
O pagode russo da eleição para prefeito do Recife em 1985, por Natanael Sarmento*
02/08/2025 -
Depois de 21 anos de ditatura militar, inicia-se a “redemocratização” resultante de lutas e clamor social pela democracia, selado no rearranjo político pelo alto, do “Colégio Eleitoral”. Partidos e pessoas buscam lugar nas ribaltas eleitorais de campanhas eleiçoeiras milionárias.
A tática comunista
O PCB decide colocar o bloco na rua. Mostrar o rosto à sociedade depois de 38 anos de ilegalidade. Apresentar um programa avançado que correspondesse aos interesses do povo. Mobilizar e crescer e crescer o partido. Lançou Roberto Freire que obteve 2% dos votos. Sequer convertido em salto organizativo e de crescimento partidário.
O candidato
Detinha mandato de deputado federal. Com histórico de combatividade no parlamento. Destaque da bancada dos “autênticos” do MDB. Denunciava os crimes e a corrupção da ditadura. Defendia eleições diretas e convocação da Constituinte. Reforma agrária e direito de trabalhadores. Atuante. As ligações e apoios dos comunistas do PCB rendeu-lhe a pecha de “agente de Moscou” dada pela direita e CCC. Referência da esquerda. Tribuno loquaz. Hábil negociador. Admirado. Havido como visionário pelos seus admiradores e seguidores.
O PCB é legalizado na “Nova República” em 1985.
O deputado Roberto Freire assume a legenda da foice e martelo. Disputa pelo PCB: prefeitura Recife 1985. Deputado Constituinte 1986 –líder da bancada de 3 deputados – e presidência da República, 1989. A partir daí,
trajetória reescrita e modificada. Radicalmente. O Roberto Freire queimado como “agente de Moscou” passa à queimação de “agente da CIA”. O parlamentar combativo e visionário passa a ser considerado oportunista e traidor. Como se deu a metamorfose?
Talvez explicável com ajuda da crítica da economia política de Marx e a psicanálise de Freud. Assunto para outra crônica.
Resultado de 1985
Jarbas (PSB), 35,19% dos votos. Sergio Murilo (PMDB/PFL), 29,46. A popular cafonice da distribuição de rosas despolitizada do Coelho, 23,39% dos votos. Lucena(PDC) 8%. A esquerda ideológica esmagada na moenda do “voto útil” votação pífia: Roberto(PCB), 2,32% e Bruno(PT), 1,11%.
O pagode
Poucos militantes. Parcos recursos. A campanha do PCB respirava por aparelhos. “Aliados”, debandavam. A militância, amofinava. O comitê eleitoral convoca um grande final. Agitação e panfletagem na orla de Boa Viagem, no último domingo da campanha. Juntamos bandeiras, pirulitos, santinhos e panfletos todo material da campanha. Convocamos o “exército” para concentrar na frente da padaria da orla marítima, 9:00 horas. A Bandinha e meia dúzia de militantes comparecem. Esperam engrossar o caldo para dar saída. O caldo não engrossa. Espera vã. O músico pergunta: “algum pedido musical? Automaticamente dizemos: - “ Sabe tocar o hino da internacional comunista?”.
A bandinha disse que sabia e mandou ver: “Ontem eu sonhei que estava em Moscou/ Dançando um pagode russo na boate Kossacou".
*Natanael Sarmento é professor e escritor. Do diretório nacional do partido Unidade Popular Pelo Socialismo.
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