
GOL DE LETRA – Coluna Semanal - O DIA EM QUE O BRASIL INVADIU A GUIANA
04/12/2023 - Jornal O Poder
Roberto Vieira
Médico e cronista
A Venezuela realizou plebiscito, ontem, domingo, 3 de dezembro de 2023, apoiando a criação de um novo estado na região de Essequibo, território pertencente à vizinha Guiana, antiga possessão inglesa. O ditador Nicolás Maduro afirma que mais de 10 milhões de compatriotas querem voltar à região rica em petróleo e gás. O que vai acontecer daqui por diante é mistério. Mas também nos faz recordar do dia em que o Brasil invadiu a Guiana.
JÂNIO QUADROS
O presidente Jânio Quadros acorda naquele 3 de agosto de 1961 com delírios napoleônicos. Havia contrabando de manganês brasileiro através da Guiana Francesa. Então, a solução é uma invasão relâmpago daquele território com uso das Forças Armadas. Dois mil e quinhentos homens avançando em território inimigo e tomando a capital Caiena. Se tudo der certo? O Uruguai será o próximo. Nacional e Peñarol podendo disputar a Taça Brasil.
DOM JOÃO VI
Invadir o território da Guiana Francesa pode parecer um absurdo histórico, mas não é propriamente novidade. Quando Dom João VI foge para o Brasil após a invasão napoleônica de Portugal, o monarca luso revida invadindo a vizinha Guiana e dominando a capital Caiena. O episódio é descrito no livro DOM JOÃO VI NO BRASIL, do historiador pernambucano Oliveira Lima. A expedição militar tem como ponto de partida a Ilha de Marajó e é vitoriosa. Napoleão espuma de raiva em Paris. Dom João devora uma dúzia de coxinhas.
MOURA CAVALCANTI
O governador nomeado do Amapá em 1961 é o pernambucano Moura Cavalcanti. Moura aprecia a oportunidade de aumentar o território brasileiro e, de quebra, dar uma alfinetada no presidente Charles De Gaulle. Moura já vem tendo batalhas verbais contra o contrabando de minérios no Amapá. Após a ordem de invasão de Jânio Quadros, Moura e o estado maior das Forças Armadas se preparam rapidamente para a invasão.
A RENÚNCIA
Porém, quinze dias depois, Jânio acorda novamente em delírio e decide fingir que renuncia à presidência. Manda um bilhetinho aos políticos; espera o pedido para desistir da renúncia e imagina que, desta forma, ganhará poderes ditatoriais no Brasil - afinal de contas, a opção de vice era o milionário trabalhista João Goulart que passeia na China. Pena que o Congresso aceita a renúncia, Jânio termina despachado do cargo e as tropas brasileiras voltar aos quartéis até 31 de março de 1964. Guerra com os franceses só mesmo por causa das lagostas.
A DITADURA DAS INVASÕES
A Guiana de Maduro não é francesa. A Guiana de Maduro é a antiga Guiana Inglesa, independente desde 1966. A Venezuela pode até ter suas razões na disputa do território, como a Argentina nas Malvinas ou a Rússia na Ucrânia. Mas o modelo de reivindicação é próprio dos ditadores em crise. Nada diverte mais a população do que uma invasão. Nacionalistas nas ruas babam de satisfação com a visão do poderio militar dos soldados quando partem para a glória. Difícil mesmo é quando a invasão devolve esquifes ao invés de grana. Como bem descobriu Napoleão. Napoleão que é sonho de consumo de todo ditadorzinho de plantão. Como Galtieri, Putin, Jânio Quadros e Maduro.