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Especial: 200 anos da Confederação do Equador — Pedroso e o motim do Pastorinha

28/09/2024 -

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por Josemir Camilo de Melo*

No seu mais recente artigo sobre os 200 anos da Confederação do Equador, o escritor Josemir Camilo de Melo narra a trajetória de dois oficiais daquela época: o tenente de artilharia pernambucano Pedro da Silva Pedroso e o seu conterrâneo, tenente José Antônio da Fonseca Galvão.

Ascensão e descenso

No artigo anterior sobre o sargento-mor do Ceará, o paraibano Luíz Rodrigues Chaves, vimos como sua carreira variou em promoções e descenso, dependendo de que lado político ficava. De certa maneira perfaz o perfil do que Frei Caneca disse sobre o militar daquela época, se antecipando sobre classe social. Aqui trago mais um caso de ascensão e descenso em torno da Independência e da Confederação do Equador. Tomo, como parâmetro duas figuras militares típicas daquelas convulsões políticas, o tenente de artilharia pernambucano Pedro da Silva Pedroso e o seu conterrâneo, tenente José Antônio da Fonseca Galvão, servindo na Paraíba, talvez admirador de Pedroso, na luta pela hegemonia política dos cargos e servindo, posteriormente, ao mesmo senhor.

Militar irrequieto

Pedro da Silva Pedroso foi um militar irrequieto, desses suboficiais brasileiros ávidos por ascensão na carreira, cujo topo estava dominado pela oficialidade branca portuguesa e alguns poucos brasileiros. Nas duas primeiras décadas do século XIX, perde-se a conta de quantos suboficiais brasileiros foram preteridos em sua ascensão militar por camaradas vindo de Lisboa. Pedroso tornou-se, em 1823, sujeito de ações contraditórias. Havia sido republicano em 1817, mas, preso, cumpriu sentença na Bahia até 1821, quando veio a anistia das Cortes constitucionais portuguesas. Não foi solto junto com os demais revolucionários, pois fora condenado também como homicida, sendo enviado para Lisboa. Em março de 1822, ele, como capitão, pedia sua libertação.

Comandante das armas

De volta a Pernambuco, se juntou ao grupo do emissário de José Bonifácio contra o presidente da Junta, Gervásio Pires Ferreira, chegando a participar do golpe que destituiu Pires. Nomeado por força deste grupo a comandante das armas transgrediu até mesmo as bases da Constituição portuguesa, com prisão em massa de portugueses e conflitos até mesmo com a nova Junta. A culminação disto tudo foi que tentou dar golpe na própria Junta a que servia. Com a Junta dos Matutos destroçada, por pusilanimidade, esta ainda recorreu em Conselho aos cidadãos que autorizou o Intendente da Marinha, Manoel de Carvalho Paes de Andrade, prender Pedroso e o remeter para o Rio de Janeiro. A Pedrosada, como ficou registrado na historiografia pernambucana, teve até reflexo na Paraíba, com imitadores, tiroteios e saques, no chamado “Motim do Pastorinha”.

Mesma crise

A Paraíba, em 1823, estava conturbada por rebeliões militares por causa de troca de governador das armas, sentindo de perto a mesma crise que Pernambuco passou com o golpe do militar Pedro da Silva Pedroso, no Recife. Por contradição, neste golpe contra a junta de Gervásio Pires, um dos presos por Pedroso foi Felipe Neri Ferreira, ex-membro do governo Pires e que veio a ser presidente da Paraíba em 1824. Vale lembrar que um dos colegas de Felipe Neri, nesta Junta extemporânea, foi o militar tenente-coronel lusitano, Thomé Fernandes Madeira.

Delegação paraibana

A ligação com a Paraíba, no caso de Pedroso, foi que em 5 de março de 1823, a Câmara de Olinda enviou ofício ao governo da Paraíba, alertando para pedir ajuda se a situação se agravasse, diante das provocações de Pedroso que, conforme Cipriano Barata, o antigo patriota havia saído do verdadeiro sistema da Pátria e se encantado com o poder. Portanto, em 22 de setembro de1823, sabendo que Pedroso havia derrubado a junta, a Paraíba mandou uma delegação para tomar pé na situação e ver se precisavam de ajuda.

Sem comentários

Provavelmente, deve ter voltado de mãos vazias pois nada se comentou, principalmente porque aquela queda da Junta foi feita até com certa simpatia dos paraibanos que já se inclinavam pela Independência. Primeiro por terem feito José Bonifácio seu representante na Corte na saudação ao Príncipe como poder executivo; segundo porque um dos entraves que Gervásio Pires opôs ao reconhecimento de D. Pedro foi a não eleição de um pernambucano para o Conselho de Procuradores, o que a Paraíba, de bom grado escolheu o pilarense Manoel Clemente – ex-secretário da Junta de Goiana. Então, a Paraíba se calou com a queda da Junta de Gervásio Pires em setembro de 1822.

“Pedrosada”

Em Pernambuco, começava o império da vontade de Pedroso, que duraria até sua prisão, o que ficou conhecido, em fevereiro de 1823, sob o nome de Pedrosada. Assumiu o comando das armas o “goianista” José Camelo Pessoa de Mello, até chegar o nomeado por D. Pedro, Joaquim José de Almeida. Mas, mesmo assim, este indicado pelo Imperador só ficaria no comando coisa de dois meses e poucos dias, quando também foi preso e enviado para o Rio de Janeiro. Queria agir como os velhos capitães-generais do colonialismo. Na Paraíba, soube-se da prisão em15 de setembro, depois de apenas dois meses e alguns dia no cargo, por suspeita de lusitanismo e de comandar com mão de ferro e carta branca. Além disto, sua derrubada do cargo se deu com os liberais destituindo também o presidente e o secretário da Junta dos Matutos, na mesma data, ficando praticamente um triunvirato.

Golpe tramado em surdina

A Paraíba tomava conhecimento do clima agitado de Pernambuco, principalmente os liberais de plantão, contra os saudosistas do absolutismo, já que era grande a população portuguesa. O próprio tenente Galvão, na Paraíba, vai exigir, com o seu motim, a destituição de dois membros da Junta, que ele dizia serem republicanos. Em setembro mesmo, na Paraíba, a Junta local já estava com o problema de o governador das armas, o português Francisco de Albuquerque Mello, que se afastara do cargo e da capital, deixando acéfala a tropa. Junta e Conselho se reuniram e decidiram substituir o governador das armas por um militar paraibano. Não contavam com um golpe que estava sendo tramado em surdina entre o comandante da tropa de Goiana, em Pernambuco e o da tropa do governador das armas, Mello, na Paraíba.

“Insubordinação”

Ocorreu que dois militares de tropas paraibanas, o tenente José da Fonseca Galvão e o tenente Joaquim José de Oliveira se rebelaram com seus contingentes, em 10 de setembro de 1823, contra a substituição do governador das armas, o português Francisco Albuquerque Mello e pedindo sua manutenção no cargo. Esta insubordinação ficou conhecido na historiografia local como “Motim do Pastorinha”, apelido este do tenente José da Fonseca Galvão, que discordava da nomeação do governador das armas, o paraibano Trajano Antônio Gonçalves de Medeiros, pelo Conselho da província, em lugar daquele português. A intenção era apoiar, também, a manutenção do governador das armas de Pernambuco, Joaquim Almeida, que havia sido preso por “lusitanismo” e regime de repressão contra os pernambucanos. O nomeado paraibano chegou a ser atacado pela espada do tenente, mas, ferido, resistiu e conseguiu expulsar os amotinados, prendendo setenta deles.

Plano frustrado

O plano do tenente Galvão surgiu de uma visita do comandante das armas de Goiana, tenente-coronel lusitano, Thomé Fernandes Madeira, ex-vogal da Junta Temporária de Pernambuco. Madeira, antes, em 1822, planejara a derrubada de Pedro da Silva Pedroso, pois este havia prendido três apoiadores além, de Felipe Neri, membro da Junta Temporária de Pernambuco. Agora, sua pretensão era levar o batalhão de linha paraibano sob o comando do governador das armas da Paraíba, Francisco de Albuquerque Mello a Goiana. E de lá marchar, para, fingindo pacificar Pernambuco, entronizar seu patrício Mello como governador das armas de Pernambuco. Em tempo, vale dizer que Galvão era pernambucano.

Combate

Como a Junta paraibana se recusou a mobilizar seu batalhão para tal “pacificação”, e aproveitando que Mello andava ausente, contrariou o plano, nomeando o então liberal tenente-coronel, o paraibano Trajano Antônio Gonçalves de Medeiros, para o cargo. Digo liberal, porque Trajano e uma sobrinha haviam escrito, naquele mesmo ano, cartas para o Sentinela da Liberdade, de Cipriano Barata. O combate pareceu intenso em alguns momentos, mas a tropa legalista dominou e expulsou da cidade os golpistas, chegando um grupo de militares a saquear a caixa de uma irmandade. Saiu Galvão agitando até a bandeira portuguesa pelas ruas da Paraíba e dando vivas ao rei (PINTO, Irineu Ferreira, 1977, p.43 a 45 e BARATA, Cipriano, 2001, p.187-189).

Prisão e castigo

Galvão só foi contido por seu tio e pai de criação, capitão Manoel da Fonseca Galvão, fugindo o tenente, em seguida para o Rio Grande do Norte. Outras fontes apontam que Pastorinha se misturou, tempo depois, ao sul da capital, com gente de Félix Antônio, presidente liberal e temporário da Paraíba, sendo então preso e enviado, como castigo, para a província vizinha ao norte. O tenente-coronel Trajano Antônio Gonçalves de Medeiros, comandante das armas da Paraíba, publica no Sentinela, de 11 de outubro de 1823, uma proclamação de pacificação da Paraíba. Mais tarde, já em 1824, o Rio Grande do Norte devolve o tenente Galvão ao então presidente substituto de Felipe Neri Ferreira, coronel Alexandre Francisco de Seixas Machado.

Crítica de Frei Caneca

Galvão parece desaparecer na historiografia, só aparecendo no momento da repressão à Confederação do Equador, agora como major, a serviço do general Francisco de Lima e Silva, na perseguição e obstrução à tropa de Caneca e confederados. Uma vez os imperiais vitoriosos, Galvão escolta a tropa presa até Goiana. No meio do caminho, Frei Caneca registra uma crítica forte ao militar que teria, em Campina Grande, tratado mal os presos. Como o general havia autorizado a separação dos militares presos, para não encaminhar os paraibanos para Pernambuco, Galvão escolta os seus presos para a capital da Paraíba. Assim sendo, deixou de se encontrar com seu líder maior, Lima e Silva, no Recife; e também deixou de se encontrar com um antigo despeitado, e admirado, agora ajudante de ordens do general, o capitão Pedro da Silva Pedrosa.

*Josemir Camilo de Melo é historiador e professor paraibano

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