
A televisão mergulha na mediocridade ao ignorar a complexidade dos fatos, por Zé da Flauta*
23/11/2024 -
A estética crítica da TV aberta no Brasil enfrenta um momento de desgaste profundo, marcado pela sustentação de narrativas que muitas vezes já não encontram eco na realidade cotidiana da população. A insistência em temas e formatos ultrapassados revela uma dificuldade em se adaptar às mudanças culturais e tecnológicas. A narrativa predominante frequentemente promove uma visão simplista e maniqueísta dos fatos, ignorando a complexidade dos contextos sociais. Essa abordagem não só aliena uma parcela crescente do público, que busca alternativas mais diversificadas, mas também reforça um ciclo de mediocridade que inviabiliza avanços qualitativos no conteúdo televisivo.
Normalização da banalidade
Um dos aspectos mais alarmantes dessa estética é a inversão de valores promovida por certos programas e emissoras. Personagens e histórias que exaltam comportamentos antiéticos, como corrupção ou exploração, são apresentados como entretenimento ou, pior, como modelos de sucesso. Essa inversão cria uma normalização da banalidade do mal, onde o sensacionalismo supera a responsabilidade informativa. Além disso, questões relevantes para a sociedade, como educação, saúde e justiça social, são frequentemente relegadas a segundo plano em favor de pautas triviais ou polarizadoras, alimentando uma visão superficial e dividida da realidade.

Lógica e lucro
O objetivo por trás dessa posição é multifacetado. Por um lado, a manutenção de uma narrativa rasa serve para preservar o status quo de certos grupos de poder, tanto econômicos quanto políticos, que se beneficiam da desinformação e da distração da massa. Por outro, há uma lógica comercial que prioriza o lucro acima da qualidade, utilizando fórmulas prontas que garantem audiência rápida, mesmo que em detrimento de um conteúdo enriquecedor. Essa escolha é muitas vezes comandada por conglomerados midiáticos com fortes interesses políticos, que moldam a linha editorial e o conteúdo de acordo com suas agendas próprias.
Prioridade secundária
A responsabilidade dessa crise estética na TV aberta, no entanto, não recai apenas sobre quem a comanda, mas também sobre um público que ainda consome passivamente esse conteúdo. É crucial questionar se as emissoras estão, de fato, buscando agradar o público ou apenas os anunciantes. A dependência do modelo de financiamento publicitário faz com que muitas vezes o foco principal seja atender às demandas dos patrocinadores, mesmo que isso signifique sacrificar a qualidade do conteúdo. Em vez de investir em uma programação que eduque, informe e enriqueça culturalmente, opta-se por formatos que garantam audiência suficiente para sustentar contratos lucrativos de publicidade. Essa escolha revela que, para as TVs abertas, agradar ao público é uma prioridade secundária, ficando atrás da necessidade de manter a lucratividade.
Até a próxima!
*Zé da Flauta é músico, compositor, filósofo e escritor.