
Brasil: 202 anos da ‘Independência’, 524 anos de ‘Corrupção’ – por Ana Maria Castelo Branco*
06/09/2024 -
Da Independência até hoje, passaram-se 202 anos. Do descobrimento até aqui, transcorreram 524 anos. No início de tudo, o Brasil já era habitado; os indígenas viviam aqui em uma existência paradisíaca. Antes da chegada dos portugueses, os espanhois já haviam passado por estas terras. No entanto, nos foi dito que o dono das terras seria aquele que possuísse o documento oficial, a célebre carta de Pero Vaz de Caminha.
História
A história do Brasil, iniciada em 1500, nos provoca sentimentos variados: para alguns, indignação; para outros, profundo desgosto. Foram muitas lutas, incontáveis mortes e inúmeros herois cujos nomes raramente são mencionados nas escolas, mas que travaram batalhas pela tão sonhada liberdade. Ah, “brava gente brasileira”... “ou ficar a pátria livre, ou morrer pelo Brasil.” E muitos, de fato, morreram nessa tentativa.
Mas e hoje? Será que alguém estaria disposto a morrer em nome da nossa independência, que, nos dias atuais, pode significar o direito ao acesso à saúde e educação de qualidade? Será que os intelectuais do nosso tempo cogitariam travar alguma batalha em prol de uma causa comum, como uma mobilização social contra os desvios de verbas da saúde e da educação? Ah, mas essa é uma responsabilidade dos representantes do povo, não é? Mas quem são esses representantes? Aqueles que se elegem por meio de currais eleitorais? Por meio de votos comprados? De favores políticos?

Patriotismo
Hoje, o patriotismo parece estar em falta. Muitos brasileiros mal sabem cantar o Hino Nacional. Recentemente, ouvimos alguém com cerca de 30 anos afirmar que nunca havia escutado o Hino da Independência, nem sabia qual era o Hino à Bandeira ou o da República. Corrompidos por um sistema educacional que já não é o mesmo, estamos perdendo o direito de conhecer nossa história e as façanhas que nos trouxeram até aqui.
Sim, a história do Brasil é repleta de mitos, exageros e apagamentos. Daqui a poucos anos, talvez os livros nem mencionem a pandemia. Quando olhamos os quadros que retratam a chegada dos portugueses, muitas vezes idealizados, nem nos damos conta do que realmente aconteceu por trás dessas cenas: as motivações, as histórias vividas pelos tripulantes durante a travessia pelo mar, e o encontro com os indígenas em um berço de natureza esplêndida.
Os portugueses
Os portugueses se apossaram de nossas terras e extraíram nossas riquezas. Os indígenas, "forçados" a aceitar presentes e catequização, foram dizimados quando resistiram à escravidão. As histórias que lemos na escola suavizam bastante esse período sombrio. No meio do caminho entre Brasil e Portugal, havia uma África. De lá, trouxeram homens, mulheres e crianças em navios negreiros para serem escravizados no Brasil. Uma história triste, mas que muitos tentam justificar como algo de "outras épocas." Será? Ainda hoje, há quem, se pudesse, compraria escravos. Os tempos mudam, mas a índole de uma pessoa má, não.
O quadro que retrata o Grito do Ipiranga foi romantizado ao extremo. Nada foi como por séculos acreditamos. E há mais exemplos: recentemente lemos que a feijoada tem origem francesa. Como assim? Então os livros e os professores mentiram, dizendo que a origem era brasileira, que foi inventada com os restos da mesa dos portugueses? Entre tantas histórias mal contadas, temos os ciclos do pau-brasil, do açúcar, do ouro e do café, todos marcados por maus-tratos e exploração, primeiro aos povos indígenas e depois aos povos africanos que nada tinham a ver com a "invenção" portuguesa de se apossar das terras brasileiras.

Nossas terras
A divisão de terras, as sesmarias, foram injustas. Famílias inteiras receberam vastas extensões de terra. E mesmo após a Abolição da Escravatura, que não foi imediata, ainda hoje ouvimos notícias de trabalhadores encontrados em condições análogas à escravidão. As políticas de imigração e as leis sempre beneficiaram e/ou deram oportunidades aos que vieram de outros países como os alemães, poloneses, italianos, holandeses, japoneses... ou aos mais ricos que por terem Educação, também possuíam mais conhecimento para prosperar em nossas terras. Celebramos 202 anos de independência de Portugal, mas a independência de pensamento, de ideias, a independência financeira do povo e a reforma agrária ainda são utopias. Somos uma nação multicultural, fruto de um belo processo de miscigenação ao longo de 524 anos. Pretos, brancos, amarelos, vermelhos, todos compondo o Brasil.
Hoje, queremos ver o verde da esperança. Queremos dias melhores, onde a nação seja verdadeiramente independente, o povo próspero, educado e vivendo sob a égide da ordem e do progresso.
Viva o Brasil!
Porém, para que esse sonho se realize, é essencial que cada um de nós, como cidadãos, assuma o compromisso de não corromper e de não se deixar corromper. A corrupção não é uma novidade em nossa história; ela se perpetua há 524 anos, desde a chegada dos primeiros colonizadores. É hora de rompermos esse ciclo vicioso.
Que esta comemoração dos 202 anos de independência seja também o marco de uma nova era, onde o verdadeiro patriotismo resida no compromisso com a justiça e a honestidade.
Que o grito de liberdade que ecoou em 1822 seja renovado agora com a voz de um povo que se recusa a ser corrompido e que luta por um Brasil mais justo e digno para todos.
*Ana Maria Castelo Branco é natural de Passira, Pernambuco, Brasil. Mestra em Letras pela UFPE, Professora da Educação básica, escritora, poetisa e contadora de histórias. Organiza e também participa de antologias e coletâneas. Possui 9 livros de literatura infanto-juvenil publicados. Em 2022 publicou o Cordel das Anas, homenageando todas as mulheres que se chamam Ana ou têm Ana em seus nomes. Já escreveu artigos de opinião para o Diário de Pernambuco, o jornal mais antigo em circulação da América Latina. Criou com o esposo um estilo de poema minimalista denominado CASTELOVERS. Ministra oficina de escrita literária e foi premiada diversas vezes com as suas poesias. Acredita em Deus, no Amor e na Vida Eterna. Instagram: @anamariacastelobranco1
