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É Findi – Banquete das Traças - Croni-Poema, por Xico Bizerra*

01/11/2025 -

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Dia de finados, falo da 'morte' de meus livros, devorados pelas traças...

29 de Outubro - Dia Nacional do Livro)

Passo a passo a traça passa
Sem ter pressa no passar
Penso e peço não se impeça
Dar-se à traça o seu traçar
Torço e rezo com meu terço:
Que não possa, sem apreço
Verso e prosa destroçar

A traça abandona seu casulo e vem habitar minha estante. E é lá que, sem qualquer constrangimento, travessa, ela traça tudo que é troço que tenha letras. Alguém já tinha me advertido: ‘Cuidado com as traças. Elas não sabem ler, mas adoram livros’. Papel nenhum escapa, novelas ou contos, crônicas ou versos. Os bons, traça-os. Os ruins, destroços que só à traça interessa, ela também os traça. Quando muito, sobra uma capa. Daquelas duras. Apenas por isso. Às vezes se empanturra com volumosos romances e tira gosto petiscando pequeninos poemas. Lancha kai-kais. Outras vezes, apenas belisca crônicas breves, de pouco alfabeto, parecidas com as que teimo em escrever, poucos parágrafos, nenhum travessão.

Fome Devastadora

A tudo devora, sem dó nem piedade. Não as impeço, não tento impedi-las: de nada adiantará. Surpresas há: um Saramago, restou quase intacto. Certamente não gostaram do cardápio português, do seu pouco tempero, sem quase nenhum condimento, ponto ou vírgula. Já outros, começavam pelo prólogo, como se antepasto fosse. Alguns, como meu Manoel de Barros preferido e por mim tantas vezes lido e relido, foi devorado a partir da página 53, aleatoriamente, sem critério lógico nenhum. Ao fim, sobreviveu apenas o índice onomástico. Acho que em respeito às pessoas e bichos importantes ali contidos. João Cabral escapou porque sua Poesia é dura como uma pedra. Mas tenho dúvidas se a Poesia concreta sobreviverá à gula das traças ... Fico a perguntar-me: por quantos serão lidas minhas mal tecladas e traçadas ‘croniquetas’, extraídas com tanto esforço e paridas de meu sofrido e limitado intelecto? Ou servirão apenas de alimento suprindo a sanha avassaladora por ‘literatura’ desses bichinhos pequenos e vorazes, de instinto faminto e destruidor?

Traças Virtuais

Bicho mais ‘letrado’ que a traça não há. Até merecia uns versos, tivesse eu a certeza de que não seriam por ela traçados. Pior: mesmo que eu esconda minha biblioteca nas nuvens do Windows, não demora surgirá um hacker que, maldosamente, inventará traças cibernéticas, perigosas vilãs virtuais, devoradoras de bits que porão a perigo minhas pobres e suadas letrinhas. Minha vingança é a eterna esperança que elas venham a engasgar-se com umas reticências ou com um ponto e vírgula perdido no meio de um Drummond de minha biblioteca ...

Devoraram minha Barsa
Meu Aurélio e meu Houaiss
Nem Pessoa escapou
João Cabral e outros mais
Só restou um caderninho
Sem nada escrito, branquinho
Sem letras, na frente e atrás


*Xico Bizerra, é compositor, poeta e escritor.

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