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A crise migratória nos Estados Unidos e o impasse no Texas é analisada por Ricardo Rodrigues*

29/01/2024 - Jornal O Poder

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Não é recente a insatisfação dos Estados situados na fronteira dos Estados Unidos com o México com a política migratória permissiva do governo Biden. Esses Estados vêm sofrendo com a entrada caótica de imigrantes ilegais em seus respectivos territórios. Afinal, apenas no mês de dezembro de 2023, mais de 300 mil imigrantes foram observados entrando ilegalmente no país por esses Estados e ali permanecendo.
São esses Estados que acabam arcando diretamente com os custos e as consequências da crise migratória nos Estados Unidos. Ali se registra o aumento contínuo da criminalidade, inclusive do tráfico de drogas, e o esgotamento rápido dos serviços públicos prestados pelos Estados, sobretudo em hospitais e agências de assistência social.



Texas dá um basta

Na semana passada um desses Estados, o Texas, resolveu dar um basta a tal situação. Na última quarta-feira, o governador Greg Abbott declarou que a entrada de multidões de imigrantes em seu Estado equivalia a uma “invasão”, da qual o Texas tinha o direito constitucional de se defender. E, não ficando apenas na retórica, Abbott mobilizou sua Guarda Nacional, enviando-a à fronteira do Estado com o México para erguer obstáculos com arame farpados e prender migrantes que tentassem entrar ilegalmente. As imagens dos batalhões da Guarda Nacional a caminho da fronteira e das prisões rapidamente viralizaram na internet.

A decisão da Suprema Corte

Provocada pelo Governo Federal a se pronunciar, a Suprema Corte decidiu a favor de Biden. Não poderia ser diferente. Afinal, nos Estados Unidos como no Brasil, a defesa das fronteiras é da competência federal. O artigo IV da Constituição norte-americana dispõe que cabe ao governo federal proteger cada Estado da União contra invasões. Respaldado por essa decisão, o Presidente Biden deu ao governador do Texas um ultimato de 24 horas para remover as barreiras erguidas com arame farpado e retirar as forças militares enviadas para a região da fronteira. Como Greg Abbott vem se negando a obedecer, constituiu-se um impasse político que há muito não se via nos Estados Unidos.

História se repete?

Esse imbróglio lembra uma situação semelhante que ocorreu nos Estados Unidos nos anos 1960. Um pouco antes, precisamente em 1954, a Suprema Corte decidira, no famoso processo Brown v. Board of Education, ser inconstitucional qualquer lei estadual que amparasse a segregação racial em escolas, mesmo que as escolas fossem iguais em termos de qualidade da educação.
Apesar da decisão unânime dos ministros da Suprema Corte, o então governador do Alabama, George Wallace, em 1963, decidiu não a acatar. O governador havia se comprometido com seus eleitores, em seu discurso de posse, a lutar pela continuidade da política de segregação racial.
Ele próprio prostou-se diante da porta do auditório da Universidade do Alabama, juntamente com pelotões da Guarda Nacional (estadual) para impedir a entrada de dois estudantes negros. E, com esse gesto, deu início a um impasse de graves proporções.


Kennedy jogou pesado contra Wallace

O então Presidente John Kennedy despachou seu irmão e Procurador Geral da República, Robert Kennedy, para negociar com o governador uma solução para o impasse. Relatos históricos registram que as tratativas diplomáticas não evoluíram. Por fim, o Presidente Kennedy assinou um decreto federalizando a Guarda Nacional do Alabama que prontamente acatou a ordem presidencial permitindo, assim, a matrícula dos alunos negros.

Separação dos poderes

Na política norte-americana, tais impasses podem acontecer porque a separação dos poderes naquele país é para valer. Cabe ao Poder Legislativo legislar, cabe ao Poder Executivo, executar “fielmente” as leis, e cabe ao Poder Judiciário, tomar decisões. Ao contrário do que acontece no Brasil, as polícias nos Estados Unidos não são polícias judiciárias e não obedecem a ordens do Poder Judiciário. Como elas integram a estrutura do Poder Executivo, elas acatam ordens apenas do Executivo. No caso da integração racial das escolas, a decisão da Suprema Corte terminou sendo acatada porque o Executivo Federal concordava com seu teor e podia fazer frente à resistência interposta pelo Estado do Alabama.

País dividido

Embora a solução que vem sendo contemplada pelo Governo Biden para o impasse no Texas seja idêntica à que foi empregada por John Kennedy, isto é, a federalização da Guarda Nacional do Texas, a conjuntura política nos Estados Unidos é hoje muito diferente daquela dos anos sessenta. Em primeiro lugar, o país sofre com uma polarização sem precedentes. O que as primárias realizadas até aqui demonstram é que há pouco ou nenhum espaço para políticos de centro nas eleições do final do ano. Em segundo lugar, a política migratória do Governo Biden conseguiu dividir o país praticamente ao meio. Nada menos do que 25 Estados da federação declararam seu apoio ao governador Greg Abbott, do Texas. É por conta desse apoio que as redes sociais têm divulgado o impasse como o possível início de uma guerra civil.

Relação Executivo e Legislativo

No mínimo, o atual impasse levará o governo a rever sua posição nas negociações em curso relativa ao orçamento da União. Se, a maioria republicana na Câmara dos Deputados já vinha transformando essas negociações numa dor de cabeça perene para o governo federal, com o impasse no Texas, a confusão nas relações entre Executivo e Legislativo tenderá a se consolidar. Dificilmente se aprovará o envio de recursos para a Ucrânia e Israel sem que o governo Biden ceda integralmente no que se refere à política migratória, fechando as fronteiras.

Repercussões políticas

Caso o governo opte pelo confronto, a federalização da Guarda Nacional do Texas poderá resolver o problema das cercas de arame farpado e da reabertura das fronteiras no Texas. Não será, contudo, uma solução simples e duradoura para o impasse. Haverá repercussões políticas, dentro e fora do Congresso. O assunto não tem como ficar de fora da campanha eleitoral que está apenas começando.

*Ricardo Rodrigues é jornalista e cientista político

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