
Ex- juiz volta ao judiciário - polêmico e corajoso Dino assume STF sem comemorações. Saiba o motivo.
21/02/2024 - Jornal O Poder
Hylda Cavalcanti
Conta-se que, nos anos 1970, perguntado se queria ser presidente do Brasil, Tancredo Neves respondeu que essas coisas não dependiam de intenção e que, “na vida, existe sempre o imponderável”. Como numa previsão antecipada, Tancredo foi escolhido presidente por um colégio eleitoral anos depois, mas morreu antes de assumir. Nesta quinta-feira (22/02), o imponderável dá novos sinais no país, mas de forma positiva. Conduz de volta ao Judiciário o ex-juiz federal Flávio Dino — que até bem pouco tempo demonstrava intenção em avançar na política, deixando a magistratura de uma vez por todas fora da sua vida.
Meritocracia
Dino, que tomará posse como mais novo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), passou no concurso para juiz muito novo, mas pediu exoneração em 2006. Com profundo conhecimento jurídico, desde os primeiros anos destacou-se e foi chamado pelo então presidente do STF Nelson Jobim para ser o primeiro secretário-geral do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Lá, estimulou a meritocracia no Judiciário, o sistema de metas e foi responsável por idealizar algumas das principais políticas públicas hoje em curso, nos tribunais.

Política
Também teve atuação importante em entidades de classe da magistratura, mas nunca escondeu que, no seu íntimo, pesava mais forte a política. Agora, ex-ministro da Justiça, ex-governador por duas vezes do Maranhão e ex-senador, ele retorna à rotina de autos processuais, pareceres e julgamentos. Enquanto muitas pessoas criticam sua posse como uma jogada política do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que o indicou, para quem o conhece bem esse tipo de novidade não chama a atenção.
Contradições
Isto porque o mesmo Dino que deixou de ser juiz para se filiar ao PCdoB nos anos 2000 tem uma biografia recheada de contradições. A vida inteira se diz marxista e, ao mesmo tempo, é católico fervoroso. Desde sempre repudiou os compadrios políticos, mas mantém amizade com adversários e, quando questionado, diz que a relação com eles é “só de caráter pessoal”.
Ácido e dócil
Sabe adotar tom ácido e irônico ao confrontar e ser confrontado – característica que pôs muito em prática no Ministério da Justiça — e ao mesmo tempo, ser dócil, carinhoso como poucos e diplomático. “O que faz os adversários terem raiva do Dino é que ele, feroz ou ponderado, sempre apresenta bons argumentos e isso não conseguem engolir”, diz um amigo próximo.
Maus bocados
Considerado bem-sucedido, Dino também passou por maus bocados. Perdeu tragicamente um filho adolescente por conta de erro médico, o que marcou sua família. Em função da falta de Marcelo, o filho, já anunciou que não quer festas na solenidade de posse, porque desde seu falecimento, não são feitas comemorações na família. Se este será o cargo final desse maranhense inquieto ou se depois ele retornará aos palanques, impossível prever. O que se sabe é que o STF terá um ministro corajoso e dedicado aos desafios a ele impostos pelo "imponderável" da vida.
