
Folhetim - O Fantasma do Capibaribe - Final
16/08/2025 -
Por Zé da Flauta*
No capítulo anterior…
Clara entrou no prédio, mas saiu diferente: olhos imóveis, sorriso congelado e um rosto que parecia derreter.
Testemunhas a viram caminhar até desaparecer no prédio novamente, como fumaça.
Na delegacia, o reflexo de Isaac sorria no espelho… enquanto ele batia na porta do lado de fora.
Capítulo final - A noite dos invisíveis
O Recife entrou em colapso emocional. O comércio começou a fechar mais cedo. Os bares perderam os músicos, os garçons sumiram, e os turistas passaram a evitar a cidade velha como quem evita um cemitério aberto. Até os guias de turismo se recusavam a falar do prédio do Diário, como se o nome fosse amaldiçoado. A prefeitura tentou demolir a estrutura, mas as máquinas falharam. Um operário morreu esmagado sem explicação, outro se jogou no rio dizendo que o prédio havia sussurrado seu nome.
Na delegacia, o investigador Isaac Torres começou a perder o juízo. As câmeras de segurança captaram sua figura andando em círculos pela sala, conversando com alguém que não estava lá. Em certo momento, ele parou diante do espelho do banheiro da delegacia e começou a rir, depois a gritar, depois a chorar. Quando os colegas o encontraram, ele estava de joelhos, os olhos esbugalhados, repetindo: “Ele tem meu reflexo… Ele pegou meu reflexo…” Desde então, foi internado. E o espelho do banheiro foi retirado. Ainda assim, à noite, as batidas continuavam vindo de dentro da parede.

Relatos de pessoas sumindo após encarar vitrines, poças d’água ou até a tela preta dos celulares se multiplicaram. As vítimas eram sempre vistas pela última vez olhando o próprio reflexo. Algumas reapareciam, mas nunca mais eram as mesmas. Outras só deixavam um rastro molhado pelo chão. O rio Capibaribe começou a parecer mais espesso, como se engolisse a luz, e o ar das madrugadas passou a carregar um cheiro úmido e doce, como jornal velho e flor morta. Ninguém mais andava só. E mesmo em grupo, havia quem se perdesse do nada, como se um espelho invisível os tivesse sugado.
Hoje, quem passa pelo antigo centro do Recife depois das dez da noite sente o clima mudar. As luzes piscam. Os passos ecoam demais. E se você tiver coragem de olhar para dentro do antigo prédio do Diário, poderá ver uma figura ao fundo, imóvel, encarando. Às vezes, ela parece estar de costas. Às vezes, de frente. Mas você nunca verá seu rosto. E se vir... não conte a ninguém. Porque o que quer que more ali dentro, o que quer que vague pelas pontes e pelas sombras do Capibaribe, ainda está solto.
E esta história... Pode até ser uma invenção, mas... e se não for?
Fim.
*Zé da Flauta é músico, compositor e escritor. Gênio da raça, para variar.
