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O assassinato de Charlie Kirk escancara o extremismo na democracia nos Estados Unidos

12/09/2025 -

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Por Ricardo Rodrigues*
 
 
Para quem ainda enxergava a polarização política, tão presente nas democracias contemporâneas, como um fenômeno inofensivo e transitório do processo democrático, o assassinato, ontem, do ativista americano de direita, Charlie Kirk, foi a demonstração mais cruel de como essa percepção está equivocada.  
 
Charlie foi alvejado por um tiro enquanto falava para um público de cerca de 3 mil jovens num pátio ao ar livre de uma universidade no Estado de Utah. O episódio revelou como a democracia americana caminha a passos largos para o abismo de um extremismo doentio, no qual a intolerância e o ódio sobrepujam o diálogo.
 
Quem era Charlie Kirk
 
Conhecido como “Trump kid”, Charlie era um ativista político, de 31 anos, que se dedicava a uma verdadeira cruzada para disseminar ideias políticas conservadores em faculdades americanas.  Aos 18 anos, ele fundou o “Turning Point USA”, uma organização destinada a promover os “princípios de responsabilidade fiscal, livre mercado e Estado com poderes limitados" junto ao público jovem universitário, sobretudo em universidades de tradição liberal.  
 
 
 Sucesso de seu empreendimento
 
O sucesso de seu empreendimento é incontestável.  A organização possui representações em nada menos que 850 faculdades. Nas redes sociais Charlie conseguiu arrebanhar milhões de seguidores.  Somente no X, Charlie tinha 5 milhões e meio de seguidores, enquanto no Instagram, esse número saltava para mais de 9 milhões de seguidores.
 
Filho de um arquiteto da cidade de Chicago, Charlie abandonou a faculdade para se dedicar ao que ele considerava sua missão: mobilizar jovens para a causa conservadora.  De fato, em suas falas aos estudantes nos muitos campi por onde passou e nos debates que travou, fazia questão de realçar que não tinha diploma universitário.  Mas que isso não era empecilho para se engajar em debates democráticos.
 
Charlie chegava numa faculdade, armava um toldo em alguma área aberta do campus e ali se dispunha a debater temas da política.  Atrás da cadeira de onde costumava receber tanto seus ouvintes quanto seus debatedores de ocasião, sempre havia um banner no qual se lia os dizeres “Prove me wrong”, ou “prove que estou errado”, em tradução livre para o português.  Era sua marca registrada, seu convite ao debate, que sempre terminava com um aperto da mão do adversário.
 
 “Turning Point USA”
 
Aqui no Brasil, eu sequer sabia da existência da organização criada por Charlie Kirk até recentemente quando assisti a um discurso do jornalista Tucker Carlson que havia viralizado.  Tratava-se de um discurso no qual Tucker, aliado de Trump desde a primeira hora da campanha, criticava o presidente por se recusar a divulgar os arquivos de Jeffrey Epstein e por não estar cumprindo várias de suas promessas de campanha.
 
Tucker discursou, a convite de Charlie, na grande conferência nacional da Turning Point USA, em julho deste ano na cidade de Tampa, na Florida.  Tucker mostrou-se surpreso com o convite pois imaginou que sua fala seria rejeitada pela multidão ali presente, formada por jovens eleitores de Trump.  Ele iniciou o discurso falando sobre essa sua surpresa.  Para Charlie, contudo, as divergências constituíam precisamente a essência do processo democrático.  
 
Meu filho conhecia Charlie Kirk melhor do que eu pois segundo me falou, Charlie era muito popular nas redes sociais.  “Até o desenho animado “South Park” chegou a fazer paródia com ele”.  Segundo meu filho, “concordando-se ou não com Kirk, o que se via nos debates que ele promovia era a disposição tanto de pessoas de esquerda, como de direita, de debaterem em público, de defenderem suas ideias”.
 
Debate democrático
 
Ao instigar o debate, Charlie encarnava o Sócrates da Grécia Antiga, que levava o debate democrático para a praça pública.  Charlie transformava os campi universitários americanos na praça pública socrática.
 
Violência política não é fenômeno recente nos EUA
 
Não é de hoje que acompanhamos atônitos as notícias de violência no cenário político norte-americano.  
 
O assassinato de Charlie Kirk vem na esteira de duas tentativas de assassinato de Donald Trump, ainda durante a corrida presidencial.  Em Butler, no Estado da Pennsylvania, Trump foi atingido de raspão, numa tentativa de assassinato muito semelhante à que vitimou Charlie Kirk.
Mas os episódios não param por aí.
 
 
 Vários atentados
 
 Somente neste ano, vários atentados contra políticos foram registrados nos Estados Unidos. Foi o caso do Governador Josh Shapiro, da Pennsylvania, que teve a residência oficial atacada com coquetéis molotov.  Foi o caso também de Melissa Hortman, ex-presidente da Assembleia Legislativa do Estado de Minessota, assassinada juntamente com seu marido.
 
A morte de Charlie Kirk lembra-nos, de pronto, da violência política nos Estados Unidos nos anos 1960.  Na época, foram vítimas o Presidente John Kennedy, seu irmão e candidato à presidência, Robert Kennedy, e o reverendo Martin Luther King, jr., ativista dos Direitos Civis.  A diferença é que naquela época as vítimas eram representantes da esquerda, mesmo que fosse uma esquerda acanhada, dentro do Partido Democrata, enquanto agora as vítimas se alinhavam com o lado oposto do espectro político.
 
“Black Mirror”
 
Não bastasse a crueldade da violência política praticada contra o jovem Charlie Kirk, algumas de suas repercussões mais esdrúxulas denotam o estado de degradação da democracia.  Um jornalista da MSNBC, por exemplo, foi despedido após sugerir, ao vivo, que a culpa pela morte de Charlie Kirk era dele mesmo.  
 
Na TMZ.com, canal que apresenta notícias sobre celebridades, jornalistas que debocharam da morte de Charlie Kirk tiveram que pedir desculpas públicas para não perderem seus empregos.  Esses dois casos demonstram que o mundo talvez esteja abandonando sua própria humanidade.  Esses casos mais parecem saídos de um episódio do seriado surreal “Black Mirror”.  
 
Sem humanidade e empatia, como esperar que a democracia seja sustentável?  O intelectual francês Alexis de Tocqueville, que escreveu a obra clássica “A democracia na América”, deve estar se revirando no túmulo.  De Tocqueville viu na América de 1831 o espírito cívico do cidadão fortalecendo o regime político.  A morte de Charlie Kirk leva-nos a questionar se o que tanto maravilhou De Toqueville sobre a democracia na América não esteja por um fio.
 
Ricardo Rodrigues é jornalista e cientista político.  Ele escreve sobre política internacional para O Poder.
 
NR - Os textos assinados expressam a opinião dos seus autores. O Poder acolhe a diversidade de pensamentos e visões do mundo e estimula o contraditório democrático e respeitoso.

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