O inimigo interno, da autoridade à decadência - Jorge Henrique de Freitas Pinho* rebate artigo de José Nivaldo Junior
02/11/2025 -
1. O diálogo necessário com um querido amigo
Li o texto “Guerra ao crime muito bem organizado: de que lado você está?”, de meu querido editor José Nivaldo, com o respeito e a admiração que ele sempre inspirou. Ele tem o dom raro de unir lucidez e coragem, e seu diagnóstico do avanço do crime organizado é preciso e necessário.
Mas...
Permito-me, contudo, acrescentar um ponto de discordância. O que vivemos hoje não é apenas o resultado de anos de descuido institucional atribuídos à Ditadura de 1964. Essa leitura, embora sedutora, é uma simplificação conveniente, uma tentativa de reduzir uma tragédia nacional a um único bode expiatório, quando, na verdade, o que temos é um rebanho inteiro de responsabilidades compartilhadas.
Décadas de erosão
O colapso moral que nos trouxe até aqui é fruto de décadas de erosão ética, de permissividade travestida de compaixão e da lenta substituição da autoridade legítima pela demagogia sentimental que confunde piedade com conivência.
2. As origens históricas do crime organizado
O crime organizado brasileiro não nasceu na ditadura militar, muito menos foi obra exclusiva de um único regime. Ele começou a tomar forma ainda no governo Getúlio Vargas, quando o Estado misturou nas prisões os comunistas revolucionários com criminosos comuns.
Ali, na Ilha Grande, essa convivência forçada gerou um cruzamento perverso: o método político da conspiração encontrou a logística da delinquência.
Dessa fusão nasceu a primeira célula do crime com estrutura ideológica, disciplina e hierarquia, a semente do que viria a se chamar Comando Vermelho.
3. Brizola e o ponto de mutação
Esse organismo criminoso cresceu aos poucos, ainda contido pelo aparelho repressor da ditadura militar. Tinha baixo poder bélico, pouca articulação e escassa capacidade de enfrentamento.
No entanto, a leniência posterior o fortaleceu. Décadas mais tarde, o ponto de mutação decisivo ocorreu com Leonel Brizola, que, em nome de uma suposta defesa dos direitos humanos, proibiu a polícia de subir o morro.
O gesto nobre, que pretendia proteger os pobres, acabou por abandoná-los. Ao impedir a presença da lei, Brizola institucionalizou o território sem Estado e o tráfico, pela primeira vez, consolidou-se como poder paralelo, sob diferentes facções criminosas que passaram a dominar e dividir territórios.
Foi o início da soberania do crime, a fundação do “Estado do Morro”. Convém registrar que os conflitos armados em larga escala, com tiroteios prolongados e domínio territorial, começaram justamente a partir da era Brizola.
Paradoxalmente, durante os chamados anos de chumbo — tão combatidos pela intelectualidade brasileira —, tais confrontos não existiam. Bastou que o império retórico dos “direitos humanos” se infiltrasse nos órgãos de persecução criminal para que o crime, antes contido, passasse a agir com crescente ousadia e violência.
Talvez daí tenha nascido a falsa impressão de que a repressão gera o desvio, quando, neste caso, ocorre o inverso: é a ausência de repressão que o multiplica.
A natureza humana, quando corrompida pela impunidade, perde o senso de limite e passa a testar até onde o Estado cederá antes de reagir. E quando o Estado hesita, o crime aprende a dominar.
Aristóteles ensinava que a virtude é o ponto médio entre dois vícios — o da omissão e o do excesso —, mas há situações em que o mal deixa de ser vício individual e se torna estrutura coletiva.
Diante do narcoterrorismo, a “justa medida” não é a contenção, mas o poder dissuasório superior que intimida o inimigo e restabelece a hierarquia moral entre o bem e o mal.
Porque, quando a guerra é declarada contra a sociedade, moderação não é virtude — é rendição.
A força legítima, usada com coragem e propósito, torna-se o único idioma que o terror compreende. Basta ver o que ocorreu em Gaza: a paz não nasce do diálogo com quem não reconhece a vida, mas da firmeza de quem a defende até o fim.
É por isso que a autoridade que hesita em punir o mal termina por punir os inocentes com o peso do medo, ao passo que aquela que o combate até o fim pode, enfim, estabelecer algum tipo de paz — ainda que a paz possível, e não a paz ideal.
A ditadura militar, por sua vez, repetiu o erro de Vargas ao prender criminosos comuns e políticos sob o mesmo teto, propiciando a troca de técnicas e o aprendizado mútuo.
O resultado foi a profissionalização do crime, que incorporou à sua estrutura as estratégias de guerrilha aprendidas nas celas e hoje as executa com precisão militar nas ruas do Rio de Janeiro.
A história, sempre irônica, registrou esse equívoco em forma de símbolo: “brizola” tornou-se nome de droga, um epitáfio involuntário da inversão moral de um país que confundiu autoridade com tirania e tolerância com covardia e permissividade.
4. Klinger Costa e a autoridade moral
No Amazonas, contudo, a história seguiu outro caminho. Sob a condução firme e austera de Klinger Costa, a criminalidade era mínima e o respeito à polícia, absoluto.
Grupos de bandidos não se criavam. Eram dissolvidos antes mesmo de se estruturar. Havia controvérsias, é verdade, mas havia também ordem, e a ordem é a espinha dorsal da civilização.
Quem viveu em Manaus nos anos 1990 sabe que a cidade respirava segurança e dignidade. Eu mesmo testemunhei esse tempo: ruas tranquilas, comércio pulsante, famílias em paz.
Havia um pacto silencioso entre o cidadão e a autoridade, o pacto da confiança. A lei não era inimiga, era presença.
O poder público, ainda que severo, tinha alma, e o crime, ainda que astuto, reconhecia limites. Era um tempo em que o medo não comandava as ruas e a coragem não precisava pedir licença.
O que surgiu depois de Klinger Costa foi um lento e progressivo império dos direitos humanos que deixou o Estado do Amazonas em situação semelhante à dos demais estados da federação, ao ponto de pelo menos seis dos mortos na operação Contenção, no Rio de Janeiro, serem líderes de Manaus.
5. A decadência do Rio e o contraste nacional
Lembro-me bem da minha primeira visita ao Rio de Janeiro, em 1996. A palavra que me veio à mente foi decadência, estética, humana, moral e econômica.
O mesmo país que um dia soube erguer uma capital grandiosa e de beleza exuberante agora exibia seus escombros: pontos fechados, muros pichados, rostos endurecidos, olhares desconfiados. A beleza sobrevivia, mas ferida. O esplendor de outrora, reduzido à mera lembrança.
Ainda assim, entre os destroços, havia lampejos de humanidade, o sorriso de um vendedor, o olhar solidário de um transeunte, a persistência de uma alma carioca que teimava em resistir.
Percebi ali o contraste que define o Brasil: a convivência entre a luz e a ruína, entre a esperança e o abandono, entre o que fomos e o que ainda poderíamos voltar a ser.
6. Do crime à insurgência
Hoje, contudo, o que enfrentamos já não é simples criminalidade. O estado da arte do mal é o terrorismo interno, ainda disfarçado sob o véu gasto do discurso dos direitos humanos.
São os mesmos direitos humanos que alguns tentam estender aos terroristas de Gaza, como se a barbárie merecesse amparo jurídico.
Tanto lá quanto cá, a estratégia é a mesma: despem os mortos, maquiam o horror e apresentam as vítimas como civis para que a comoção pública sirva à narrativa política.
A crueldade se traveste de inocência, e a mídia, muitas vezes sem perceber, torna-se cúmplice da encenação.
Aqui, o inimigo é de natureza idêntica: usa armas de guerra, derruba helicópteros, assassina autoridades, impõe sua própria lei e cobra pedágio da população apenas por viver e trabalhar.
Nenhum eufemismo pode suavizar essa realidade. Quando o crime desafia o Estado e este hesita em responder, não temos mais delinquência, temos insurgência.
7. O paradoxo da boa consciência
É justamente aqui que surge o ponto delicado — e, ao mesmo tempo, brilhante — do texto de José Nivaldo. Ele não compactua com o narcotráfico; ao contrário, propõe que o governo aproveite o próprio projeto de Lula para transformar o narcotráfico em terrorismo. Nisso, está certíssimo: o crime organizado brasileiro já atua como grupo terrorista e deve ser tratado como tal.
Mas, ao mesmo tempo, ele recorre ao velho argumento de que “a proibição não resolveu”, evocando a Lei Seca dos Estados Unidos, e sugere que a criminalização das drogas apenas alimentou o sistema criminoso.
Aí nasce o paradoxo: ou o tráfico é um negócio que deve ser tirado das sombras, ou é uma organização armada que precisa ser enfrentada com a força do Estado. As duas coisas, ao mesmo tempo, são logicamente inconciliáveis.
A diferença é simples e decisiva: nos EUA dos anos 1920, o álcool não derrubava helicópteros nem fuzilava policiais; no Brasil de 2025, o tráfico derruba. O potencial destrutivo do álcool era incomparavelmente menor, e sua legalização, à época, ajudou a reerguer a economia americana e a enfraquecer a Máfia, numa guerra que persiste até hoje, mas com o Estado sem jamais abdicar do enfrentamento.
As drogas, contudo, pertencem a outra categoria moral e estratégica: ampliam o consumo, degradam o tecido social e erguem poderes paralelos que dominam territórios, impõem “leis” próprias e cobram tributos sobre o medo. O narcotráfico já não é um comércio: é uma forma de poder armado.
Além disso, tornou-se instrumento de geopolítica internacional. A China, que sofreu duas Guerras do Ópio e suportou um século de humilhação, aprendeu a lição: hoje adota tolerância zero dentro de suas fronteiras, mas exporta os insumos químicos que devastam o Ocidente. É a vingança histórica pela decadência do século XIX — agora travada não com exércitos, mas com moléculas e fluxos financeiros. Alguns estudos estimam que o narcotráfico global movimenta quase um trilhão de dólares por ano.
Por isso, ninguém se iluda: a posição americana nessa guerra também é geopolítica. Há registros históricos de infiltração e financiamento de operações clandestinas por meio do comércio ilegal de drogas — algo que envolve interesses cruzados, espionagem e realpolitik. A complexidade do tema é indiscutível, mas complexidade não pode servir de desculpa para inação.
É preciso, sim, tomar um lado — o lado da luz e da razão — e empreender um combate intransigente e implacável contra as drogas, combinando repressão eficaz com campanhas permanentes de conscientização nas escolas, na mídia e em todos os espaços formadores de consciência coletiva.
A razão é simples: todo ser humano, quando dotado de um mínimo de discernimento, decide com base em uma lógica de custo e benefício — só se arrisca enquanto o custo é baixo.
E foi justamente essa relação que o Brasil inverteu. A criminalidade cresceu na exata proporção em que as penas diminuíram e em que o cumprimento efetivo da lei se tornou exceção. A impunidade converteu o crime em negócio, e o negócio em vocação.
Essa tendência precisa ser radicalmente revertida, sob pena de o país colapsar moral e institucionalmente. Nenhum Estado sobrevive quando o mal descobre que o risco compensa.
Nem mesmo a ditadura mais autoritária do mundo — a chinesa — conseguiu eliminar os efeitos do ópio que lhe foi imposto pela Inglaterra.
Mas a China nunca desistiu de combatê-lo.
Transformou o enfrentamento das drogas em meta de governo, questão de soberania e de identidade nacional, e hoje exibe um dos menores índices de consumo do planeta.
O contraste é revelador: o Ocidente, em nome da “liberdade individual”, legaliza o vício; o Oriente, em nome da sobrevivência coletiva, o combate como uma guerra — e, ao mesmo tempo, exporta os insumos químicos que o alimentam, auferindo lucros bilionários em um negócio de mais de um trilhão de dólares por ano, enquanto enfraquece gradualmente seus competidores globais, tal como fizeram com ele no passado.
É a vingança silenciosa das antigas guerras do ópio, agora travada com seringas, pílulas e moléculas em vez de canhões. Uma guerra sem tiros, mas com cadáveres.
Zé Nivaldo enxerga com grande clareza as consequências — o narcoestado, a captura de territórios, a ousadia das facções —, mas ainda as lê sob uma narrativa que explica o fenômeno pelo proibicionismo, quando, na verdade, o problema brasileiro não é a proibição: é a impunidade. O que nos trouxe até aqui não foi o fato de a droga ser crime, mas o fato de o crime não ser punido.
Em outras palavras: se o tráfico já se converteu em terrorismo, não cabe mais tratá-lo como política de saúde — cabe tratá-lo como guerra interna. Educação e prevenção são indispensáveis para reduzir a demanda; mas facção armada se enfrenta com polícia, não com cartilha.
8. A inversão moral e o desestímulo ao heroísmo
Tanto a grande mídia quanto a mais alta corte do país parecem ensaiar passos para criminalizar uma ação legítima e amplamente apoiada pela população, que já não suporta mais viver sob a exploração imposta pelo crime organizado.
A imprensa, apressada em sua ânsia por equivalências morais, compara o enfrentamento armado dos criminosos ao episódio do Carandiru, como se a guerra contra o narcoterrorismo pudesse ser tratada como mera abordagem policial.
E o Supremo, ao cobrar que um conflito interno dessa magnitude seja investigado como uma operação de rotina, parece ignorar que o Brasil já não enfrenta delinquentes, enfrenta exércitos.
Como assim? Quantas guerras no mundo são objeto de perícia criminal de todos os mortos? Será preciso montar uma nova operação militar apenas para realizar perícias em campo inimigo? E para quê, se todos os mortos estavam fortemente armados, empunhando fuzis de guerra?
A resposta se lê nas entrelinhas: a intenção não declarada é punir novamente os policiais heróis e desestimular aqueles que ainda ousam enfrentar o crime de frente. É a velha tática da inversão moral que pune quem defende a lei e protege quem a destrói.
9. O equívoco da “antifacção”
Por isso, concordo com meu amigo: é preciso agir com firmeza. Mas discordo do caminho. O projeto de lei “antifacção” apresentado por Lula não é uma solução — é mais uma manobra oportunista.
Aproveita-se do medo legítimo da população para tentar transformar uma tragédia nacional em capital político. Sob o pretexto de combater o crime, busca aprovar uma lei que lhe confira ainda mais poderes, para que possa decidir — politicamente — onde, quando e contra quem a força do Estado será usada.
Quem pretende “coordenar” a guerra contra o crime deseja, na verdade, controlar os instrumentos da força pública. Hoje se volta contra as facções; amanhã, contra os adversários. É a velha tentação autoritária de disfarçar o desejo de mando com a retórica da segurança.
O mesmo governo que envia blindados quando o governador é aliado, recusa-se a agir quando o governador é independente. Essa é a lógica do poder no Brasil contemporâneo: socorrer o comparsa e abandonar o justo.
Se Lula realmente quiser enfrentar o crime no Rio de Janeiro, precisa romper com a lógica do compadrio político que sempre orientou suas decisões.
A guerra contra o narcoterrorismo não pode ser travada com critérios partidários. É preciso escolher entre o país e o projeto de poder — entre a coragem de governar e a conveniência de administrar alianças. Nenhum Estado pode vencer o crime se for governado pelo medo de desagradar seus próprios cúmplices.
10. A autoridade justa e o dever da coragem
A guerra contra o narcoterrorismo exige, sim, integração entre União, Estados e Municípios, mas nunca subordinação. Deve ser uma guerra da República, não de um partido.
Uma cruzada em nome da lei, não um artifício para expandir o controle político sobre as forças de segurança. O combate ao crime precisa unir o país — não domesticá-lo.
Portanto, respondendo a Zé Nivaldo, eu sou, e sempre serei, contra o crime e a favor das pessoas de bem. A favor do cidadão que trabalha, que cria filhos, que paga impostos e que não deve nada a criminosos — muito menos pela própria vida.
O Estado que não protege o homem honesto perde o direito moral de existir. E o povo que se cala diante dessa inversão perde, pouco a pouco, o direito de chamar-se livre.
O Brasil só será maior que o crime quando reaprender a respeitar a autoridade justa — aquela que age com firmeza, mas também com propósito e decência; que entende que os verdadeiros direitos humanos começam pela defesa da vida dos inocentes, e não pela indulgência com os culpados.
O crime organizado transformou-se em terrorismo interno. Mas ainda há tempo de vencê-lo — desde que não entreguemos nossa liberdade àqueles que, em nome da segurança, sonham com o poder absoluto. Que o Brasil desperte antes que a covardia se transforme em doutrina e a omissão em sistema.
Pascal escreveu que “a justiça sem força é impotente, e a força sem justiça é tirania”. No Brasil, assistimos à perversão final dessa máxima: uma justiça que se tornou força, mas é uma força que perdeu toda justiça.
11. Epílogo — A amizade e o espelho
Digo tudo isso com o mais profundo respeito por José Nivaldo, cuja lucidez admiro e cuja coragem intelectual reconheço — mais ainda pela grandeza de espírito em me publicar, mesmo sendo contrário a muito do que penso.
Com esse gesto, ele reafirma algo que poucos compreendem: que a liberdade de expressão é o verdadeiro motor do avanço civilizacional, e que só o confronto de ideias preserva o que há de mais digno na alma humana — o direito de pensar. Nesse sentido, meu querido Zé Nivaldo é inigualável.
Entretanto, percebo em seu texto o eco de um vício de origem que acomete boa parte da inteligência brasileira: o de enxergar o presente à sombra das narrativas do passado, mantendo-se fiel a uma matriz ideológica que já não explica o que o país se tornou.
Zé Nivaldo percebe com clareza o avanço do crime, a falência moral das instituições e a apatia da sociedade, mas ainda o faz a partir de uma lente histórica que transforma a ditadura em causa universal e a esquerda em vítima perpétua. É um olhar sincero, porém prisioneiro de uma narrativa que explica as consequências, mas não justifica com exatidão as causas.
No confronto, os militares e as forças de segurança — quando investidos do poder legítimo do Estado — têm o dever e a obrigação de neutralizar o inimigo com os meios de que dispõem. Foi o que ocorreu no Rio de Janeiro: morreram aqueles que enfrentaram o poder militar; presos foram os que se renderam. Simples assim.
Quando uma organização criminosa dispõe de armamento de guerra, logística própria e domínio territorial, deixa de ser delinquência e passa a configurar insurgência interna.
Nesse cenário, o uso da força não é apenas legítimo: é um imperativo moral e jurídico, pois a primeira obrigação do Estado é proteger o cidadão inocente. A omissão, nesse contexto, não é prudência — é cumplicidade.
Infelizmente, por omissão do governo federal — que retardou o envio de blindados e apoio logístico — o território não pôde ser plenamente retomado pelo poder público.
Ainda assim, o Comando Vermelho sofreu sua maior derrota em duas décadas, com a neutralização de lideranças e o desmonte de estruturas operacionais.
É preciso que o governador Tarcísio mantenha a pressão sobre o PCC em São Paulo, para evitar um desequilíbrio ecológico na selva do crime organizado, já que ambas as facções disputam território em praticamente todos os estados da Federação.
A força legítima deve ser exercida com firmeza e continuidade, sob a égide da lei e do dever moral que sustenta toda civilização: a justiça que protege os justos e pune, sem hesitação, os que escolheram o caminho da guerra contra a sociedade.
O drama é que muitos, como ele, sabem o que está errado, mas não conseguem romper o pacto afetivo com a própria narrativa. E é por isso que, mesmo quando apontam na direção certa, hesitam em dar o passo seguinte.
Meu desejo é que este diálogo — travado entre amigos que se respeitam e que amam o Brasil — ajude a libertar o pensamento do medo de rever suas origens, pois pensar é, antes de tudo, um ato de fidelidade à verdade, não à tribo.
12. Pós-escrito — O karma de ser do contra
Essa é, afinal, a opinião de alguém que nasceu em 1964, educado sob o silêncio da ditadura militar e, portanto, naturalmente avesso a qualquer forma de censura. Sempre fui contrário aos excessos do regime e defensor intransigente da liberdade de expressão.
Mas o tempo tem seus paradoxos. Hoje, sou obrigado a me insurgir contra o próprio sistema que governa o Brasil, um sistema que fala em democracia enquanto flerta com o controle.
Ou talvez minha esposa tenha razão: sofro de um leve transtorno opositor desafiador.
Ou, quem sabe ainda, carrego apenas o karma de ser do contra, esse destino de quem, por amor à verdade, nunca se conforma com o absurdo.
*O autor é advogado e livre pensador.
NR - Os textos assinados expressam a opinião dos seus autores. O Poder estimula o livre debate de ideias e acolhe o contraditório.
NR2 - O artigo de Zé Nivaldo que motivou o presente ensaio pode ser consultado através do link abaixo:
https://www.opoder.com.br/noticias/28081/guerra-ao-crime-muito-bem-organizado-de-que-lado-voce-esta

