
Desenvolvimento não é sinônimo de destruição
11/10/2025 -
Por Sávio Delano, advogado e membro da Comissão de Direitos Humanos da OAB/PE
A proposta de “compensação ambiental” apresentada pelo Exército Brasileiro para justificar o desmatamento da Mata Atlântica, na construção da Escola de Sargentos em plena APA Aldeia-Beberibe, exige reflexão crítica.
Em tempos de emergência climática, a insistência em destruir uma das áreas mais sensíveis da região metropolitana do Recife é incompreensível e contraria o que a ciência, a sociedade e a própria legislação ambiental vêm sinalizando de forma inequívoca.
Não se trata aqui de negar a importância do desenvolvimento econômico, tampouco de demonizar a presença de um equipamento militar em Pernambuco. Ao contrário: defendemos que preservação ambiental e desenvolvimento econômico podem andar juntos.
A experiência mundial mostra que os países que melhor conciliaram prosperidade com qualidade de vida foram justamente aqueles que entenderam que o meio ambiente não é obstáculo, mas ativo estratégico.
É neste sentido que se revela inaceitável a narrativa de que o desmatamento da Mata Atlântica seria um “mal necessário” para o progresso.
A proposta do Exército, além de insuficiente, revela-se distorcida em seus fundamentos. Não se pode falar em compensação quando a área já é protegida por lei — tanto pela Lei da Mata Atlântica quanto pela legislação de proteção aos mananciais.
A criação de uma unidade de conservação, apresentada como gesto de avanço, esbarra nesse paradoxo: proteger aquilo que a Constituição e a legislação já asseguram, mas que agora se pretende fragilizar. Soma-se a isso a preocupante omissão do Governo do Estado de Pernambuco, que, diante de um empreendimento de tamanha magnitude e evidente impacto socioambiental, tem se mantido silencioso ou conivente.
A ausência de uma postura firme e transparente do poder público estadual não apenas fragiliza os instrumentos de proteção ambiental existentes, como também compromete o princípio da gestão compartilhada e democrática das Áreas de Proteção Ambiental, transformando o debate em um monólogo militar em vez de um processo participativo e republicano.
Verifica-se, ainda, que o projeto do Exército prevê a instalação de uma área destinada a um Parque de Obuses, o que amplia significativamente os potenciais impactos ambientais e sociais da obra. Isso significa que, além do desmatamento, a região — hoje essencial para a proteção dos mananciais e da biodiversidade — poderá ser submetida a uma atividade militar de alto impacto, completamente incompatível com a função socioambiental do território.
A ausência de informações claras sobre essa previsão evidencia a falta de transparência no processo e reforça o risco que o empreendimento representa tanto para o meio ambiente quanto para as comunidades locais.
Há, ainda, um aspecto político que não pode ser ignorado. Em pleno momento pré-eleitoral, deputados e lideranças políticas locais se apressam em vestir o manto do “desenvolvimentismo” para angariar votos.
O mais grave é ver até parlamentares da oposição, que deveriam fiscalizar o governo, se colocando na posição de defensores do ministro da Defesa — revelando que a lógica eleitoral tem pesado mais do que o compromisso com o futuro ambiental da região. Esse pragmatismo oportunista ignora que o verdadeiro desenvolvimento precisa ser sustentável, e que os custos ambientais desse projeto recairão sobre as próximas gerações.
O debate, portanto, não se resume a ser a favor ou contra o progresso. Trata-se, antes, de uma reflexão necessária sobre até que ponto continuaremos tratando a destruição ambiental como moeda de troca política e eleitoral, ou se seremos capazes de buscar alternativas locacionais e soluções inteligentes que conciliem prosperidade econômica, segurança nacional e proteção ambiental.
Cabe ao Estado brasileiro — e, em especial, ao Exército, enquanto instituição historicamente associada à proteção da soberania e do território — reafirmar o compromisso com a preservação da vida e com o cumprimento dos princípios constitucionais que orientam a defesa do meio ambiente como bem de uso comum e essencial à vida das presentes e futuras gerações.
NR - Os textos assinados expressam a opinião dos seus autores. O Poder estimula e acolhe o contraditório. Nossa linha editorial é favorável à construção da Escola de Sargentos conforme o projeto do Exército e suas adaptações.