
Reforma Tributária 8: O que é o nanoempreendedor? - Por Rosa Freitas*
10/02/2025 -
Na década de 1930, minha avó materna Maria vendia doces caseiros (leite e mamão verde), bolos regionais e almoços no povoado de Bonfim, município de São José do Egito-PE aos domingos, dia da feira, para ajudar no sustento de 14 filhos. Enquanto ela tocava seu nanonegócio meu avô José Augusto de Freitas comercializava algodão, rapadura, banana, milho e feijão. Igual a ela, outras "Marias" tinham e têm pequenos negócios, como as tapioqueiras das esquinas de Recife e Olinda, ou baianas de acarajé em Salvador. O legislador brasileiro finalmente olhou para os pequeninos negócios que compõem ou são a renda exclusiva de tantas famílias.
A história de minha avó se confunde com milhões de outras brasileiras e brasileiros. Um dos grandes desafios da tributação é a regularização das atividades dessas naturezas, respeitando e compreendendo que nem todos têm condições de pagar contadores e por isso precisam de simplicidade e pouca burocracia, nem têm real noção das obrigações tributárias e empresariais, por demais complexas no Brasil.
Para essas pessoas o legislador criou a categoria dos nanoempreendedores. O prefixo nano se tornou popular na tecnologia. O termo vem do grego nánnos, que significa "anão". São as nanopartículas e os nanorobôs. Na matemática, Nano é um prefixo que indica um bilionésimo da unidade indicada.

1. Avanços na regularização
O Brasil já avançou muito na formalização de negócios com o Simples Nacional e com os microempreendedores. O Simples Nacional, na Reforma Tributária, deixa de ser somente um enquadramento, mas oferece duas opções: pagar tudo em uma alíquota única do Simples; ou pagar parte dos tributos pelo Simples e o IBS/CBS por fora. Esse entendimento advém da previsão legal: "os optantes pelo Simples Nacional poderão exercer a opção de apurar e recolher o IBS e a CBS pelo regime regular, hipótese na qual o IBS e a CBS serão apurados e recolhidos conforme o disposto nesta Lei Complementar".
Em 2025, ainda será possível faturar até R$ 4,8 milhões ao ano como optante do Simples, conforme os anexos XVIII, XIX, XX, XXI e XXII da LC nº 214/2025, que trazem os regimes de transição para o Simples. Já o MEI - Microempreendedor Individual pode ter renda anual de até R$ 81 mil. A previsão está no Anexo XXIII da LC nº 214/2025.
Atualmente, o PLP nº 108/2021 busca atualizar os limites financeiros, mas sua tramitação ainda não foi concluída. Os enquadramentos nesses regimes tributários passarão a ser os seguintes:
para o MEI, passa dos atuais R$ 81 mil para R$ 144.913,41;
para microempresa, salta de R$ 360 mil para R$ 869.480,43; e
para empresa de pequeno porte, sobe de R$ 4,8 milhões para R$ 8.694.804,31.
Os desafios da formalização não pressionam somente os tributos, como também a previdência e o mercado de trabalho. Muitos trabalhadores informais brasileiros ainda têm renda de atividades menor do que o MEI e o Simples, e não têm condições de formalizar seus negócios, pois não compensam os custos da conformidade.

2. Os nanoempreendedores
Para o grupo de empreendedores que não se enquadram no MEI, a LC nº 214/2025 previu que:
Art. 26. Não são contribuintes do IBS e da CBS, ressalvado o disposto no inciso II do § 1º do art. 156-A da Constituição Federal:
IV - nanoempreendedor, assim entendido a pessoa física que tenha auferido receita bruta inferior a 50% (cinquenta por cento) do limite estabelecido para adesão ao regime do MEI previsto no § 1º do art. 18-A, observado ainda o disposto nos §§ 4º e 4º-B do referido artigo da Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006, e não tenha aderido a esse regime.
Esta inovação vai permitir que a manicure, o chaveiro, jardineiro, diarista e sem número de atividades possam ter o status de legalidade. Apesar de não terem que recolher o tributo IBS/CBS nem constituírem pessoas jurídicas, ainda podem subsistir obrigações acessórias.
Duas das obrigações que considero fundamentais são o Domicílio Tributário Eletrônico (DTE) e, até mesmo, a emissão de Documento Fiscal Eletrônico (DFE), previsto no art. 60, que estabelece que a obrigação de emissão de documentos fiscais eletrônicos aplica-se inclusive: "I - a operações imunes, isentas ou contempladas com alíquota zero ou suspensão".
Os nanonegócios poderão ser aqueles com: receita bruta anual inferior a R$ 40,5 mil, isto é hoje metade do MEI; não precisam ter CNPJ; não precisam emitir notas fiscais em todas as transações; e estarão sujeitos a um sistema simplificado de autodeclaração. Porém, esses empreendedores precisarão pagar contribuições previdenciárias e impostos sobre a propriedade.

3. Trabalhadores por aplicativo
Entre os possíveis legalizados na condição de nanoempreendedores estão os trabalhadores de aplicativos. Essa possibilidade está prevista no § 10 do artigo 25 supracitado: "Para fins de enquadramento como nanoempreendedor, nos termos do inciso IV do caput deste artigo, será considerada como receita bruta da pessoa física prestadora de serviço de transporte privado individual de passageiros ou de entrega de bens intermediado por plataformas digitais 25% (vinte e cinco por cento) do valor bruto mensal recebido".
Pelos números de hoje, um trabalhador por aplicativo poderia ter faturamento bruto de R$ 162 mil, já que 25% desse valor seria em torno de R$ 40.500,00.
Os principais trabalhadores por aplicativo no Brasil são Uber, 99, InDrive, IFood, Rappi, Lalamove e Eu Entrego, que juntos somam cerca de 1 milhão de trabalhadores no Brasil. O PLP nº 12/2024 "dispõe sobre a relação de trabalho intermediado por empresas operadoras de aplicativos de transporte remunerado privado individual de passageiros em veículos automotores de quatro rodas e estabelece mecanismos de inclusão previdenciária e outros direitos para melhoria das condições de trabalho", mas está parado aguardando avaliação da Comissão de Indústria, Comércio e Serviços (CICS).
Conclusão:
Esta importante inovação, que ainda depende de outras normativas legais e regulamentares, vai promover um processo significativo de inclusão e formalização de trabalhadores e atividades até então à margem da legalidade, inclusive com a possibilidade de emissão de documentos fiscais mesmo sem cadastramento como pessoa jurídica.
Isto é significativo para a sociedade, já que promove verdadeiramente a inclusão legal do trabalhador e da trabalhadora empreendedores.
Um viva às Marias!
*Rosa Freitas é doutora em Direito, pós-graduada em Transição Enérgica e novos negócios pela PUC-PR e autora de livros e artigos jurídicos, dentre eles 'A Reforma Tributária e seus impactos nos municípios', pela Editora Igeduc.

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