Frida é um vira-lata
e tem orgulho de ser
inteligente mistura de raça
que faz o politicamente correto enlouquecer

Frida nunca adoeceu
tem imunidade de fera
que na minha companhia não a perdeu
Astuta feito ela só a pantera
mirando a presa que Deus lhe deu

Frida não traz no peito
ostentação de banho de loja
a trato com muito respeito
essa força que a natureza forja

A ficha criminal de Frida é extensa
já mandou pro céu
Três Timbus, dois pombos, um Bem-te-vi
e dezenas de lagartixa
um monstro pro Código Penal dos Pets
um apuro para o preservado instinto de bicho

Hoje, Frida faz quatro anos
não haverá bolo de aniversário
minha cadela não vestirá saiote
nem tampouco lacinhos, fita
para sair numa ridícula foto

Hoje, Frida faz quatro anos
criada como os cães das antigas
livres das neuroses humanas
longe das suas feridas

Hoje, Frida faz quatro anos
sem a coleira do amor dos homens
que aperta, exige, cobra
carente apesar de todas as sobras

Hoje, Frida faz quatro anos
de olhar sempre aceso
altivo, verde, cortante, impiedoso
caçando no quintal
forçando a borboleta se esquivar
do seu bote fatal

Hoje, Frida faz quatro anos
conservada no estado bruto, animal
intacta pupila de um lobo que me olha
de beleza primitiva, ancestral

Hoje, Frida faz quatro anos
ela não é minha filha
é meu bicho de estimação
jamais irei humanizá-la
quero amá-la com o que me restou de cão

*Romero Falcão, é um cronista que se arrisca a fazer poema torto, autor do livro: Asas das Horas, com prefácio do Prof. José Nivaldo