
Cultura, Sobre a Diversidade de um conceito – 25 - Cultura Pernambucana Por Emanoel Correia
30/07/2025 -
Esta palavra mágica “CULTURA” vem de muito longe, atravessa o tempo, extrapola limites, redescobre personagens e discute momentos sociais e políticos. Porém cada lugar tem a sua particularidade cultural que identifica o seu povo, nos seus hábitos, costumes e culinária. Pernambuco não foi diferente dos demais, teve as suas influências europeias, judaicas e mulçumanas, que pesou muito na formação do povo de Casa Forte, ou povo mameluco das terras dos bravos guerreiros.
A sua cultura é vasta, e porque não dizer única no país, pois se entrarmos, nos pormenores de como se formou culturalmente este povo brasileiro, veremos que existe um peso muito grande de influência do Estado sobre a criação cultural do país.
Na cultura pernambucana, é possível encontrarmos de tudo que se possa imaginar, desde histórias que fizeram e forjaram o estado de Pernambuco até a sua contribuição na formação da identidade da república brasileira.
Mas aonde começa a nossa história e onde nasce a nossa cultura? Pernambuco existe desde os primórdios da descoberta do Brasil, foi uma das capitanias que mais deram lucros ao governo português e a mais problemática politicamente. Mas é daí que se cria um povo alegre, altivo e criativo em que tudo faz, correndo pelas suas veias o sangue de várias culturas que influenciaram nessa criatividade tão espontânea e rica em valores locais.
E como seria falar da sua cultura, sem antes não lembrar os fatores do passado que contribuíram para sua formação, passe o tempo, passe as gerações a sua cultura de raiz resiste e é forte dentro de cada pernambucano. Assim sendo faremos uma viagem pelo mundo criativo cultural pernambucano mostrando desde o popular ao seu patrimônio material e imaterial.
Realizamo-nos como Estado a partir de 06 de março de 1817, daí em diante a história se encarregaria de contar para outras gerações o quanto de riqueza temos para oferecer aos nativos e para quem chega para conhecer.
Se for na música, temos vários ritmos, que se perpetuam no tempo, como: o “FREVO”, sendo uma das manifestações que mexem com o povo pernambucano e que como patrimônio imaterial, foi citado no “Jornal o Pequeno” pela primeira vez em 1912.
Arrasta multidões, ferve no sangue do seu povo, e encanta a quem escuta as músicas de Capiba, Maestro Duda, Maestro Nelson Ferreira, Maestro Spok e outros, com os seus tipos de gêneros, como: frevo de bloco, frevo canção e o frevo de rua que se subdivide em ventania, coqueiro e abafo. E ainda temos os Papangus de Bezerros e os Caretas de
Triunfo que completam o nosso carnaval. Não se esquecendo do famoso e saudoso Nascimento do Passo e seus frutos, os Guerreiros do Passo. Em Olinda, não existe dia e noite, semanas, meses e ano.
Carnaval é o ano todo<\b>
O carnaval é o ano todo. O maracatu, que hoje podemos encontrar por todo país e fora dele, pois alcançou horizontes mundo afora. Mas é necessário diferenciar o maracatu rural, maracatu naçãodos grupos de batuqueiros, pois são realidades totalmente diferentes. Como assim?
O maracatu rural ou chamado de baque solto vem da Zona da Mata com os seus caboclos de lança paramentados e suas loas que ditam o ritmo ao brinquedo. Já o maracatu nação ou baque virado, podemos citar o maracatu Elefante/1800 (este maracatu não existe mais a pedido da sua grande rainha Dona Santa, e seus adereços foram doados para o Museu do Homem do Nordeste/FJN) e Nação Porto Rico/1916 esses como nação possuem o sincretismo religioso ligado a um terreiro e obedece a todo um ritual Afro-brasileiro com um cortejo com representação de rei, rainha, vassalos e etc.
Enquanto o grupo de batuqueiros apenas executam toques de percussão por divertimento. No forrótemos outra manifestação muito difundida que engloba as quadrilhas juninas, herança europeia que se incorporou à nossa cultura. Neste segmento existem muitos destaques tanto na música cantada como na instrumental, como: Luiz Gonzaga, Dominguinhos, Jackson do Pandeiro, Arlindo dos 8 Baixos, Mestre Camarão, Heleno dos 8 Baixos e sem deixar de falar em Petrúcio Amorim, Marciel Melo, Elba Ramalho, Flávio José, Flávio Leandro, Targino Gondim, Alceu Valença, Geraldo Azevedo e outros.
Na ciranda não esqueçamos Lia de Itamaracá, Mestre Baracho e outros. No Cavalo Marinho Mestre Zé de Bibi, no Mamulengo Mestre Bila. O Coco de Roda com Dona Selma do Coco, Cila do Coco e Dona Glorinha do Coco.
Nos caboclinhos o destaque vai para Sete Flechas e Carijós. Mais atual encontramos o movimento “Mangue Beat” que ultrapassou as barreiras do Estado indo parar pela Europa e EUA, onde o seu maior divulgador foi Chico Science e a Nação Zumbi. E na poesia e escrita temos grandes nomes, como: Antônio Maria, Ascenso Ferreira, Joaquim Cardoso, João Cabral de Melo Neto, Manuel Bandeira, Nelson Rodrigues, Gilberto Freyre e também o nosso patrono da educação Paulo Freire. Na xilogravura Mestre J. Borges e seus filhos.
No repente Ivanildo Vilanova, Zeto, Antônio Lisboa e outros. Nos causos, Chico Pedrosa, Marcos Passos e outros.
Se é na arquitetura criamos o cobogó, ou como o popular chama de combogó, ideia do português Amadeu Oliveira Coimbra, do alemão Ernest August Boeckmann e do engenheiro pernambucano Antônio de Góis.
Todos radicados no Estado, e assim surge o elemento vazado que faz sucesso até hoje. Nos prédios de construções centenárias é possível apreciar diversos estilos que passam pelo: Clássico, Neoclássico, Serraceno e Artdeco. E ainda possuímos a rua mais bonita do Brasil e a terceira mais bonita do mundo, a Rua do Bom Jesus que já teve tantos nomes, como: Rua da Cruz, Rua do Comércio, Rua do Bode e Rua dos Judeus. E por falar em judeus, ali existe a Sinagoga “Kahal Zur Israel” (rocha de Israel) mais antiga das Américas, e dali partiram os judeus que com outros do resto do mundo vieram a fundar a cidade de New York/EUA em 1654.
Pois é dentro deste universo acima, que encontramos do popular ao mais bem elaborado folguedo ou construção, e que podemos imaginar o quanto é grande a nossa cultura.
Mundo cultural
Este mundo cultural não para por aqui, ele se estende pela culinária, que faz do local o destaque para o bolo Souza Leão e o bolo de rolo, iguarias da nossa cozinha e que hoje são patrimônios do povo pernambucano e atravessam fronteiras pelo seu sabor inigualável, e tudo fruto de um tempo passado que perpetuou em nossas gerações o sabor quer seja da tapioca, sarapatel e a tão desejada nossa buchada. E faltou mencionar o queijo de coalho assado com o mel de engenho, deu água na boca? E a cartola! Huuum!, só de pensar a vontade é grande de saborear.
E na história, nos destacamos pela vinda de Maurício de Nassau e suas ideias mirabolantes de modernizar a cidade Maurícia, e a construção da primeira ponte da América Latina onde ele fez o boi Melchior voar, e arrecadou fundos para terminá-la.
Pelas duas guerras travadas contra os holandeses, uma em 1648 e a outra em 1649, que culminou com a criação da nossa pátria e a formação do exército brasileiro, onde se destacaram: João Fernandes Vieira, Felipe Camarão, André Vidal de Negreiros, Henrique Dias e Francisco Barreto de Menezes, tem ainda na conta as duas revoluções — a de 1817, chamada de “Revolução dos Padres” e a de 1824 “Confederação do Equador”, onde passamos a ser uma nação por 70 dias, totalmente independente do governo imperial. E aí destacamos os nossos heróis como: Frei Caneca, Vigário Tenório, Cruz Cabugá, Barros Lima e outros.
Patrimônio físico
No seu patrimônio físico, podemos encontrar prédios que hoje são destaques na arquitetura nacional e mundial como: o Teatro de Santa Isabel, Teatro Apolo, Palácio do Campo das Princesas, o casario da Rua Benfica, o Quartel do Derby, o Mercado de São José, Forte do Brum, Forte das Cinco Pontas, Ruínas do Forte do Picão, o Arquivo Público, a Cruz do Patrão às margens do encontro dos rios Capibaribe e Beberibe, as igrejas e etc.
Embora o Estado tenha sofrido perdas irreparáveis de monumentos únicos que tiraram muito da sua beleza. Como os arcos: do Bom Jesus, da Conceição e de Santo Antônio, a derrubada do casario e da igreja do Espírito Santo no Cais da lingueta, atual Bairro do Recife em 1909. E sem falar mais recentemente, nos anos de 1970 na destruição da história que existia no Bairro de Santo Antônio e São José, com a demolição de casarões históricos e igrejas centenárias para dá lugar a coisa alguma.
Se o Recife hoje não tem o título de patrimônio mundial da humanidade, cabe a cidade de Olinda salvaguardar esse título. Ficam aqui os nossos agradecimentos às mentes fechadas que confundem modernidade com derrubada do patrimônio histórico de um povo. E assim perdemos um pouco de nossa identidade.
Então chegamos a uma cultura muito divulgada no mundo todo e que também faz parte da nossa, o terror. E Pernambuco é considerada a capital brasileira da assombração, pois isto não é de hoje, que nos diga o “Mestre Gilberto Freyre” em seu famoso livro: Assombrações do Recife Velho/1974 e “História do Além” (J Austragésilo) programa que ia ao ar na Rádio Clube de Pernambuco nos anos de 1970 a 1980.
Pois bem! A tudo isso só tem a comemorar, pela criatividade ao qual somos capazes de executar, pelo amor que temos por fazermos parte dessa cultura, o orgulho de sermos únicos no país a ter tão diversificada e bonita cultura popular, a amplitude de nos orgulharmos de tudo que fazemos, e levar no peito o refrão de sempre sermos o primeiro, o melhor e único em tudo que temos. Não é bairrismo, é verdade.
Não fazemos as coisas por querer, fazemos por uma identidade própria, fazemos por uma história, pelo um patrimônio, pela beleza e pelo amor que temos ao Estado e suas cidades.
Cultura é isto, cresce no povo, identifica um povo e volta para o povo mais lapidado ainda e cabe a ele levar longe, mais muito longe a cultura, e principalmente nós que somos felizardos pela mistura dessas raças: negros, brancos e índios. Que nos levaram a criar ritmos que hoje desbravam o mundo, correndo lugares longínquos para emoldurar esta nação chamada de Pernambuco.
Uma questão de necessidade
Defender esta Cultura Pernambucana passou a ser uma questão de necessidade, de amor, de preservação, que nos faz refletir de como não amar um tão rico acervo material e imaterial. Como não se apaixonar pelos seus folguedos, culinárias, música e lendas.
A tudo isso é preciso mais que paixão, é preciso apoio, é preciso sensibilidade e responsabilidade. É um patrimônio rico e incontestável que necessita de um olhar diferenciado e constante, para toda a sua sobrevivência atual e futura de gerações que virão.
Emanoel Correia é Produtor cultural e fundador da ONG Preservar Pernambuco