei presentemente, com efeito, que esses prazeres não são periféricos ao que seria o teatro em sua essência, mas que são também o teatro. Mais exatamente, eu compreendo melhor, presentemente, que o ritual do restaurante e do café se insere na ordem da cerimônia, do jogo e do símbolo, e que se o teatro traz em si, nos termos mais elevados, estes invariantes antropológico, ele. faz em testemunho da continuidade da cultura.

Este homem de teatro visionário que foi Anatoli Vassiliev dizia sonhar com um teatro abandonado, completamente abandonado, talvez no coração de uma floresta; ele o imaginava mesmo invadido pela hera, batido pelos ventos e pela chuva, perdido em meio à bruma, inacessível. Ele imaginava que um dia, personagens fugidos de uma peça de Pirandello lá iriam se instalar, e começariam a encenar, continuariam a encenar, até que o público chegasse. Pois o público necessariamente viria. Desmedido? Eu quero crer nessa bela e fecunda utopia.

Uma última coisa, contudo. Eu não duvido que o leitor brasileiro ou português bem poderia desconhecer todas as obras, as encenações e os dramaturgos sobre os quais me apoiei aqui. Tudo isso, com efeito, participa da minha cultura e experiência teatrais, aquela de um francês, de um europeu, cidadão não obstante de um mundo cultural que se pretende sem fronteiras. Mas eu não duvido que o leitor lusófono terá agregado a este texto suas próprias experiências, e que ele terá achado mais de um eco em relação às minhas. Eis aqui, sem dúvida, uma última lição sobre a qual meditar: universal, apesar de sempre singular, singular porque universal, eis o teatro.

Alain Kerlan é da (Universidade de Lyon II-Louis Lumière)

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