imagem noticia

Reforma Tributária 46: Princípio da Tributação no Destino nas Serventias Extrajudiciais - Por Rosa Freitas*

10/11/2025 -

imagem noticia
A Reforma Tributária também produziu uma mudança substancial na forma de distribuição do produto da arrecadação: a regra da tributação no destino.

Atualmente, a tributação do ISS (Lei Complementar nº 116/2003) ocorre, em regra, no local da sede da empresa, onde estão organizados os recursos materiais necessários à prestação dos serviços. Excepcionalmente, a tributação se dá no domicílio do tomador, conforme as alterações promovidas pela LC nº 157/2016, que modificou a LC nº 116/2003.

O ICMS, por sua vez, também segue o critério da tributação na origem, e, havendo diferença de alíquotas entre estados, ocorre o recolhimento do ICMS-DIFAL. Assim, tanto o ICMS quanto o ISS são tributos cobrados na origem, mas a Reforma Tributária altera esse paradigma ao adotar a tributação no destino, salvo algumas exceções.

1. Princípio da tributação no destinos

De acordo com o art. 11 da LC nº 214/2025, considera-se local da operação:

Art. 11. Considera-se local da operação:

I – de bem móvel material, o local da entrega ou disponibilização do bem ao destinatário;
II – de bem imóvel, bem móvel imaterial, inclusive direito relacionado a bem imóvel, serviço prestado fisicamente sobre bem imóvel e serviço de administração e intermediação de bem imóvel, o local onde o imóvel estiver situado;
III – de serviço prestado fisicamente sobre pessoa física ou fruído presencialmente, o local da prestação;
IV – de serviço de eventos, o local de sua realização;
V – de serviço portuário ou prestado sobre bem móvel material, o local da prestação;
VI – de transporte de passageiros, o local de início do transporte;
VII – de transporte de carga, o local da entrega ou disponibilização do bem ao destinatário;
VIII – de exploração de via mediante cobrança, o território proporcional à extensão da via;
IX – de serviço de telefonia fixa e comunicações por cabos ou fibras, o local de instalação do terminal;
X – de demais serviços e bens móveis imateriais, o domicílio principal do adquirente ou destinatário, conforme o caso.

Aplicando-se essas regras aos serviços prestados pelas serventias extrajudiciais, a situação torna-se complexa.

Nos atos incidentes sobre imóveis, o local da operação será sempre o da situação do bem, o que não deve gerar maiores dificuldades para os oficiais de registro de imóveis, cujas atribuições naturalmente se vinculam ao território de localização do imóvel. A gestão imobiliária, inclusive, tende a ganhar maior relevância, com novas intervenções dos oficiais e com a necessidade de integração ao Cadastro Imobiliário Brasileiro (CIB), que terá inúmeras finalidades.

Os serviços prestados presencialmente, com a presença física do solicitante, também terão o recolhimento do IBS no local em que ocorrer a entrega, conforme o art. 11, inciso III, da referida lei complementar.
Entretanto, com os serviços eletrônicos notariais (e-Notariado), as regras se tornam mais complexas. Desde a pandemia, o processo de digitalização e o uso de assinaturas digitais transformaram a prática dos atos notariais. O sistema e-Notariado, que utiliza certificado digital notarizado, tornou-se obrigatório para todos os tabeliães de notas do país, garantindo segurança jurídica e validade aos atos digitais, como procurações e escrituras públicas.

2. O que é o e-Notariado?

É uma Plataforma digital onde o sistema online é uma ferramenta que permite a prática de atos notariais mediante certificado digital notarizado;

A Gestão é desenvolvida e gerida pelo Colégio Notarial do Brasil (CNB) e regulamentado pelo CNJ;

Os findamentos normativos são o Provimento CNJ nº 100/2020 e o Provimento CNJ nº 181/2024, que tornaram seu uso obrigatório, padronizando os serviços notariais eletrônicos em todo o país.

O CNJ assegura que os atos praticados no e-Notariado têm a mesma validade jurídica dos atos presenciais.

O funcionamento do e-Notariado segue:

• Atos digitais: realização remota de escrituras públicas, procurações e outros atos;
• Certificado digital: assinatura com certificado digital notarizado, emitido gratuitamente pelos cartórios;
• Identificação: presencial ou por videoconferência.

O sistema criou novas hipóteses de relações jurídicas entre ausentes, nos termos do art. 9º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB).

Contudo, a aplicação do princípio da tributação no destino suscita dúvidas: se o cidadão utiliza o sistema estando fora da área territorial do cartório, onde se dará a tributação? No domicílio do tomador (estado e município)? Aparentemente, sim — mas a categoria ainda demonstra incerteza sobre essas implicações.
Outra questão relevante refere-se à prestação de serviços a pessoas domiciliadas no exterior. Seria o caso de exportação de serviços? Em tese, sim, se o gozo ou resultado do serviço ocorrer no exterior. No entanto, o tema ainda gera controvérsia e revela o despreparo das serventias extrajudiciais diante das novas regras do IBS e da CBS.

Atualmente, as serventias não recolhem PIS/COFINS, mas passarão a recolher a CBS em 2027. Quanto ao IBS, haverá um período de transição entre 2029 e 2033, coexistindo os dois tributos.

3. Insegurança jurídica

Diante desse novo cenário, surgem diversas dúvidas práticas:

• Os cartórios precisarão emitir nota fiscal de IBS/CBS?
Sim. Isso impactará todas as serventias, pequenas e grandes.
• As serventias terão direito a crédito de IBS/CBS?
Sim, mas será necessário diferenciar o que constitui consumo necessário ou imprescindível, distinguindo bens e serviços passíveis de crédito.
• O IBS incidente será recolhido para o estado e município de destino?
Sim, conforme interpretação do art. 11 da LC nº 214/2025.
• Haverá exportação de serviços extrajudiciais?
Sim, nos casos em que o gozo do serviço ocorrer no exterior, nos termos do art. 80, pois se considera exportação de serviço ou de bem imaterial, inclusive direitos, o fornecimento para residente ou domiciliado no exterior e consumo no exterior.Na condição de exportação de serviço não haveria a incidência de IBS/CBS,.
Além das múltiplas implicações da nova tributação pelo IBS/CBS — sem previsão de redução de alíquota —, é provável que haja aumento do custo dos serviços para os usuários.

Conclusão

1. A adoção do princípio da tributação no destino representa uma mudança estrutural no sistema tributário brasileiro e impõe profundas adaptações às serventias extrajudiciais.

2. A digitalização dos serviços, impulsionada pelo e-Notariado, desafia os critérios tradicionais de territorialidade e exige novas interpretações sobre o local da operação e a destinação do tributo.

3 Ainda que a LC nº 214/2025 busque uniformizar regras e promover justiça fiscal, a transição para o modelo dual (IBS e CBS) demandará ajustes operacionais, tecnológicos e contábeis das serventias, bem como capacitação dos profissionais.

4. Em síntese, a Reforma Tributária inaugura um novo paradigma, mas também revela lacunas regulatórias que precisarão ser enfrentadas com diálogo entre o Fisco, o CNJ, o Colégio Notarial do Brasil e os próprios agentes das serventias, a fim de garantir segurança jurídica e viabilidade econômica à atividade notarial e registral.

5. Nos serviços extrajudiciais prestados por esses profissionais incide além de vários penduricalhos e dos emolumentos sofrerão com a incidência de uma aliquota bem maior do que os atuais até 5% de ISS


Referências

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

BRASIL. Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973. Dispõe sobre os registros públicos. Diário Oficial da União, Brasília, 1973.

BRASIL. Lei nº 8.935, de 18 de novembro de 1994. Regulamenta o art. 236 da Constituição Federal, dispondo sobre os serviços notariais e de registro. Diário Oficial da União, Brasília, 1994.

BRASIL. Lei Complementar nº 116, de 31 de julho de 2003. Dispõe sobre o ISSQN.

BRASIL. Lei Complementar nº 157, de 29 de dezembro de 2016. Altera a LC nº 116/2003.

BRASIL. Lei Complementar nº 214, de 2025. Regulamenta a Reforma Tributária (IBS e CBS).

CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ). Provimento nº 100, de 26 de maio de 2020. Dispõe sobre a prática de atos notariais eletrônicos.

CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ). Provimento nº 181, de 22 de março de 2024. Regulamenta o uso obrigatório do e-Notariado em âmbito nacional.

COLÉGIO NOTARIAL DO BRASIL (CNB). Plataforma e-Notariado: diretrizes operacionais e normativas.


*Rosa Freitas é Doutora em Direito, advogada, sertaneja, poetisa e autora de artigos e livros jurídicos, dentre eles "A reforma tributária e seus impactos nos Municípios", "Gestão Municipal de Residuos Sólidos" e "A reforma tributária e suas implicações nas compras governamentais e serviços públicos", Editora Igeduc.

imagem noticia unica




Deseja receber O PODER e artigos como esse no seu zap ? CLIQUE AQUI.

Confira mais notícias

a

Contato

facebook instagram

Telefone/Whatsappicone phone

Brasília

(61) 99667-4410

Recife

(81) 99967-9957
Nós usamos cookies e outras tecnologias semelhantes para melhorar a sua experiência em nosso site.
Ao utilizar nosso site e suas ferramentas, você concorda com a nossa Política de Privacidade.

Jornal O Poder - Política de Privacidade

Esta política estabelece como ocorre o tratamento dos dados pessoais dos visitantes dos sites dos projetos gerenciados pela Jornal O Poder.

As informações coletadas de usuários ao preencher formulários inclusos neste site serão utilizadas apenas para fins de comunicação de nossas ações.

O presente site utiliza a tecnologia de cookies, através dos quais não é possível identificar diretamente o usuário. Entretanto, a partir deles é possível saber informações mais generalizadas, como geolocalização, navegador utilizado e se o acesso é por desktop ou mobile, além de identificar outras informações sobre hábitos de navegação.

O usuário tem direito a obter, em relação aos dados tratados pelo nosso site, a qualquer momento, a confirmação do armazenamento desses dados.

O consentimento do usuário titular dos dados será fornecido através do próprio site e seus formulários preenchidos.

De acordo com os termos estabelecidos nesta política, a Jornal O Poder não divulgará dados pessoais.

Com o objetivo de garantir maior proteção das informações pessoais que estão no banco de dados, a Jornal O Poder implementa medidas contra ameaças físicas e técnicas, a fim de proteger todas as informações pessoais para evitar uso e divulgação não autorizados.

fechar