
Da flor ao notebook: A engrenagem invisível do controle; aponta Zé da Flauta
20/10/2025 -
Minha geração foi atropelada pela onda hippie. Pregava paz, amor e liberdade, mas terminou na UTI da ilusão: uns morreram cedo, outros carregam hoje sequelas físicas e culturais. Queríamos mudar o mundo, mas o mundo mudou a gente primeiro. Enquanto sonhávamos com a utopia, o sistema vinha com outra ideia, a do consumo.
Rebeldia
E assim a rebeldia foi embalada, rotulada e vendida em vinil. A flor no cabelo virou logotipo, o ideal de liberdade, um produto de marketing.
Exaustão
Hoje, o mesmo truque reaparece, mais moderno e mais cruel. Sai o LSD, entra o Wi-Fi. Sai a comunhão dos corpos, entra a conexão das máquinas. A nova religião se chama produtividade, trabalha enquanto eles dormem, empreende enquanto eles vivem. O hippie fugia do sistema pela viagem; o “workaholic” se entrega a ele pela planilha. A droga agora é a dopamina dos likes, e a bad trip vem na forma de exaustão emocional.
Fuga psicodélica
De um lado, tínhamos os filhos do sol; de outro, temos os servos do LED. A geração flower power queria sentir demais; a geração work power sente de menos. Ambas foram educadas para não pensar, uma pela fuga psicodélica, outra pela correria digital. É o mesmo adestramento com figurino novo. Ontem o guru vestia bata indiana; hoje, terno slim fit e microfone de coaching.
Sabedoria artesanal
Talvez a verdadeira contracultura seja, agora, desligar o celular, desacelerar e ouvir o próprio silêncio, aquele som analógico da alma. A maior revolução não será tecnológica, mas interior: aprender a não correr atrás do vento. O futuro pode até ser digital, mas a sabedoria continua artesanal, feita à mão, com tempo, calma e café.
Até a próxima!
*Zé da Flauta é músico, compositor, filósofo e escritor.
