
Empresas podem proibir relacionamentos amorosos entre empregados?
02/10/2025 -
*Por Giovanna Tawada
É cada vez mais comum que relacionamentos amorosos surjam no ambiente de trabalho. Afinal, o convívio diário e a convivência próxima entre colegas durante muitas horas podem dar espaço ao surgimento de vínculos afetivos. Contudo, a questão que se coloca é: quais os limites jurídicos dessa situação?
A legislação
A legislação trabalhista brasileira trata sobre o tema? A empresa pode proibir relacionamentos entre empregados? Em quais casos pode haver demissão por justa causa?
Há previsão legal sobre relacionamentos amorosos no trabalho?
A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) não prevê regras sobre relacionamentos amorosos no ambiente corporativo. A Constituição prevê em seu artigo 5º, X, que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”, ou seja, esse dispositivo assegura que a vida íntima e privada do trabalhador não pode ser violada pela empresa, salvo quando houver reflexos diretos no ambiente laboral.
Interferir no relacionamento
Em outras palavras, o empregador não pode interferir no relacionamento amoroso do empregado fora do contexto do trabalho, sob pena de violar garantias constitucionais.
Regulamento/Política Interna da Empresa
Embora não exista previsão legal direta, as empresas podem adotar políticas internas de conduta por meio de regulamento ou código de ética, que tragam orientações sobre relacionamentos afetivos entre empregados ou entre superiores hierárquicos e subordinados.
Recomendável
Entretanto, não é recomendável a proibição absoluta de tais vínculos, já que isso poderia configurar violação à vida privada e à liberdade individual do trabalhador. O que se admite é a fixação de regras para prevenir conflitos de interesse, favorecimentos ou situações de assédio, sobretudo quando o relacionamento envolve superiores e subordinados.
A empresa
A empresa em casos de relacionamentos entre superiores e subordinados, caso seja de uma mesma área, pode verificar a possibilidade de alterar referido empregado de área, desde que não cause qualquer prejuízo à ele.
Possibilidade de Justa Causa
O simples fato de manter um relacionamento amoroso no ambiente de trabalho não é motivo suficiente para justa causa.
A justa causa só será cabível quando o relacionamento estiver ligado a atos de improbidade (como favorecimento irregular em promoções ou benefícios), provocar escândalo público ou constrangimento no ambiente de trabalho, prejudicando a imagem da empresa ou se houver demonstrações inadequadas de afeto, como carícias e tratamento diferenciado.
Assim, não é o relacionamento em si que gera justa causa, mas sim as consequências negativas de condutas decorrentes dele.
Decisão o Tribunal Regional do Trabalho
Contudo, em recente decisão o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, proferiu uma decisão nos autos do processo 1001522-59.2024.5.02.0087, em que manteve a sentença que reconheceu uma justa causa entre o dono da empresa e uma subordinada.
Justa causa
No caso, a “reclamada sustenta que a reclamante foi dispensada por justa causa em 15/07/2024, por incontinência de conduta ou mau procedimento (por manter relação amorosa com o marido da empregadora e coproprietário da empresa, em nítida afronta aos padrões éticos esperados no ambiente de trabalho), ato de indisciplina ou de insubordinação (ao afrontar diretamente sua superiora imediata, demonstrando total desrespeito à hierarquia e normas internas de conduta) e ato lesivo da honra ou da boa fama ou ofensas físicas praticadas contra o empregador e superiores hierárquicos (ao proferir palavras de baixo calão e xingamentos diretamente à Sra. Amanda, sua empregadora e superior hierárquica.”
A decisão
A decisão entendeu que tendo em vista que a esposa do dono da empresa contratou a reclamante e que “havia uma relação de carinho e confiança entre a reclamante e a esposa do proprietário da reclamada”, a qual administrava a empresa, “tem-se que o comportamento da reclamante caracteriza incontinência de conduta, ensejando a dispensa motivada, com fundamento no art. 482, “b”, da CLT, sendo evidente a quebra da confiança que nela havia sido depositada.”
Desse modo, cada caso deve ser analisado de forma isolada para que sejam analisados cada requisito individualmente.
Dispensa sem Justa Causa e Discriminação
Se a empresa optar por rescindir o contrato de um empregado envolvido em relacionamento, a dispensa sem justa causa é juridicamente possível, já que o empregador possui o direito de rescindir o contrato de trabalho (art. 7º, I, CF/88 e art. 477, CLT).
No entanto, se a dispensa for motivada unicamente pelo relacionamento amoroso, sem que exista qualquer conduta prejudicial ao ambiente de trabalho, pode-se alegar dispensa discriminatória. Isso porque a motivação atinge diretamente a vida privada do trabalhador, protegida pela Constituição.
Consequências da dispensa discriminatória:
·
Reintegração
Reintegração do empregado ao trabalho, com pagamento dos salários e demais direitos do período de afastamento;
·
·
Ou indenização substitutiva, a critério do empregado, com base na Súmula 443 do TST, que reconhece a presunção de dispensa discriminatória em determinadas situações.
Conclusão
Relacionamentos amorosos no trabalho não são proibidos pela legislação brasileira, mas demandam cautela. A empresa não pode restringir direitos fundamentais do trabalhador, mas pode adotar políticas internas para preservar a ética, evitar conflitos de interesse e prevenir situações de assédio.
Aplicável
A justa causa somente será aplicável em hipóteses de condutas graves decorrentes do relacionamento, e a dispensa sem justa causa, se discriminatória, pode trazer sérias consequências jurídicas ao empregador.
O equilíbrio
Portanto, o equilíbrio está em respeitar a esfera privada do trabalhador, sem descuidar da preservação do ambiente laboral saudável e produtivo.
*Giovanna Tawada é advogada formada e pós-graduada em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho, ambos pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, e conta com mais de 11 anos de experiência na área trabalhista, sempre atuando em grandes e renomados escritórios de São Paulo. Tawada é, atualmente, sócia do escritório Feltrin Brasil Tawada com atuação voltada tanto para área consultiva quanto para o contencioso trabalhista.
NR - Os artigos assinados expressam a opinião dos seus autores.