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As aventuras de Cacimba 3 — A risada do coronel carrancudo

06/09/2025 -

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Por Zé da Flauta*

Diziam que em Poço Redondo, sertão fundo de sol quente e poucas sombras, morava o homem mais carrancudo do Nordeste: Coronel Hermógenes Quirino de Alencar, senhor de terras, gado e medo. Tinha fama de nunca ter sorrido nem quando nasceu. Quando a parteira lhe deu o tapa inaugural, ele só olhou torto e cerrou o punho.

Cacimba chegou na cidade numa tarde de quinta, dia de feira, confusão e farinha fresca. Parou bem no meio da praça e armou sua sinuca portátil, um caixote que virava mesa com um estalo. Jogava por aposta, mas também por vaidade.

— Quem ganhar de mim leva dinheiro. Quem perder, leva uma história!

O povo riu. O povo sempre ria. Mas nesse dia, Hermógenes apareceu. Desceu do cavalo branco, com sua espingarda de estimação nas costas e a testa franzida como chão rachado. Caminhou em silêncio até a mesa. Olhou pra Cacimba e disse:

— Jogo. Se eu ganhar, tu cala a boca por um mês. Se tu ganhar, te deixo contar uma mentira. Só uma. E tem que ser boa.

Cacimba consultou os macacos. Simão tremia. Sebastião aplaudia.

— Feito.

Jogaram. O coronel jogava como quem finca cerca, seco, reto, implacável. Cacimba, como quem dança frevo em procissão: gingando, sorrindo, assoprando.

A última bola ficou dele. Era só matar. Mas ele errou. De propósito.

O coronel sorriu com os olhos, satisfeito. E então, Cacimba começou:



— Coronel... ano retrasado, fui convidado pra um torneio de sinuca no céu. São Pedro era juiz, Jesus jogava em dupla com Moisés, e o Espírito Santo soprava as bolas no ouvido. Ganhei de todos. Só perdi pro Anjo Gabriel, que usava um taco feito do raio que matou Sodoma. Mas no final, o próprio Deus me chamou e disse:

— Cacimba, tu é o cabra mais arretado que já subiu por essas bandas. Desce de novo e espalha tua arte.

Silêncio. Um vento soprou na praça. Uma beata desmaiou. O coronel ficou olhando pra ele. E então, pela primeira vez na história do sertão, soltou uma risada tão grande que os sinos da igreja badalaram sozinhos.

Desde então, passou a ser chamado de Hermógenes Risonho. E dizia:

— Só acredito em milagre depois que ouvi Cacimba.

*Zé da Flauta é músico, compositor, filósofo e escritor.



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