ESPECIAL — Governo, Receita, Coaf e MPF vão apurar gastos do Bolsa-Família com Bets
09/11/2025 -
Continua repercutindo em todo o país o resultado de análise feita pelo Tribunal de Contas da União (TCU) sobre dados do Banco Central que apontaram grandes volumes de transferências de famílias beneficiárias do Programa Bolsa Família (PBF) para empresas de apostas on-line — as famosas “Bets”. Divulgado em primeira mão pelo jornal Estado de São Paulo, o TCU apontou inicialmente que cerca de R$ 3,7 bilhões investidos em um único mês (janeiro de 2025) nessas apostas, foram transferidos das contas de pessoas que recebem o programa social.
Fazendo uma conta básica, na qual consta que o Bolsa Família tem um custo de R$ 12,9 bilhões por mês para o Governo Federal, o valor investido em Bets somente no mês citado representa cerca de 30% desse valor mensal gasto por usuários do programa com jogatinas nas Bets.
Acontece que o ministro relator do processo que investiga o caso na Corte de contas, Jhonatan de Jesus, afirmou ser “impossível afirmar hoje, com toda certeza, que os recursos utilizados para apostas tenham saído exclusivamente do Bolsa Família”.
Uso irregular de CPFs
Mesmo assim, o relatório informa que foram constatados “fortes indícios de uso irregular dos CPFs de pessoas que recebem repasses do PBF em esquemas de fraude, lavagem de dinheiro ou ocultação de ilícitos”.
Por isso, o Tribunal pediu que o Ministério de Desenvolvimento Social (MDS), Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), Receita Federal e Ministério Público Federal (MPF) apurem de forma mais detalhada o que foi descoberto.
O objetivo da fiscalização do TCU, conforme divulgou o Tribunal no seu site, foi apurar o tamanho do rombo causado pelas chamadas "Bets" no orçamento das famílias. “O problema é que o dinheiro recebido pelos beneficiários do programa [Bolsa Família] se mistura nas contas e 83,93% dos titulares declaram ter outras fontes de renda, como trabalho remunerado, por exemplo”, disse o ministro relator, que aponta necessidade de aprofundamento da investigação.
De acordo com ele, a soma dessas rendas declaradas (R$ 13,73 bilhões) praticamente se igualou ao montante transferido pelo programa (R$ 13,70 bilhões) em janeiro de 2025. Motivo pelo qual é preciso detalhar a apuração.
Concentração de transferências
Segundo Jhonatan de Jesus, um dos indícios de que existe irregularidade no dinheiro repassado pelo programa aos beneficiários e investimento nas Bets é a concentração das transferências: cerca de 4,4% do total de famílias apostadoras foram responsáveis por 80% do montante total transferido. Além disso, no mês em questão — janeiro desse ano, — 21,9% das famílias tiveram contato com apostas.
“Esses dados reforçam a forte suspeita de uso irregular de CPFs e até de que terceiros estão usando identidades de beneficiários. O que pode indicar lavagem de dinheiro, ocultação de ganhos ilícitos ou outras fraudes, extrapolando a problemática do jogo responsável e ingressando no terreno da ilegalidade”, disse o ministro.
Determinações do TCU
A determinação oficial do TCU foi para que o Ministério de Desenvolvimento Social (que coordena o programa dentro do Governo) em um prazo de 90 dias elabore e encaminhe ao Tribunal um plano de ação para identificar e reduzir as causas de inclusões indevidas no PBF, usando como indício movimentações bancárias excessivas.
O Executivo Federal também terá que apurar e tratar os casos de utilização ilícita de CPFs de beneficiários por terceiros para realização de apostas.
Já quanto ao Coaf, à Receita e ao MPF, a Corte de contas encaminhará a cada um deles os dados relativos às ocorrências atípicas e milionárias (suspeitas de fraude e lavagem), também para providências investigativas relativas às suas competências. Procurados, nenhum dos órgãos mencionados pelo TCU se manifestou a respeito até o fechamento desta edição.

